Noite Vazia é um daqueles clássicos absolutos do Cinema Brasileiro que até hoje permanecem desconhecidos do grande público. Há um constante deslocamento nesse filme: dois amigos anseiam por uma plenitude que nunca alcançarão - eles vagam por uma São Paulo noturna e silenciosa, se divertem e refletem sobre sua infelicidade, e acabam por encontrar duas garotas de programa no mínimo incomuns.
Walter Hugo Khouri filma essa busca como se a impossibilidade de atingir uma certa plenitude fosse a verdadeira razão de esses personagens existirem. Como se o diretor dissesse: eles existem porque algo lhes falta. E o filme se constrói a partir dessa estrutura: uma narrativa clássica, límpida, cristalina, em que cada gesto tem sua importância, cada olhar, cada posicionamento dos atores.
O grande trunfo, nesse caso, ainda se refere ao elenco: existe melhor dupla para confrontar essa vazio que Norma Benguell e Odeta Lara? dificilmente. Norma possuía um lado selvagem que nos seduzia por uma promessa de felicidade. Já Odete era mais realista nesse sentido: aproximar-se dela, ao menos nesse filme, é um ato consciente em busca da fuga, da auto-mutilação: uma recusa a si mesmo.
Odete e Norma eram impressionantes. Nesse filme, talvez, estejam no auge da beleza. Exibido em Cannes em 1964, Noite Vazia merecia um reconhecimento maior, e uma cópia restaurada em 35mm, em DCP, em Blu-Ray - uma boa cópia para que mais pessoas conheçam essa obra tão sofisticada e ao mesmo tempo tão singular na nossa cinematografia.
*Texto escrito a 6 de fevereiro de 2015.