Com mais de 40 anos dedicados ao jornalismo, a maior parte deles na crônica policial, Percival de Souza agora avança mais um passo em sua carreira. Depois de publicar 16 livros em que se debruçou sobre o misterioso crime da Rua Cuba, retratou personagens polêmicos da ditadura militar (o delegado Sérgio Paranhos Fleury e o Cabo Anselmo), investigou o PCC e o narcotráfico (Society Cocaína e Narcoditadura e o Caso Tim Lopes) entre outros assuntos pinçados da realidade, eis que vem uma ficção.
'O Crime Quase Perfeito', da Idea Editora, é a sua nova aventura, como ele mesmo prefere descrever. 'Achei que era o momento de um recomeço, via ficção. É preciso certa dose de coragem. A empreitada é desafiante na arte de construir histórias. Esse 'Crime quase perfeito', planejado, abre uma série de novelas. Vamos tentar da mesma maneira que eu, timidamente, comecei a enfrentar o cotidiano da realidade', afirma Percival de Souza na introdução do livro.
Seus personagens trazem consigo um pouco desse 'laboratório humano' encontrado na crônica policial. Eustáquio Campos é o jovem que se rebela contra a própria mãe, deixa o interior para reconstruir a vida na capital como estudante de direito e funcionário público. Ambicioso e arrivista, leva à risca seu lema de que tudo na vida é um jogo de interesses.
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Paralelamente somos apresentados às dependências do 4º DP, onde um suicídio em pleno banheiro da delegacia deixará intrigados os experientes escrivão Clovis e o delegado. E por fim, o leitor segue os passos de Percy, uma espécie de alter-ego do autor, 'o espectador privilegiado que examina a sociedade por uma espécie de buraco de fechadura'.
Os ingredientes que o gênero policial exige e os bastidores da crônica criminal estão, boa parte deles, reunidos em 'O Crime Quase Perfeito' - desde os mecanismos usados na execução de um crime, as gírias pronunciadas nas delegacias e redações a citações reais como o caso de Suzane Von Richthofen. Além de uma singela homenagem ao mestre jornalista Mino Carta, que incumbiu Percival de Souza a dar novos ares ao jornalismo policial paulista no Jornal da Tarde dos anos de 1960.
O resultado é uma ficção que pode ser lida, por que não, como uma reportagem policial, densa e envolvente, já que o autor organiza fatos e hipóteses como tal, injetando em seus personagens muito do que viu e contou no jornalismo em 40 anos de profissão. Com uma narrativa direta e objetiva, Percival cria particularmente um personagem Percy como sendo o seu espelho, em toda sua completitude de um dos mais completos repórteres especializados na área policial.
Percy, assim como o autor, conhece como poucos da sua função os meandros que regem a justiça, com ótimo tramite entre suas fontes, capaz de achar brechas nos inquéritos e processos, desconfiar das fontes oficiais para, habilidosamente, formar suas opiniões. Munido de argúcia, perspicácia e sensibilidade, ele será destacado para cobrir o suicídio na delegacia, o qual cumprirá papel determinante na solução do crime.
Como o título propõe, e o próprio Percival deve ter se perguntado ao longo de sua carreira - existe crime perfeito?. Talvez o famoso Caso da Rua Cuba, que também lhe rendeu um livro, tenha chegado perto dessa alcunha, apesar de todas as provas deixadas pelo caminho, mas com o seu principal suspeito seguindo livre.
As centenas de crimes que ele acompanhou não deixam dúvidas - 'As razões são sempre as mesmas, só mudam os nomes dos personagens'. Ódio, ciúmes, ambições desenfreadas, ganância, frustração sexual. Ingredientes que agora ele reúne em 'O Crime Quase Perfeito'. E, assim como no 'laboratório humano da realidade' a que estamos acostumados acompanhar nas páginas policiais do dia a dia, esse 'recomeço' de Percival de Souza leva o leitor a uma decisiva e intrigante questão - decifrar o enigma.
'Serviço':
'O Crime Quase Perfeito'
Autor: Percival de Souza
Nº de páginas: 96
Preço: R$ 19,90