Há 22 anos, pesquisadores registraram 176 espécies de aves no campus da UEL (Universidade Estadual de Londrina). Para avaliar como esses pássaros se desenvolveram ao longo dos anos seguintes, um estudante do último ano de Ciências Biológicas da instituição decidiu atualizar o estudo e constatou que o campus ainda tem uma variedade de ambientes adequados para a ocorrência delas.
A pesquisa recente apontou que a riqueza da avifauna ainda é similar, ainda que a composição das espécies tenha sofrido alterações. Diante da relevância, a pesquisa do estudante Matheus Marques Tavares, que é bolsista de IC (Iniciação Científica), foi publicada na Ornithology Research, periódico científico oficial da Sociedade Brasileira de Ornitologia.
Para a análise, Tavares seguiu – literalmente – os passos dos autores do primeiro estudo, Edson Varga Lopes e o professor Luiz dos Anjos, do departamento de Biologia Animal e Vegetal (do CCB - Centro de Ciências Biológocas) e coordenador do Lobio (Laboratório de Ornitologia e Bioacústica da UEL). O método foi o de transecto linear, que consiste na definição de um trajeto a ser percorrido para a observação e o registro de ocorrências, no caso, do aparecimento das aves, além de suas características e comportamento.
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As transecções ocorreram no início da manhã, de 6h às 10h, e contaram com o auxílio de um gravador digital e um microfone direcional de alta qualidade para o registro da vocalização das aves, importante elemento para auxiliar na identificação, uma vez que cada pássaro possui uma assinatura vocal específica.
Segundo o estudante, das 176 espécies registradas na UEL de 2001 a 2002, 41 foram encontradas na trilha próxima ao viveiro de Produção de Mudas (Horto Florestal). Porém, este caminho desapareceu ao longo dos anos, deixando de compor a análise mais recente. “Então, como eu não poderia analisar o Horto, não trabalhei com estas 41 espécies que eles encontraram lá. Assim, me restaram 135 espécies que foram encontradas por eles nos outros transectos”, detalha. Os outros locais analisados foram áreas próximas à Fazenda Escola, o Calçadão da UEL e a margem sul do campus, próximo a plantações.
Tavares fez observações de julho de 2019 a março de 2020, contando com a sorte de ter concluído a etapa antes da suspensão das atividades presenciais na UEL com o avanço da Covid-19. Nestes locais, registrou a presença de 136 espécies, uma a mais do que o total encontrado em 2001 e 2002 nos respectivos locais. “A riqueza de espécies foi muito parecida, a diferença está na composição. Noventa e seis espécies se repetiram e 39 entre as 135 não apareceram. Além disso, 40 espécies que eu encontrei não estavam no trabalho anterior, este que é um grande ponto chave do meu trabalho”, frisa.
A hipótese apresentada para o desaparecimento das espécies segue dois fatores principais. O primeiro tem a ver com a predominância de espécies que se alimentam em ambientes aquáticos estarem entre as 39 “desaparecidas”. Durante as observações, o docente notou que os tanques de piscicultura localizados próximo ao Leacem (Laboratório de Ecologia Aquática e Conservação de Espécies Nativas) estavam desativados, o que pode explicar o sumiço de espécies como garças, martins-pescadores, jaçanãs e demais espécies que precisam de áreas alagadas.
O outro fator tem relação com o crescimento da mata na região da réplica da primeira Igreja Matriz de Londrina, que deixou de ser considerada uma zona arbustiva e passou a ser definida como mata secundária. “Aqui na mata da capela tivemos a colonização de novas espécies que o Edson registrou somente no Horto Florestal e eu registrei somente na mata da capela, o que indica que esse crescimento da mata da Capela gerou esse movimento das aves do Horto pra lá e eu pude registrá-las andando pelo Calçadão mesmo”, explica.
Produzido com Luiz dos Anjos e Helon Simões Oliveira, o artigo foi publicado em junho deste ano trazendo, ainda, a classificação das espécies em relação à sua exigência por alimentos. Um ponto positivo, avalia Tavares, é a predominância de espécies do grupo das especialistas de alimentação, ou seja, espécies que consomem alimentos específicos, sobre as chamadas generalistas. “Nos centros urbanos vamos registrar a maior presença de generalistas e aqui temos a maioria de especialistas, o que demonstra que a UEL tem uma variedade de habitats e nichos a serem ocupados, assim como uma elevada oferta de recursos”, pontua.
Coautor do artigo, Helon Simões Oliveira já vinha estudando a influência de fatores ambientais e espaciais de pequena e grande escala sobre a diversidade das aves na Mata Atlântica. Devido à aproximação dos temas, foi convidado pelo professor Luiz dos Anjos para colaborar com a pesquisa.
Ele detalha que alterações na vegetação e na paisagem são fatores que afetam a presença e a distribuição das espécies de aves devido à consequente alteração do seu nicho ecológico. “O nicho ecológico de uma espécie é entendido como um hipervolume n-dimensional, no qual os eixos são fatores abióticos (como temperatura e precipitação) e bióticos (como predação ou competição). Uma espécie só ocorre em determinado local se a combinação desses fatores for minimamente ideal, então quanto menos adequado é o ambiente local, pior será para a espécie sustentar uma população saudável, ou seja, para que possa concluir com êxito todo o seu ciclo de vida”, diz.
A sensação de ver as pesquisas da UEL sendo publicadas em periódicos científicos de destaque é “excelente”, define Anjos. Pelo Lobio, o professor colaborou com a formação de 20 doutores, 30 mestres e 15 graduandos cujos TCCs (Trabalhos de Conclusão de Curso) foram voltados ao estudo das aves. “Ainda tivemos muitos estagiários, alguns com bolsas de Iniciação Científica. É excelente. A sensação é de realização quando um aluno consegue publicar seu trabalho”, afirma.
Símbolo da UEL
Programado para outubro deste ano, o Vestibular UEL 2024 tem a presença de um personagem "bom de bico" na identidade visual: o benedito-de-testa-amarela (Melanerpes flavifrons). Ave da numerosa família dos pica-paus, o benedito não necessita de mais do que 20 cm para chamar a atenção e encantar os olhos de visitantes, servidores, docentes e estudantes da UEL, seja pelas suas cores ou pelo seu tamborilar.
Questionado sobre quais seriam as espécies-símbolo da universidade, Tavares destaca algumas já conhecidas dos observadores de aves, como a pequena Pula Pula (Basileuterus culicivorus) e o Sabiá-Laranjeira (Turdus rufiventris), que é a ave-símbolo do Brasil:
Outro destaque é para a beleza das aves de rapina, tais como o gavião-carijó (Rupornis magnirostris) e o sovi (Ictinia plumbea), que estão entre os predadores das aves na UEL (junto dos gatos que povoam o campus).