Dois anos depois da disputa presidencial mais acirrada desde a redemocratização, a expectativa de eleições municipais centradas na polarização entre Lula (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) cedeu espaço para outros fatores, como a aprovação de prefeitos que concorrem à reeleição, o arco de alianças e a força dos candidatos em plataformas digitais.
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No Recife, Rio de Janeiro e Salvador, prefeitos em busca de um novo mandato se saíram vitoriosos no primeiro turno minimizando o apoio de seus padrinhos políticos nacionais. João Campos (PSD) e Eduardo Paes (PSD), apoiados por Lula, e Bruno Reis (União Brasil), candidato de Bolsonaro, se reelegeram neste domingo (6).
Em São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL) reforçou seu vínculo com o presidente, e Ricardo Nunes (MDB) lidou com um apoio titubeante de Bolsonaro.
Confira abaixo quem sobe e quem desce com os resultados do primeiro turno:
SOBE
PL
O partido venceu no primeiro turno em Maceió e Rio Branco e vai disputar o segundo turno em outras noves capitais -Belém, Cuiabá e Goiânia entre elas.
Em Fortaleza, André Fernandes (PL) obteve 40,2% dos votos e vai enfrentar o petista Evandro Leitão, em uma derrota para Ciro Gomes e o PDT.
João Campos
O prefeito do Recife, do PSB, liderou a campanha eleitoral desde o início, sem enfrentar a ameaça de outro candidato competitivo, e venceu com 78,1% dos votos. Com o resultado, desponta entre os grandes vencedores das eleições deste ano e se credencia para disputar o governo estadual em 2026.
Ao longo da campanha, o filho do ex-governador Eduardo Campos preferiu não explorar a imagem de Lula, em uma estratégia para evitar o afastamento de eleitores de direita, e se recusou a assumir o compromisso de permanecer à frente da prefeitura até o fim do mandato. O prefeito reeleito é cotado como possível candidato a governador de Pernambuco.
Gilberto Kassab
O PSD, partido fundado pelo ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, deve comemorar um salto de seu partido nesta eleição. A sigla, que abriga políticos de diversas orientações ideológicas e apoia Lula e Tarcísio de Freitas (Republicanos) ao mesmo tempo, lidera a lista de prefeitos eleitos em capitais no primeiro turno e ficou à frente do ranking de legendas com mais prefeituras no país.
Eduardo Paes
A performance do prefeito, reeleito no Rio de Janeiro com 60,5% dos votos, foi um dos destaques da eleição. Ele iniciou a corrida com ampla vantagem sobre o candidato de Bolsonaro, Alexandre Ramagem (PL), viu seu principal adversário diminuir a distância nas pesquisas de intenção de voto, mas se segurou à frente da disputa.
O prefeito do Rio construiu uma ampla aliança com líderes evangélicos, freando o avanço do deputado do PL nessa fatia do eleitorado, e tentou afastar sua campanha da polarização nacional, minimizando o apoio de Lula. Paes não teve eventos de campanha com o presidente e, em suas falas, ressaltava suas divergências programáticas com o PT.
Ramagem apostou no caminho inverso. O candidato de Bolsonaro investiu na nacionalização da disputa e buscou associar ao máximo seu nome à figura do ex-presidente, que se engajou com força na campanha -nos últimos dias, Bolsonaro desembarcou no Rio de Janeiro e, com uma agenda intensa de eventos públicos, tentou levar a disputa para o segundo turno.
Tarcísio de Freitas
O governador de São Paulo foi o principal cabo eleitoral do prefeito de São Paulo e viu sua estratégia eleitoral prosperar na capital paulista neste ano.
Enquanto Jair Bolsonaro se recusava a participar mais intensamente da campanha de Ricardo Nunes, às voltas em um cenário de indefinição nas pesquisas de intenção de voto com Guilherme Boulos e Pablo Marçal (PRTB), Tarcísio assumiu explicitamente seu endosso ao prefeito e endureceu o tom contra o influenciador -o governador chamou uma possível vitória de Marçal de "porta de entrada para Boulos" e defendeu sua prisão devido ao laudo falso produzido contra o candidato do PSOL.
