Depois de homens e mulheres terem conquistado a liberdade no que se refere às suas sexualidades, parece que se criou a lógica do quanto mais, melhor. Entretanto, isso não foi suficiente para suprir uma demanda afetiva que continua insatisfeita, caótica.
Da proposta do relacionamento amoroso convencional para as alternativas de ligações amorosas atuais, observamos estender-se um terreno árido, em que as pessoas têm se distanciado cada vez mais.
Amizade colorida, ficar, transar sem compromisso compõem um quadro de palavras que veiculam significados diferentes de modos de relacionamento, nos quais se busca, por exemplo, estar junto, mas com a liberdade para continuar, buscando e buscando.
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Hoje, grande parte dos que ''optam'' pelo modelo de casamento formal parecem ter a necessidade de justificar o intento, de forma que fique anunciado que, se não der certo, partem para outra.
Antes só do que mal acompanhado. A fantasia criada em torno dos desencontros que se enfrenta hoje pode ser a de que não encontremos alguém capaz de nos entender. Qualquer eventualidade que se apresente ao casal, por pequena que seja, confirma o estado de ''eternos claudicantes'', hesitantes.
Neste contexto, ora desconhecemos nossos desejos, ora protestamos contra o que acreditamos nos impedir de realizá-los; mas não paramos para pensar na essência que sustenta nossas buscas.
Nesta conjectura, estabelecemos exigências e somos exigidos por critérios que transcendem a condição humana, até chegarmos à exaustão que concretiza o dito popular ''antes só do que mal acompanhado''.
Só que, mesmo abandonando um projeto amoroso, não descartamos sua importância, ainda que seja pela lástima de sua ausência ou pelas atividades que escolhemos para substituí-lo. Neste caso, a superficialidade desenvolvida como um artifício para escapar de um envolvimento pode criar uma odisséia com reveses inesperados, pela inconsistência emocional do que é vivido e o que é sentido.
Com esta postura de distanciamento, podemos estar nos aventurando em nossas experiências sentimentais baseados em premissas que nem sequer paramos para questionar como foram construídas.
Reconhecendo-se para conhecer o outro, aprendemos, cedo, a aceitar modelos que internalizamos como verdades absolutas, e negligenciamos nossa condição de responsáveis por nosso projeto de vida. Sem este conhecimento interior, o grau de compromisso e de investimento na direção do que poderia nos gratificar, se neutraliza. As experiências ficam sempre aquém das expectativas, pois divergem do padrão de relacionamento que fora valorizado dentre as ofertas atuais.
Assim, se tivermos conhecimento das nossas possibilidades e limitações em relação ao que desejamos, e isto coincidir com o que podem nos oferecer aqueles que encontramos, vale a pena ''ficar'' ou ter a vida toda para não se arrepender de ter com quem compartilhar o que realmente se valoriza no convívio a dois.
Margareth dos Reis, psicóloga, terapeuta sexual e de casais do Instituto H. Ellis (SP) e doutoranda em Ciências