CANSEI DE BUSCAR A FELICIDADE.
A vida toda desejei obter a felicidade e a paz de espírito. Sempre fugi aos problemas e aos sofrimentos, como o pássaro foge da chuva, às vezes fechando meus olhos para eles, mesmo quando os sentia na carne ou no espírito. É impossível ao pássaro fugir da chuva, pois ele vive ao relento. Eu julgava ser possível escapar de todo e qualquer sofrimento bastando ignorá-lo, mas estava enganado o tempo todo; ele é inerente à vida de todos os seres sencientes. Nenhum ser escapa a ele.
Não há existência só com boas experiências, como não há somente dias claros. Às vezes, chove, como disse Manuel Bandeira, "uma chuvinha fina de resignação", como nossa submissão às inquietudes cotidianas, com as quais nos acostumamos e das quais não nos livramos por pura aceitação. Às vezes, caem, furiosos, grossos pingos sobre nossas cabeças, como padecimentos psicológicos que nos afligem de quando em vez e com os quais convivemos por nem saber donde eles nos vêm. Às vezes, precipitam-se sobre a terra tempestades assustadoras, como colapsos que nos levam à prostração extrema, impedindo-nos de encadear comunicação entre o nosso eu verdadeiro e a autoimagem imposta a nós por nós mesmos, que, aparentemente, nos guiará para a felicidade suprema.
FELICIDADE INCONSTANTE
Tudo o que fiz em minha vida foi uma vã tentativa de me defrontar com a felicidade e consequentemente me afastar do sofrimento, mas essa felicidade que vem das coisas exteriores a nós não tem longa duração; não se fixam em nosso espírito; transformam-se rapidamente em recordação e nos deixam sozinhos à busca de uma nova fonte de felicidade. É uma emoção indeterminada que não se mantém uniforme; está sempre sujeita a mudanças, de acordo com o humor do momento ou com as reações às causas externas.
Cansei de buscar a felicidade. Cansei de acreditar na teoria de Freud que diz que não há outra saída para o sofrimento senão suportá-lo. Cansei de tentar ver nas pessoas e nas coisas o que é criado por minha própria mente. Cansei de inventar um eu permanente para mim, um eu perfeito que não pode demonstrar fraquezas. Quero meu eu original de volta. Quero meu eu que se perdeu na juventude, que deixou a ingenuidade escapar e que deu lugar ao eu seguidor de regras, ao eu buscador de sucesso.
A FELICIDADE NÃO SE BUSCA
Agora eu sei que a felicidade não se busca, pois as suas causas estão em nossa própria mente. Agora eu sei que cada pessoa e cada coisa são o que são. Agora eu sei que posso alcançar a felicidade e a satisfação sem precisar de referência externa. Agora eu sei que há saída para o sofrimento; não há necessidade de somente suportá-lo. Posso transcender a ele por meio de minha própria consciência. Posso atingir um estado de plena satisfação comigo mesmo por meio de meu próprio estado mental.
Para isso, é preciso esforçar-se para manter-se constantemente ligado à virtude, ao que é considerado adequado à boa convivência com os demais. É preciso mudar o padrão de pensamento e de comportamento. É preciso ver o mundo com olhos melhores. É preciso enxergar uma realidade com maior essência de humanidade e com menor aspecto pessoal. É preciso ser mais feliz, mas com a felicidade autêntica, que não se encontra em lugar algum, e sim que é construída com esforço e perseverança, num exercício constante da própria mente. É preciso, enfim, ser mais compassivo, mais humano...