Laura estava em uma festa que sabia não ser para ela. Era para seus filhos. Apesar de se divertir com a alegria que presenciava, ela já passava dos 45 anos e as brincadeiras que faziam eram para os jovens. Subiu para o seu quarto a fim de se vestir de modo mais formal. No entanto, ao chegar lá, encontrou uma mulher mais jovem a chorar por que não tinha vestido para a festa. Viu o marido desta mulher deitado na cama numa atitude de indiferença.
Penalizou-se e deu à mulher seu próprio vestido que com alguns ajustes ficaria perfeito. A mulher ficou grata e feliz. Já vestida e linda acompanhou o marido que lhe estendeu o braço a caminho da festa.
Laura saiu e em seu caminho encontrou vários garçons e uma turma de cozinheiro e arrumadeiras, todos no preparo e manutenção da festa.
Quando menos percebeu se deu conta que estava na rua, já fora da casa em festa.
Ficou um pouco chocada por não saber onde estar e nem por aonde ir. Seguiu em frente e parou em outra casa onde haviam pessoas reunidas para lazer e amizade. Não se sentiu bem com o clima dali e seguiu em frente novamente sem saber para onde.
Andando por uma calçada bem arrumada e arborizada, sentiu-se muito triste e chorou. Foi quando dois jovens rapazes se chegaram a ela e muito tranqüilo e exuberantemente se ofereceram para acompanhá-la em seu novo caminho até encontrar seu lugar.
Laura estava triste, mas seus acompanhantes prometiam que tudo mudaria e ela seria feliz novamente. Podia contar com eles.
ANÁLISE
Laura é um nome fictício de uma senhora de 48 anos e que está vivendo o período de menopausa. Período esse que, devido às mudanças hormonais, faz com que a maioria das mulheres pense que o seu corpo foi trocado, como se esse corpo não lhe pertencesse. Além de todo desconforto biológico que varia entre as mulheres, ainda há toda uma nova adaptação emocional e psicológica para o marco da descida da vida.
O corpo já não possui a energia que antes esbanjava; seus afazeres provocam cansaço; percebe sinais de velhice na pele e na forma do corpo; o sexo tem que ser totalmente repensado, pois até mesmo o cheiro do corpo mudou.
Na festa borbulhante da vida da qual fazia parte sem nem se quer perceber sua real importância, agora é mais uma observadora do que participante ativa.
No sonho como na vida, Laura passa a vez do borbulhar aos filhos e aos jovens.
O vestido que usaria deixa para uma mulher mais jovem que ainda se importa em ser acompanhada pelo marido até o salão de festas. Por que Laura, realmente não se importa com certas coisas que hoje considera de somenos.
Mas ela ainda não sabe dizer com o que se importa. Está num período de grande mudança de valores.
Sai pelas ruas e pela vida a investigar o que lhe seria importante e de repente, nada lhe diz o que lhe dizia antes.
Laura chora por sentimento de perda e corre o risco de entrar em depressão. Ela está perdendo o mundo como via antes.
É uma das tantas travessias que já fez em sua vida. Como se casar, como ter filhos, como conseguir um novo emprego, como decidir ser solteira, como fazer faculdade fora da cidade, como... Enfim, todas as mudanças que já encarou e fez.
Fica feliz com a alegria alheia. Mas, a vida não pode ser só isso.
Deve haver alguma coisa que lhe torne tão intensa quanto antes. É necessário um novo sentido para a vida. E sentido vem de sentir. Uma apreciação da vida pelos sentidos.
Seria um cachorrinho, um gatinho, quem sabe um neto ou uma nova religião¿
Talvez se matricule em um curso de dança ou faça uma nova faculdade ou abra um novo negócio ou, ou, e ou.
No entanto, nada irá ajudar se Laura não for honesta consigo mesma e acolher seu novo estado. Laura está mais consciente de que está envelhecendo, mais consciente da aproximação da morte. E quando Laura acolher esse estado de coisas, sua intensidade e brilho voltarão sem haver necessidade de se esforçar para tal e nem de forjar um auto-engano para mostrar ao mundo que nada mudou.
Mudou sim! E as mudanças serão todas bem vindas se Laura admiti-las e procurar se adaptar. Antes de mais nada terá de se haver com a dor. Chorar e reclamar. Por que o verbo reclamar vem da palavra francesa "reclamer" que significa chamar de volta o gavião que voou para longe. É utilizado no esporte no qual se condiciona o gavião a ir vir para o braço da pessoa que o soltou. Psicologicamente, significa que o gavião é o representante dos instintos e do espírito que faz do corpo um corpo vivo e animado.
Laura passará por um período de choro e reclamação, mas sem se deixar ficar ali, Laura vai seguir em frente mesmo não sabendo para aonde. Ela não se entrega. Mas ainda não conhece seu novo lugar.
E aí o sonho vem para auxiliar em mais uma travessia. Os rapazes representam a energia exuberante e jovem que Laura possui em sua psique. E com essa força psíquica Laura pode contar em suas novas descobertas. Laura não está sozinha, ela tem a companhia de sua força psíquica que possui as características de empreendedorismo e de ação além da curiosidade de descobrir caminhos e do prazer das novas descobertas.
Laura perdeu um "status", no entanto, ao enfrentar sua nova jornada, encontrou sua própria força e beleza de um novo estado de consciência e de valores em relação a como ocupar sua existência de modo a respeitar seu momento e dele viver o melhor.
Conclusivamente, vemos nesse sonho, com clareza, que uma das funções do sonho é de preparar o sujeito para enfrentar o cotidiano e auxiliar em sua adaptação às mudanças.
Claro que um sonho, não possui somente uma interpretação. Ele é como um diamante lapidado e possui várias facetas. Essa que eu trouxe diz respeito tão somente a uma faceta que contribui para a análise do sujeito.
Os sonhos devem ser anotados e relatados no café da manhã, não para serem analisados, mas para garantir a aproximação da consciência com os fatos instintivos do inconsciente. Essa prática auxilia na prevenção contra a neurose por que se entende como neurose o afastamento da consciência racional dos instintos. Ao dar atenção aos sonhos o sujeito estará, mesmo sem ter a organização da razão a lhe dar diretriz e análises, permitindo-se aceitar conteúdos inconscientes.
sonialunardon@gmail.com