A marca ‘Jogos Mundiais da Natureza’, criada com dinheiro público em 1997 pelo governo paranaense para uma competição internacional de esportes radicais, hoje pertence a uma entidade privada. O governo não revela o quanto gastou na primeira edição do evento. Mas cálculos extra-oficiais apontam o investimento de pelo menos R$ 40 milhões, numa época em que o valor do real estava equiparado ao do dólar. A segunda edição dos jogos está ameaçada pela falta de patrocínio.
A marca é propriedade do Comitê dos Jogos Mundiais da Natureza, uma sociedade civil sem fins lucrativos criada em 14 de julho de 1996, com a finalidade de promover a competição, realizada no ano seguinte. A entidade era composta principalmente por integrantes e personalidades ligadas ao governo do Estado.
Em assembléia geral ordinária realizada em 25 de janeiro de 1999, os integrantes do comitê aprovaram um adendo ao item 2.1 do artigo 2º de seu estatuto (que trata do objetivo social). ‘...Buscando a auto-sustentação financeira, a Sociedade poderá comercializar a marca, a imagem, os direitos autorais e outros itens ou bens relativos aos Jogos Mundiais da Natureza, diretamente ou através de concessões, licenças, patrocínios...’, afirma o principal trecho dessa complementação.
Na mesma assembléia, foi aceito o nome da jornalista Ilana Lerner Hoffman, filha do governador Jaime Lerner (PFL), como conselheira do Comitê Executivo da entidade. Entre os integrantes do governo estadual que já fizeram parte do comitê como conselheiros estão Hitoshi Nakamura (então secretário de Meio Ambiente), Osvaldo Magalhães dos Santos (então secretário de Esporte e Turismo) e Heinz Herwig (ex-secretário dos Transportes e atual conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, órgão destinado a fiscalizar a aplicação do dinheiro público). O estatuto prevê que toda a receita do comitê seja aplicada ‘exclusivamente no cumprimento de seus objetivos sociais’.
A assessoria de imprensa do governador informou que Lerner considera um bom negócio para o Estado a transferência da marca dos Jogos da Natureza para o comitê. Segundo a assessoria, o Estado investiu na primeira edição para dar o ‘empurrão inicial’ e teve retorno com a atração de turistas decorrente da divulgação da competição. As imagens chegaram a 800 emissoras de TV de todo o mundo.
Em relação à participação de membros do governo no comitê, a assessoria respondeu que isso foi natural, porque a promoção era governamental. Ainda de acordo com a assessoria, a atuação de Ilana Lerner se limitou à divulgação do evento, sem que ela tivesse poder de decisão para liberar verbas.
Edgar Hubner, secretário-executivo do Comitê dos Jogos Mundias da Natureza desde novembro de 97, disse que não vê favorecimento do governo do Estado na transferência da marca. ‘Muito dessa marca foi feita pela iniciativa privada’, afirmou. Segundo ele, em caso de dissolução da sociedade o estatuto obriga a devolução ao Estado de todo o patrimônio recebido. O Comitê já registrou a marca dos Jogos no Brasil e atualmente realiza esse processo nos principais países do mundo.
Segundo Hubner, a composição da sociedade foi totalmente alterada e nem Ilana Lerner nem atuais ou ex-secretários integram mais a entidade. As contas do comitê em 1997 – ano dos jogos – foram auditados por uma consultoria independente, que não constatou irregularidades.