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Amizade entre antigas rivais

Algoz da seleção, Mireya Luis se torna amiga de rivais brasileiras e as chama para Cuba

Folhapress
19 jan 2024 às 11:20

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- Reprodução/Instagram
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Tomar uma dose de caipirinha antes de comer uma feijoada ao som de Cidade Negra é uma combinação quase irrecusável para a ex-jogadora de vôlei cubana Mireya Luis, 56.


Ela aprecia o povo brasileiro e com ele se identifica. "Somos todos latinos, com um sentimento bem profundo pelo próximo. Somos assim em Cuba também, temos isso em comum", diz ela à Folha de S.paulo.

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Seu carinho e respeito pelo Brasil despertam sentimentos contraditórios no país sul-americano. "É quase uma relação de amor e ódio", brinca.

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No auge de sua carreira, ela foi uma das maiores algozes da seleção brasileira feminina de vôlei apesar de ter somente 1,75 cm, uma estatura considerada baixa para os padrões da modalidade. Uma característica que ela compensava com a impulsão de seu salto, com o qual alcançava até 3,36 m.

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Se não fosse pela pequena voadora, o tão sonhado ouro olímpico do Brasil poderia ter saído bem antes dos Jogos de Pequim, em 2008. Provavelmente, das mãos de Ana Moser, Fernanda Venturini, Marcia Fu e Fofão, que fizeram parte de uma das mais talentosas gerações de atletas brasileiras da modalidade.


O seleto grupo acabou impedido de chegar a duas finais olímpicas, nos Jogos de Atlanta (1996) e Sydney (2000). Em ambas as disputas, acabou eliminado por Cuba nas semifinais, em confrontos até hoje relembrados pelas atuações memoráveis de Mireya, além da tensão nas quadras.

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O episódio mais marcante da rivalidade aconteceu na Olimpíada em solo norte-americano, com partida finalizada em briga. A confusão começou na saída da quadra, após um desentendimento entre as jogadoras, e continuou nos acessos aos vestiários.


O caso foi levado até a polícia, onde as brasileiras admitiram que foi Marcia Fu quem desferiu o primeiro golpe, mas que logo depois houve um empurra-empurra e uma série de tapas e chutes de todos os lados, conforme relatou reportagem da Folha de S.Paulo na época.

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Apesar do conflito, Mireya diz que havia um respeito mútuo entre as equipes. "Em quadra, a rivalidade existia. Mas também tinha um respeito muito grande. Na época, nós até éramos danadinhas. Se não fosse os leões nos vigiando o tempo todo, poderíamos ter tomado umas cervejas em algum lugar."


Mais do que "danadas", as cubanas eram talentosas. Tanto que suas vitórias extrapolaram o universo do esporte e viraram referência de sucesso na sociedade cubana. Chamadas de "Morenas do Caribe", Mireya e suas companheiras de equipe simbolizavam a força das mulheres do país.

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A imagem foi construída com três medalhas de ouro em Olimpíadas: Barcelona (1992), Atlanta (1996) e Sydney (2000). As conquistas também foram intercaladas por títulos mundiais, conquistados em 1994 e 1998.


O histórico poderia ter sido ainda mais impressionante se Cuba não tivesse ficado fora das Olimpíadas de Los Angeles (1984) e Seul (1988) por razões políticas

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"Eu senti muito não poder ter ido aos Jogos Olímpicos", reconhece Mireya. "Mas talvez minha juventude, minha vontade de jogar e minha força psicológica tenham me dado uma fortaleza para não desmoronar."


Hoje, olhando para o passado, ela vê a ausência naquelas edições com serenidade. "Ganhei três ouros, o que mais eu posso querer?"

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O tom de resignação também é uma forma de evitar uma crítica direta a Fidel Castro (1926 - 2016), que orquestrou os boicotes aos Jogos de Los Angeles e Seul.


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Mireya fala com saudade quando se refere ao ditador cubano. "Eu tinha uma relação quase pessoal com ele. As pessoas me distinguiam por essa relação, por essa amizade que tínhamos. Ele gostava muito de esportes e valorizava nossas vitórias", lembra.


"Mesmo quando a gente perdia um campeonato, ele nos recebia no palácio de braços abertos e dizia que sempre faria isso, ganhando ou perdendo", conta. "Isso nos estimulava tanto porque era um compromisso que não era político, mas ao mesmo tempo era quase político."


De política, ela diz não gostar até hoje. Atualmente, faz parte do COI (Comitê Olímpico Internacional) e trabalha no desenvolvimento do vôlei de praia em Cuba.


Desde o último dia 6, a cubana está no Brasil. Convidada pelo Sesc (Serviço Social do Comércio) para fazer parte da programação de verão da entidade, ela tem participado de clínicas de voleibol e bate-papos com o público que frequenta as unidades da instituição.


As atividades contam, ainda, com a presença de antigas rivais, como Ana Moser, Fofão, Karin e Virna (veja a programação abaixo).


"Eu sinto uma satisfação imensa de vir aqui, já que o Brasil é um país muito importante e que ama muito o vôlei", diz Mireya.


A cubana só lamenta a imagem que uma parte dos brasileiros faz de seu país, principalmente por pessoas de orientação política à direita. Ela não conhecia, mas achou estranha a expressão "vai para Cuba", que se tornou comum em discussões políticas, com uma conotação negativa.


Filha de um migrante haitiano com uma cubana, Mireya gosta de expressar seu patriotismo a despeito de Cuba viver sob uma ditadura em que a liberdade de expressão é cerceada.


Ela mesma precisou lidar com isso ao longo de sua carreira quando recebeu o convite para jogar no Brasil, mas foi impedida de deixar seu país.


"Na época, não lembro exatamente o ano, nem o clube, mas Cuba não estava aberta para que os jogadores fossem jogar em outros países", diz ela. "Mas minha paixão sempre foi jogar na equipe nacional cubana, ou seja, nada mais", acrescenta.


Ela também gosta de citar uma expressão que é comum em seu país: "Conheçam Cuba primeiro, vivam Cuba primeiro, depois o estrangeiro".


Por isso, ela fez um convite aos brasileiros: "Que venham e conheçam Cuba".


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