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Tássia Reis lança disco e levanta bandeira contra machismo e preconceito

20 set 2016 às 10:34

Por trás do jeito doce e meigo da rapper Tássia Reis esconde-se uma força sobrenatural. Quem ouve a jovem de 27 anos falar com tanta sutileza, mal sabe que dentro daquele semblante sereno pulsa uma mulher vigorosa, exigente e destinada a combater o machismo e o preconceito racial por intermédio de suas rimas pesadas. "Retrato coisas que vejo, vivo e sinto. Eu, como mulher negra, já vivenciei boa parte do que transmito em minhas músicas. O racismo não me deixou ter um estágio na época da faculdade, por exemplo.

Quando me dei conta de que estava à margem da sociedade, agarrei a oportunidade com unhas e dentes. Parei de ser enganada. Não estava tudo bem. E, desde então, me vi capaz de fazer alguma coisa para mudar. Posso falar de amor, mas sei que o amor para uma jovem negra tem outra conotação. Existe o machismo e o racismo. Os recortes estão ali o tempo inteiro e mudam o enredo da história", diz em entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo".


Com letras maduras e bem estruturadas, Tássia Reis acaba de lançar o disco Outra Esfera, o primeiro da sua carreira. As sete faixas do álbum mostram uma artista heterogênea e consciente da sonoridade que é capaz de produzir. Em Não É Proibido, que abre o álbum, a paulista nascida em Jacareí, cidade que fica a 82 quilômetros de São Paulo, exibe sua versatilidade com beats leves e psicodélicos. Já Se Avexe Não aproxima a rapper da MPB. É justamente nessa música que Tássia externa seu lado "vozeirão", algo, até então, inédito para ela. A canção, inclusive, termina com um samba, gênero que influencia a rapper desde criança.


"Na infância escutava, basicamente, o que meus pais escutavam em casa. E eles, neste quesito, foram maravilhosos. Cresci ouvindo Clara Nunes e Fundo de Quintal. Isso tudo em Jacareí, no interior de São Paulo. Minha primeira lembrança musical surge com Ê Baiana, da Clara Nunes. Depois, quando comecei a praticar danças urbanas, conheci a cultura hip-hop e passei a escolher o que queria ouvir", afirma.


O primeiro contato com a composição musical aconteceu por acaso. Tássia nunca se viu como cantora. O que ela queria mesmo era ser jornalista. Pouco tempo depois de concluir o ensino médio, passou a frequentar uma oficina de redação na periferia de Jacareí. Lá, aprendeu a escrever poemas. Sem dinheiro para presentear a professora no dia do aniversário dela, resolveu homenagear sua grande inspiração com três textos. "Ela falou que aquelas palavras tinham ritmo, que aquilo, na verdade, era música. Não acreditei na época, mas daí o tempo foi passando e senti vontade de escrever cada vez mais. Combinei com uma amiga que trabalhava comigo no telemarketing de compor alguma coisa. Levei a sério e mostrei no outro dia. Ela não botava fé que eu ia fazer, até porque não sou musicista e nunca aprendi a tocar um instrumento musical. Entretanto, sou capaz de criar textos com melodia. É algo instintivo", conclui.


Tássia também participa de Remonta, disco de estreia de Liniker, que acaba de ser lançado (mais informações na página C1). Os dois se conheceram na noite paulistana e desde essa época não se desgrudaram mais. Tássia empresta sua voz para a canção BoxOkê. "Chamo o Liniker de beau, de beautiful (bonito). Eu a conheci numa festa em São Paulo. A gente se encontrou na escada. Ela me reconheceu e falou: ‘Você é a Tássia Reis? Nossa, eu adorei sua música! Tinha acabado de lançar meu EP homônimo, em 2014. Ela passou a curtir várias coisas minhas no Facebook e começamos a nos falar pela internet. Rolou uma paixão e ficamos muito amigas. Quase um casamento! Fiquei uns dias em Araraquara, de onde ela é, e fortalecemos o laço. Nesse meio tempo, a gente já estava pensando em fazer um som juntas. Conversamos sobre a nossa relação com a água e daí surgiu BoxOkê", lembra ela.
Revolução crespa. O principal tema das canções de Tássia é o empoderamento feminino. Suas músicas falam abertamente sobre o controle do corpo da mulher negra e do machismo enfrentado por elas diariamente.


"O machismo está dentro do próprio rap, se você quer saber. De todas as formas possíveis. Cite ao menos cinco rappers que você costuma ouvir? Eu aposto que são todos homens. Não vem mulher na sua cabeça e isso não significa que elas não existam no mundo do hip-hop. Elas estão em posição secundária e nunca vão ocupar o grupo da elite porque o sistema não permite que isso aconteça. Existem várias artistas que fizeram história no rap nacional, mas não são conhecidas. A invisibilidade é cruel e não permite que as mulheres cheguem lá. Os line-ups de festivais são bons exemplos. Só tem homem! A mulher precisa sempre ficar provando que é capaz de estar lá. Eu não odeio os homens, muito pelo contrário. Eu quero minha parte, minha vez, meu pedaço do bolo. O diálogo está mais aberto, mas ainda falta muita coisa. Só vou dizer que melhorou quando eu tiver as mesmas possibilidades de um homem. Isso, infelizmente, está muito longe de acontecer", crava.


As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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