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Falta de terra gera violência entre índios guaranis

22 dez 2007 às 13:02

Uma das principais conseqüências da falta de terras para os índios no Mato Grosso do Sul é o crescimento da violência nas aldeias do estado, segundo a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), que cuida da saúde indígena. Neste ano foram registrados 14 casos de assassinato entre índios e 13 casos de suicídio apenas na reserva de Dourados.

"Esse número está sendo superior aos [dos] anos anteriores. Não só o numero é superior, mas a forma de levar a este assassinato está sendo de uma crueldade extrema", explica Zelik Trajber, coordenador técnico de saúde da Funasa no Distrito Sanitário Especial Indígena no Mato Grosso do Sul. Segundo ele, esse número pode ser quadruplicado se for considerada toda a região sul do estado.


Para Trajber, falta a presença do poder público na região. Ele também culpa a concentração de índios por metro quadrado pelos altos índices de violência. "Enquanto não houver uma definição de terra, os conflitos continuam. Os conflitos pela demarcação, pela definição da terra e as conseqüências de não ter terra", afirma.


De acordo com o assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) da regional de Mato Grosso do Sul, Rogério Batalha Rocha, o estado tem o pior quadro de violência contra povos indígenas no Brasil. "Os índices de assassinatos aqui no estado nos últimos meses são alarmantes, chega-se a registrar um assassinato por semana. É uma análise que já vem sendo feita há muito tempo que remete a esta problemática da terra", afirma.


Rocha acredita que os conflitos internos são ocasionados pela falta de terra na região. Ele explica que, antigamente, quando havia mais espaço, se houvesse um desentendimento entre os índios, havia a possibilidade de uma família se deslocar para outro local, o que não é possível hoje.


"Com a perspectiva de ampliação dos territórios, você 'distensiona' essas relações familiares que são muito presentes para os guaranis e permite que eles vivam na sua cultura. Eles se dividem em grandes grupos familiares, o que hoje não é possível, por causa do pouco espaço", afirma.


Segundo ele, são registrados assassinatos, estupros e pequenos furtos, mas apenas no âmbito das aldeias. "Apesar de haver todo esse índice de violência entre os guarani, que eles mesmos acabam sendo vítimas desta violência, você não vê nenhum caso, nenhum registro de agressões de indígenas contra não indígenas", ressalta.


O antropólogo Marcos Lima também ressalta a falta de espaço como origem dos conflitos internos. "Antigamente, o índio que via que estava perdendo poder se mudava para longe e formava outra área indígena. Quando havia um racha interno, quem estivesse mais enfraquecido politicamente ia para outro canto. Mas você só pode fazer isso se tem um amplo território. Se você está em uma área pequena, tem que lidar com o conflito que mora ao lado", explica.


O coordenador do Cimi em Mato Grosso do Sul, Egon Heck, lembra que, além dos conflitos entre os próprios índios, há problemas de disputas de terras com não-índios. Ele cita o caso da luta pela terra indígena Kurusu Ambá, onde já ocorreram dois assassinatos de lideranças. "Existe uma situação articulada de negação da terra aos Guarani aqui nesse estado", afirma.


A indígena Teodora de Souza, que é membro da comissão de professores Guarani-Kaiowá de Mato Grosso do Sul, diz que a convivência em um pequeno espaço de terra é contrária à cultura indígena.


"Antigamente, quando tinha algum tipo de problema que não era resolvido ali naquele espaço, as pessoas procuravam outros lugares e iam morar naquele outro lugar com aquela família grande. E hoje, se a gente tem um determinado problema, vai para onde? Somos obrigados a conviver naquele mesmo espaço. Isso vai gerando violência, vai gerando outros problemas, como depressão e uma série de outras conseqüências sérias para o povo indígena", avalia.


O administrador-executivo da Fundação Nacional do Índio (Funai) na região sul do Mato Grosso do Sul, Eliezer Cardozo, diz que a entidade está fazendo convênios para contratar mais advogados para acompanhar os índios presos. Segundo ele, há na região problemas com drogas, estupro e roubos. "Há todo tipo de violência que você possa imaginar", diz.


Nesta semana, foi criada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar questões relacionadas à saúde indígena no Brasil, após mais de seis meses de negociação.

As informações são da Agência Brasil.


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