Arroz doce
Era o cheiro do sal que atraia.
Depois de perambular pelas pastagens enchendo o "bucho", a boiada madura se dirigia lentamente para o malhador.
Uma tora de peroba escavada com machado apoiada em dois cavaletes era o cocho. Um telhadinho de duas águas com telhas de madeira lascada cobria tudo pra não empoçar.
Lambendo e saboreando com muita paciência ficavam ali por horas...
Já capona, quase tudo era calma. O couro liso e solto dava umas tremidas, mas isto era pouco para os mosquitinhos, aí a calda batia: num movimento constante, vai e vem, girando, acertando o penacho nas costelas, no vazio ou até onde alcançasse.
Nessa constância entre chuva e calor o rabo se transformava em um verdadeiro abanador e a musculatura fortalecia.
O tempo e o capim farto deixavam a rabada atolada na graxa.
Penduradas em ganchos ficavam expostas nos açougues, longas, carnudas e cobertas por uma gordura amarelada.
Minha mãe apontava e escolhia, sempre umas três ou quatro.
Era de véspera, dava muito trabalho. Apenas com um pouco de sal ia pra panela e derretia a graxa lentamente até que ficava submersa na própria banha.
Separada, era temperada com muitas ervas, vinho, alho, cebola, sal e pimenta e nesta vinha d’alhos dormia na geladeira.
Amanhecia na panela.
O fogo baixo pra borbulhar bem devagar fazia a enorme tampa tremer devagarinho, cozinhava lentamente transformando aquela musculatura rígida em pedaços de carne suculenta, abraçados aos ossos saborosos e cobertos por uma fina e deliciosa camada de gordura.
Polenta mole no fundo do prato, pedaços de rabada cobertos de molho grosso fumegante, por cima salsinha batidinha salpicada coloria; agora era a minha vez de ficar lambendo e saboreando por horas.
À mesa, esta é uma das minhas melhores lembranças.
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