"Devolvam a bolsa já", "LGBT é luta", "A homossexualidade não é doença. A homofobia, sim", diziam alguns dos cartazes levantados pelas mais de 200 pessoas presentes no protesto contra a homofobia realizado na noite de quarta-feira (23) em frente à Unifil, na avenida Juscelino Kubitschek.
A manifestação foi motivada por um suposto caso sofrido pela estudante Camila Santana. A aluna, no 5º ano de Agronomia na Unifil, recebia uma bolsa de estudos integral da universidade em troca de um trabalho voluntário dentro da própria instituição, mas acabou perdendo a bolsa pelo fato de ser lésbica, segundo relato da própria estudante.
O caso
A estudante trabalhava no Campus de Agronomia da Unifil quando foi demitida pela primeira vez. Na ocasião, em fevereiro, uma pessoa que trabalha no próximo ao local, no Hospital Veterinário da universidade, reclamou para Camila que ela e a namorada, Cláudia Mantoani, estariam "se agarrando" no estacionamento. A aluna se defendeu, dizendo que a namorada, também estudante da Unifil, a levava ao trabalho e se despediam "como todo casal", com um "selinho".
"Esperei minha chefe ou meu coordenador virem falar comigo, mas ninguém veio". Duas semanas depois, Camila foi mandada embora e perdeu a bolsa. "Do nada, sem nenhum motivo aparente", diz.
Depois da demissão, Camila e Cláudia, desconfiando de um possível preconceito sofrido, procuraram a Prograd (Pró-reitoria de Graduação) da Unifil. Em reunião, as estudantes explicaram o ocorrido e que acreditavam que a demissão tinha sido motivada por preconceito. "Falaram que iriam me realocar de novo na Unifil, para receber minha bolsa de volta", conta Camila. E foi o que aconteceu. A estudante voltou a trabalhar em abril, dessa vez na região central, longe do Hospital Veterinário.
"Consegui a bolsa de volta. Tudo certo. Eu e minha namorada resolvemos deixar a confusão de lado e seguir com a vida", conta Camila. A estudante não ficou 15 dias no novo estágio. Demitida de novo. A alegação foi a de que não haveriam mais vagas de voluntários para onde ela estava, segundo conta a aluna. "Não é possível, eles precisavam muito de ajuda naquele setor", diz Camila.
Na mesma semana em que foi mandada embora pela segunda vez, Camila e Cláudia receberam advertências por escrito. "O coordenador da Cláudia, quando entregou o papel a ela, disse que estava fazendo aquilo com muito pesar, porque não concordava", conta a estudante. A repreensão diz que as alunas descumpriram os artigos 96 e 98 do Regimento Geral da Unifil, mas sem explicar exatamente o fato que gerou esse descumprimento. Entende-se que as estudantes teriam desrespeitado a "integridade moral e física" das pessoas da Unifil, com "comportamentos incompatíveis com a dignidade da vida universitária" e atentando ao "decoro, bons costumes e probidade".
Depois disso, Camila e Cláudia procuraram um advogado e fizeram uma denúncia no Disque 100 - o Disque Direitos Humanos. Foi feita uma nota de repúdio, que se espalhou rapidamente, sendo compartilhada até pela Federação de Estudantes de Agronomia do Brasil.
As estudantes entraram com um recurso interno na Unifil para que as advertências sejam retiradas e Camila volte a receber a bolsa. "Queremos esgotar todos os recursos internos antes de entrarmos com outras medidas", diz a estudante. "Se nada acontecer, vamos tomar providências."
Depois da segunda demissão, as alunas se reuniram novamente com coordenadores. Segundo a estudante, não só a pessoa do Hospital Veterinário, como outras pessoas estariam pressionando a direção pela expulsão.
"Eu não tenho condições de pagar a faculdade. Depois disso tudo, minhas notas abaixaram, eu fui muito mal nesse período. Estamos tentando ser fortes para continuar com isso, vamos até o final", completa Camila.
O Protesto
Foi em protesto à essa situação que estudantes da UEL (Universidade Estadual de Londrina), da PUC (Pontifícia Universidade Católica) e da Unifil se reuniram em frente à universidade na noite desta quarta-feira. Durante uma hora e meia, as mais de 200 pessoas entoaram cânticos, ergueram cartazes e fecharam a avenida Juscelino Kubitschek.
"Não imaginávamos essa proporção, ficamos muito feliz em ver todo mundo lutando pelos direitos dos LGBTs", diz Camila sobre o protesto. "Esperamos que parem com as repreensões e que parem de nos perseguir dentro da universidade."
Na última terça-feira (22), estudantes do curso de Arquitetura & Urbanismo, em apoio à Camila e Cláudia, enfeitaram parte do bloco do curso com as cores do arco-íris, em alusão à bandeira LGBT. "Só colocamos lá, não fizemos nenhum comentário, nenhum discurso", diz Nícolas Passos. "Mas tiraram tudo. Não nos informaram de nada, nem sabemos que fim levou". O fato levou ainda mais polêmica para o protesto. "Gerou ainda mais revolta. Então nos organizamos, nos manifestamos sem ferir ninguém, sem ofender ninguém", completa Passos.
A Unifil foi procurada pela reportagem, mas preferiu não se manifestar sobre o caso.