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O Mundo da Literatura e os Pirilampos de Ouro (Ensaio de Isabel Furini)

16 jul 2024 às 00:51
- Imagem gerada pela IA do Bing
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Este ensaio visa ajudar os poetas e escritores iniciantes que procuram o seu lugar no mundo da Literatura.

O Mundo da Literatura e os Pirilampos de Ouro:

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Durante a pandemia, recebi um e-mail de uma antiga aluna da oficina que ministrei durante 15 anos no Solar do Rosário, em Curitiba, chamada “Como escrever e publicar um livro”. Sempre me alegra receber notícias de antigos alunos, perceber como modificaram, como evoluíram com o tempo. Mas nessa oportunidade, fiquei receosa de responder e ferir o emocional da minha ex-aluna… No e-mail ela comentava, com muita alegria, que uma professora amiga dela lhe disse: “Você é a melhor poeta viva do Paraná!”. Minha ex-aluna me perguntava o que eu pensava… Era ela, realmente, a melhor poeta viva do Paraná? 

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No primeiro momento fiquei sem respiração. Perguntei-me como uma professora pôde lançar uma frase tão poderosa e tão irresponsável como essa! 

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Lembrei de uma frase do livro A Voz do Silêncio, de Helena P. Blavatsky: “Antes que a Alma possa ouvir, o discípulo tem de se tornar surdo (...) aos gritos dos elefantes em fúria como ao sussurro prateado do pirilampo de ouro.”

Li, pela primeira vez esse livro quando tinha 19 anos. O impacto foi tão profundo, e a beleza das metáforas revelavam tanta sabedoria, que repeti a leitura muitas vezes. É um livro inesgotável. Gostei muito quando nos orienta no sentido de não se deixar levar pelas vozes de crítica, nem pelos aplausos.

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Minha ex-aluna, para seguir em frente, deveria vencer um murmúrio agradável aos ouvidos, uma mentira encantadora. O elogio não começava com “para mim”, como, por exemplo, expressam os apaixonados: “Para mim, você é a mais linda do mundo!”. A moça sabe que não é a mais linda do mundo, mas entende que para ele, na visão dele, ela é a mais linda.

Nesse caso, eu senti medo de responder. Não queria ferir os sentimentos de minha ex-aluna, mas também não poderia mentir para ela. Como dizer a uma poeta: “Você ainda está longe de ser a melhor do Paraná, pois há muitos poetas excelentes.”.

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Escrevi: A melhor poeta do Paraná? Você pensa que é melhor que Luci Collin, Antonio Thadeu Wojciechowski, Alice Ruiz, Miguel Sanches Neto, Jussara Salazar, Ricardo Corona, Barbara Lia, Célia Musilli, Estrela Leminski, Leopoldo Comitti, Etel Frota, Adriano Smaniotto, Adélia Maria Woellner e tantos outros poetas maravilhosos cujos nomes fogem de minha mente neste momento, mas sei que tem muitos mais… muitos. E imediatamente deletei o parágrafo. Poetas são seres sensíveis, não é bom ferir a alma de alguém que está sendo iludido.

Pensei que minha resposta não poderia ser “sim”, nem “não”. A abordagem deveria ser suave. Mas como deixar claro que ela não era a melhor, nem uma das melhores do Paraná, sem dilacerar os sonhos dela?

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O problema é que se alguém acredita ser o melhor na sua área, não vai crescer mais,  achando que por estar no topo não precisa melhorar. Alguns pensam que um elogio só traz benefícios. Geralmente pode ajudar, mas um elogio falso tem o poder de  destruir um ser humano. 

Em uma das oficinas que ministrei em 2008 ou 2009, lembro de uma aluna que escrevia muito bem. Ela realmente se destacava, e um dos colegas nutria uma admiração exagerada pelo estilo literário da jovem. O administrador de empresas, inexperiente na área de Literatura, pensava que ela seria a próxima Clarice Lispector. Lembro-me que entraram em um grupo literário da internet (nessa época tinha bem menos grupos literários virtuais que hoje), e eu também fazia parte desse grupo. Ele apresentou um conto da menina elogiando exageradamente o texto, dizendo que ela era um talento e que quando publicasse o primeiro livro, com certeza, seria reconhecida no país, talvez até internacionalmente. As críticas dos membros do grupo foram aparecendo, todas negativas. Um criticou a falta de diálogos. Outro, achou as descrições detalhadas demais e cansativas, um outro não gostava de adjetivos e considerou que a narrativa ficou comprometida pois foram usados muitos adjetivos, e teve até um contista, que havia recebido vários prêmios, que caçoou da “próxima Clarice”!

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No dia seguinte vi que a postagem havia sido deletada. Ela não voltou para aulas. Soube por outro aluno, que ela havia ficado muito deprimida, pois não esperava críticas negativas… Senti pena dela. O rapaz tentou colocar o trabalho dela em evidência, mas de maneira grandiloquente, e desta forma “os gritos de elefantes” foram mais fortes que os doces murmúrios dos pirilampos de ouro.

Honestamente, ensaiei várias respostas para o e-mail de minha ex-aluna. Então, decidi não dar opinião, mas dar orientações para que ela mesma pudesse entender que é muito difícil o caminho literário. Listei alguns dos sinais que poderiam ajudá-la a analisar o caminho que estava percorrendo. 

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Alguns autores crescem e são chamados por grandes editoras para publicar seus livros; outros percebem que cresceram quando ganham prêmios importantes no Brasil ou no exterior; e alguns têm a alegria de ver seus livros analisados em teses de graduação, mestrado ou doutorado, ou seja, suas obras estão sendo estudadas.

Dias depois recebi um e-mail no qual a minha aluna se lamentava de ter-me enviado o primeiro e-mail, reconhecendo que seria arrogância pensar que era a melhor poeta do Paraná. Havia ganho alguns concursos literários, mas nunca recebera um prêmio importante. Nunca havia sido chamado por uma editora, e seus livros nunca haviam sido  objeto de nenhuma tese universitária. Ela mesma havia concluído que tinha muito a percorrer no caminho da literatura.

Ela falou isso para aquela professora-pirilampo, e a professora disse que a considerava a melhor poeta do Paraná, ainda que não fosse reconhecida, e que muitos artistas só foram reconhecidos depois que faleceram. Isso é verdade, mas não podemos esquecer que  reconhecimento depois da morte é uma exceção. 

O sonho de muitos poetas é chegar ao topo. Penso que também é importante o caminho. Penso também como a poesia entra e se instala na alma, como nos ajuda a viver, a suportar as tormentas. No meu caso, a poesia salvou a minha vida – literalmente. E ouvi muitas pessoas dizerem que a poesia as ajuda a viver, a preencher as horas de solidão, a vencer a depressão, a expressar amor. Ela nos permite revelar conteúdos desconhecidos do inconsciente. A poesia é uma parte oculta de nossa alma, está dentro de nós. Talvez o mais importante não seja ser o melhor poeta de nosso estado, do país, ou quiçá do mundo. Talvez, o mais importante seja simplesmente SER POETA.

Isabel Furini é poeta, escritora e palestrante, autora do livro de poemas “Dançando entre as estrelas”.

Contato: [email protected]

 


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