Polícia

Dois casos de feminicídio são julgados no Tribunal do Júri de Londrina julga nesta semana

02 mai 2023 às 11:00

O Observatório de Feminicídios de Londrina acompanha, nesta semana, o julgamento de dois casos que a entidade relata como feminicídios.


Nesta terça-feira (2), será julgado Nilson Silveira de Souza, 57 anos, acusado de tentativa de homicídio por motivo torpe contra Luciana Rodrigues Braga, 41 anos. A mulher teria sido atacada por ser lésbica, o que, para Néias, enquadraria o crime como feminicídio.


Já na quarta-feira (3), será o julgamento de João Ezequias Martins Filho, acusado pelo feminicídio de Cristiane Aparecida dos Santos, mulher negra de 37 anos, assassinada dentro da própria casa. 


Ambos os julgamentos começam às 9 horas, no Tribunal do Júri de Londrina, e podem ser acompanhados presencialmente, na Av. Tiradentes, 1575 ou pelo canal do Tribunal do Júri TJPR no Youtube.


O Observatório Néias produziu Informes sobre os dois casos. As informações completas podem ser acessadas nos documentos sobre o caso de Luciana e sobre o caso de Cristiane.



CASO DE LUCIANA


De acordo com a análise de Néias sobre o processo, Luciana foi vítima de feminicídio tentado, crime cometido  por Nilson Silveira de Souza, seu vizinho.  


Luciana vive em união estável com Evelyne que, após separar do ex-marido, tem um histórico de relação conflituosa com o réu e sua esposa, no qual se apela constantemente à sua relação com outra mulher.


Poucos dias antes do crime (em 16/11/2018), Evelyne recorreu à justiça para que a cônjuge do réu parasse de promover ameaças à sua integridade física e de proferir palavras injuriosas sobre ela e sua esposa. 


Uma discussão na vizinhança, provocada por uma terceira pessoa, passou às vias de fato envolvendo Luciana e a cônjuge do réu. 


Nesse momento, Nilson se aproximou de Luciana, proferindo xingamentos lesbofóbicos e desferindo um golpe de facão do qual Luciana se protegeu com o braço, recebendo um ferimento profundo que requereu uma intervenção cirúrgica. 


Antes desse fato, Nilson afirmava não aceitar relacionamento homossexual no bairro e que em “qualquer momento perderia a cabeça e faria uma besteira”.


Luciana manifestou em depoimento que Nilson foi motivado por preconceito racial, de gênero e por sua esposa ter sido notificada judicialmente por ter proferido ameaças contra Evelyne. Sua versão dos fatos foi confirmada por sua esposa e outras testemunhas. 


Por sua vez, Nilson disse em depoimento ter agido por legítima defesa dele e de sua cônjuge.


Embora o Ministério Público reconheça que o crime teria motivação torpe, “em razão de preconceito de gênero”, diante de uma relação estável entre duas mulheres, denunciou o réu por tentativa de homicídio por motivo torpe, sem acusação pela qualificadora de feminicídio. 


No entanto, a partir da análise do processo, Néias entende que a violência contra Luciana configura um feminicídio tentado não-íntimo, com base no inciso II da Lei de Feminicídio. 


O crime foi motivado pelo ódio dirigido a mulheres lésbicas, envolvendo um vizinho que, ao longo de vários anos, expressou seu menosprezo pela dignidade e pela vida de duas mulheres numa relação que contraria os padrões heteronormativos 



O CASO DE CRISTIANE


Na quarta-feira, será julgado em Londrina João Ezequias Martins Filho, homem branco de 62 anos (à época dos fatos), acusado pelo feminicídio de Cristiane  Aparecida dos Santos, mulher negra de 37 anos.


Cristiane foi encontrada assassinada na manhã de um sábado, em 10 de abril de 2021, sobre a cama, em sua casa  em Londrina, onde vivia com João há aproximadamente 1 ano. A morte de Cristiane foi causada por asfixia, que se tornou um agravante na acusação do Ministério Público contra o réu. 


Muito embora o réu negue as acusações, há relatos de que ele seria ciumento e controlador, mantendo a companheira presa em casa. Anteriormente, João Ezequias já foi condenado na Vara Maria da Penha por praticar violência contra a ex-esposa.


Para Néias, a análise do caso de Cristiane revela mais uma vez a face cruel da revitimização nos processos de julgamento de feminicídio. Afinal, no processo, ela foi tratada apenas como “objeto de prova”, pois pouco se sabe sobre a sua vida. 


Néias aponta que, sem mais informações sobre quem foi Cristiane, predomina a visão distorcida da defesa sobre ela. 


O uso de estereótipos como o vício em drogas para desacreditar Cristiane, assim como a  tentativa de descaracterizar sua união com João sob alegação de que ela teria “amantes”, apenas contribui para a culpabilização e revitimização de uma mulher que foi morta dentro da própria casa.

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