Em um cenário de inflação e juros elevados, o setor de construção não é exceção. O custo para construir está em trajetória ascendente desde 2020 no país, o que representa um desafio em especial para as incorporadoras que fazem unidades para o Casa Verde e Amarela.
O programa habitacional tem um teto para o valor de comercialização das unidades -hoje em R$ 264 mil em São Paulo, após aumento de 10% em 2021. Assim, se o custo para construir os apartamentos subir, é preciso reduzir as margens de lucro.
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Isso pode expulsar empresas menores do segmento, causando maior concentração desse mercado e diminuição da oferta, analisa Eduardo Fischer, diretor-executivo da construtora MRV, uma das maiores do setor.
Ele afirma que as margens das unidades para baixa renda já estão menores do que costumavam ser, mas que, ainda assim, a empresa tem situação mais vantajosa frente a concorrentes pequenos.
"Se vou comprar terreno, a credibilidade da MRV é muito alta, consigo fazer uma negociação melhor e mais longa, pago quando sair o empreendimento, faço permuta, mas, às vezes, o pequeno não tem essa condição", diz.
Em 2021, a grande dor de cabeça do setor construtivo foi o preço dos materiais, que se elevou desde o início da pandemia. O INCC (Índice Nacional de Custo da Construção), que mistura materiais, serviços e mão de obra, segue alto: atingiu acumulado de 13,7% em janeiro. O item específico sobre materiais, equipamentos e serviços teve alta de 21,25% nos últimos 12 meses, contra 6,45% da mão de obra.
Além do preço elevado, houve escassez de alguns itens e extensão dos prazos de entrega. Para contornar o problema, as construtoras aumentaram seus estoques.
"Está sendo um desafio, houve muito aumento do custo de construção e não conseguimos repassar isso na venda. Temos que fazer obra em prazo menor, antecipar compra do que é possível, fazer bastante negociação", diz Dante Seferian, diretor-executivo da incorporadora Danpris.
A expectativa do setor é que haja uma desaceleração do preço dos materiais de construção ao longo do ano, mas com valores ainda em patamar acima do período anterior à pandemia.
"Se você comprava algo a R$ 5, subiu para R$ 8 e agora está a R$ 7. Hoje compro menos material do que comprava em 2019 [com o mesmo valor]", afirma Eduardo Zaidan, vice-presidente de economia da Sinduscon-SP (Sindicato da Construção Civil).
A atual retração do dólar deve fazer com que o preço de matérias-primas mais diretamente afetadas pela valorização da moeda americana, como aço e PVC, ao menos pare de subir, analisa Luiz Antonio França, presidente da Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias).
Ely Wertheim, diretor-executivo do Secovi-SP (Sindicato da Habitação), afirma que o custo dos materiais exerce hoje uma pressão menor sobre a cadeia da construção do que há seis meses, mas segue "um dos grandes gargalos".
O preço da mão de obra, que é um problema nos EUA, por exemplo, não tem o mesmo peso por aqui, dado o alto índice de desemprego brasileiro, em 11,6%, ressalta França.
Wertheim diz que os custos podem afetar o número de lançamentos de todos os padrões em São Paulo para 2023 e 2024, se a alta dos custos não for equacionada neste ano. "Vamos ter uma queda da produção acima da queda de vendas."
A inflação não alterou o valor dos subsídios concedidos para as faixas 1 e 2 -respectivamente, de até R$ 47,5 mil e de até R$ 29 mil. França, da Abrainc, diz que novos subsídios estão sendo discutidos no Conselho Curador do FGTS.
Diante da maior dificuldade para comprar a moradia, algumas incorporadoras especializadas no segmento econômico fazem um trabalho de consultoria de crédito, para que quem ainda consegue acessar o financiamento não perca a oportunidade por problemas na documentação.
Na Danpris, há nos plantões de venda uma sala para ajudar o cliente a ter seu crédito aprovado. "Ajudamos o cliente a montar a documentação, tem gente que precisa formalizar Imposto de Renda, decidir se vai juntar [a renda] com a esposa ou não", explica Seferian.
A Sindona, incorporadora que atua em Osasco, Cotia e Taboão da Serra (na Grande SP), tem uma subsidiária especializada nesse serviço de consultoria financeira, a Crédito do Bem. "Vivemos em um país com muita informalidade, a consultoria vai nesse ponto de auxiliar na formalização, abertura de empresa, declaração de Imposto de Renda, para que esse cliente consiga acessar o mundo financeiro", diz Bruno Sindona, fundador e diretor-executivo da incorporadora.
Os números de financiamento também indicam o cenário mais desafiador. Dados da Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança) mostram queda de 3% no volume de crédito com recursos do FGTS utilizado no Casa Verde e Amarela em 2021. Foram ao todo R$ 49 bilhões.
Já o financiamento via SBPE (com recursos da poupança) utilizado nos outros imóveis teve aumento de 66%, chegando a R$ 205,4 milhões.
Para 2022, é esperada recuperação do crédito com recursos do FGTS, com alta de 30%, e queda de 5% do SBPE, influenciada pelo aumento na Selic e nas taxas de financiamento imobiliário.