Com a aposta na campanha de Nunes em um momento desfavorável, Tarcísio ampliou sua força na política paulistana.
DESCE
Ciro Gomes
Em Fortaleza, André Fernandes (PL) obteve 40,2% dos votos e vai enfrentar o petista Evandro Leitão, em uma derrota nítida para Ciro Gomes e o PDT -a terceira colocação de José Sarto (PDT) no primeiro turno em Fortaleza fez com que o partido perdesse o comando da capital cearense, sua maior prioridade nesta eleição, depois de 12 anos.
Ciro e Cid Gomes estão rompidos desde 2022, desentendimento que levou a uma debandada do PDT no estado e ao enfraquecimento da antiga aliança com o PT. Cid migrou para o PSB.
Os Gomes sofreram outro golpe neste domingo: a hegemonia de décadas do clã em seu reduto no interior do Ceará, Sobral, foi quebrada. Oscar Rodrigues (União Brasil) derrotou a ex-governadora Izolda Cela (PSB) na disputa da cidade, hoje governada por Ivo Gomes, irmão de Ciro e Cid.
Romeu Zema
O governador de Minas Gerais viu seu investimento eleitoral naufragar em Belo Horizonte. Zema indiciou a vice do candidato Mauro Tramonte (Republicanos) que à época, em agosto, liderava as pesquisas.
Nas últimas semanas, Tramonte recuou em intenções de voto, e Bruno Engler (PL) e o prefeito Fuad Noman (PSD) acabaram passando para o segundo turno neste domingo.Tramonte ficou em terceiro lugar, com 15,1% dos votos, mesmo tendo recebido o apoio simultâneo do governador e do ex-prefeito Alexandre Kalil, rival de Zema na última eleição.
Engler contou com o apoio do deputado federal Nikolas Ferreira (PL), expoente do bolsonarismo nas redes sociais, e recebeu 34,4% dos votos. Fuad, beneficiado por uma campanha de voto útil contra o candidato do PL, obteve 26,5% dos votos.
Tramonte ganhou notoriedade em Belo Horizonte por apresentar um programa policial na Record. Em 2018, ingressou na política e foi eleito deputado estadual.
PSDB
O partido está fora da disputa nas capitais, sem nenhuma vitória no primeiro turno. Em São Paulo, José Luiz Datena terminou na quinta colocação no primeiro turno da disputa pela prefeitura. Com menos de 2% dos votos válidos, ele teve um desfecho que escancara o aprofundamento da crise que o PSDB enfrenta desde 2018.
O jornalista fez uma campanha errática, agrediu Pablo Marçal com uma cadeira em um debate e disse, neste domingo, que se arrependia de ter permanecido até o fim da disputa.
DE OLHO NO SEGUNDO TURNO
Lula e Bolsonaro
O presidente da República teve um envolvimento mais restrito na campanha de seus candidatos em capitais. Lula frustrou as expectativas de uma participação mais intensa em eventos com Boulos em São Paulo -na última semana, por exemplo, o presidente cancelou a participação em uma live com o candidato do PSOL em razão da sua viagem ao México para participar da posse da presidente Claudia Sheinbaum.
O desfecho em São Paulo deve definir o balanço dos esforços de Lula e Bolsonaro. Bolsonaristas e a direita mostraram força em todas as regiões do país, mas o ex-presidente sofreu derrotas em sua base eleitoral, no Rio de Janeiro, e não conseguiu eleger o irmão no interior de São Paulo.
As eleições deste ano fugiram à polarização nacional em muitos casos, mas, o segundo turno na capital paulista tem o potencial de pôr à prova o poder de Lula e de Bolsonaro de influenciar o futuro dos candidatos que disputam o comando da cidade.
Para a esquerda, o saldo do primeiro turno foi de resultado abaixo do esperado, com derrota, por exemplo, em Teresina, onde o PT tinha uma de suas principais apostas. Petistas, porém, ainda disputam o segundo turno em quatro capitais.