VIVA O POVO BRASILEIRO
A leitura é importante para o desenvolvimento intelectual e um entretenimento
muito interessante. Além do deleite que uma bela obra provoca pela perspicácia
de seu autor o que apraz bastante é a escrita elegante, pois, com ela, além de
ler um texto agradável e do enriquecimento cultural, aprende-se o uso
adequado da Língua Portuguesa.
A literatura brasileira tem muitos exemplos de textos impecáveis. O de João
Ubaldo Ribeiro, por exemplo. Há um cuidado com a linguagem que beira à
perfeição, principalmente em Viva o povo brasileiro, uma das obras-primas de
nossa literatura. Quem se interessa por leituras prazerosas e edificantes não
pode deixar de ler essa obra. Leia dois trechos desse livro:
Primeiro quem o tinha visto foram os moços da Beija-Flor, que livravam a
barra para arriar a rede de tainhas e, quando já manobravam para acertar a
canoa na correnteza, um vinco suave nas águas paradas lhes chamou a atenção
e imediatamente um terror sem medidas lhes esfriou o sangue.
Dandão morreu no sétimo ano da guerra, tão forte como sempre fora e sem
tempo para despedir-se. Contudo, parecia que sabia que ia morrer, porque,
antes de sair na patrulha de que não voltaria, lhe passara sua bolsa, com a
canastra dos segredos.
Observe o uso perfeito dos tempos verbais, das vírgulas e dos pronomes
oblíquos átonos o e lhe. Sobre estes que discutiremos
agora:
PRONOMES OBLÍQUOS ÁTONOS
Os pronomes oblíquos átonos são me, te, se, o, a, lhe, nos, vos, os, as,
lhes. Eles podem funcionar como complementos de verbos, de substantivos
abstratos ou de adjetivos e ainda como indicadores de posse.
Há complemento verbal quando o sujeito praticar a ação ou quando participar
ativamente de um fato. Por exemplo, o verbo ver: o sujeito participa
ativamente do fato, ele vê algo, e este termo (algo) é o complemento do verbo.
Pode ser, portanto, representado por um pronome oblíquo átono:
- Ele me viu.
Outro exemplo, o verbo passar: o sujeito pratica a ação, ele passa algo a
alguém, e esses termos (algo e alguém) são os complementos do verbo.
Podem ser, portanto, representados por pronomes oblíquos átonos:
- Ele me passou a bolsa.
Se os pronomes forem de terceira pessoa, usam-se o, a, os, as quando o
verbo não exigir preposição alguma e lhe, lhes quando o verbo exigir a
preposição a:
- Eu o vi ontem;
- Passei-lhe a bolsa.
Há complemento de substantivo abstrato, adjetivo ou advérbio quando esses
elementos exigirem preposição. Substantivo abstrato é aquele que indica ação,
qualidade ou sentimentos. Por exemplo, o substantivo abstrato
obediência, que indica a ação de obedecer. Ele exige a preposição
a: quem tem obediência, tem obediência a algo (ou a alguém).
Este termo pode ser representado por um pronome oblíquo átono:
- Ele me tem obediência.
Um exemplo de adjetivo: útil, que exige também a preposição a:
o que é útil, é útil a alguém. Este termo pode ser representado por um pronome
oblíquo átono:
- Isso me é útil.
Se os pronomes forem de terceira pessoa, usam-se lhe, lhes:
- Eu lhe tenho obediência;
- Isso lhe é útil.
INDICADORES DE POSSE
E, finalmente, os pronomes oblíquos átonos podem ser usados como
indicadores de posse: algo de alguém. Este termo (alguém) é que pode
ser representado por eles:
- Roubaram-me o carro (= Roubaram o meu carro);
- Pisou-me o pé (= Pisou o meu pé).
Se os pronomes forem de terceira pessoa, usam-se lhe, lhes:
- Roubaram-lhe o carro;
- Pisou-lhe o pé.
Nos trechos retirados da obra Viva o povo brasileiro há os seguintes usos de
pronomes oblíquos átonos:
- quem o tinha visto: quem vê, vê algo. O complemento de ver está na
terceira pessoa, por isso deve ser representado pelo pronome o, e não
pelo pronome ele.
- lhes chamou a atenção
- lhes esfriou o sangue
Em ambas há indicação de posse: chamou a atenção de alguém; esfriou o
sangue de alguém. Como o possuidor está na terceira pessoa do plural,
usa-se o pronome lhes. Poderia ser usado também deles:
- chamou a atenção deles;
- esfriou o sangue deles.
- lhe passara a sua bolsa: quem passa, passa algo a alguém. O
complemento de passar está na terceira pessoa e há a preposição a, por
isso deve ser representado pelo pronome lhe. Poderia ser usado também
a ele:
- passara sua bolsa a ele.
Assim se aprende a Língua Portuguesa: por meio de leituras de obras elegantes
e edificantes.