Para ler bem um romance é preciso saber alguma coisa sobre o gênero literário romance? Ou para se ouvir musica é preciso saber algo sobre tom, ritmo, harmonia? À primeira vista não. Nós nos orientamos pelo sabor da história, pelas sensações que nos trazem, pelo maior ou menor interesse nos personagens. Mas se queremos aprofundar, extrair mais de um livro do que somente emoções superficiais, conhecer melhor o próprio gênero ajuda.
Saber sobre as construções de um romance e suas vertentes nos faz aprender mais sobre os personagens, o quanto de nós existe neles. Entender a construção do romance faz a história nos ensinar nosso tempo, nossas dores e alegrias. Ler um bom romance pode nos contar tanto ou mais que livros de história. Sem situar o próprio livro em seu contexto, no entanto, perdemos muito.
Apenas como exemplo, ler Machado de Assis, com o vocabulário da época, a descrição de um personagem ou uma rua, ensina sobre o Brasil de então (final do século dezenove) tanto quanto uma aula inteira. Vou além. Saber o que Machado pensava enriquece ainda mais seu texto. Sua irônica descrença no ser humano, ao mesmo tempo amarga e compreensiva, a percepção de que os homens parecem escolher a vaidade ainda que pague um preço altíssimo por isso.
Os homens não mudaram tanto assim, mas a maneira como o vemos depende do tempo em que estamos. As viúvas do Machado de Assis não existem mais, assim como os escravos, o Rio de Janeiro da rua Mata Cavalos, mas entendemos melhor a dinâmica da História quando lemos contos e romances do "Bruxo do Cosme Velho."
Em resumo, gosto da fábula da centopeia que se perdeu em tropeços quando lhe perguntaram como controlava tantos pés. Ela que até então caminhava sem consciência precisou aprender sobre como andar. Ao entender seus movimentos foi mais longe. Começou dançar.