Filosofia e afins

Da Bestumanização

08 fev 2018 às 09:37

Cervantes – assim como outros homens chamados de gênios que são um pouco (às vezes, até bastante) mais inteligentes que nós – cansa de fornecer exemplos da ignorância, mas, sobretudo, da estupidez humana. Diógenes O Cínico passa a vida a demonstrar a imbecilidade Homo sapiens sapiens com a própria linguagem do seu corpo. Ele conversa com estátuas, pede para Alexandre Magno deixar de lhe fazer sombra enquanto "pega sol" estirado no chão da rua, dorme em tonel (Ó o Chaves aí!) ou nos pórticos dos templos, "assovia em meio à multidão de modo a expressar seu descontentamento com um orador parvo", "depena uma galinha para demonstrar a falta de sentido das ideias platônicas" , "enxovalha os pés na lama antes de adentrar casas opulentas", por aí segue o jeito Diógenes de ser.

Só para dar a conhecer alguns desses "teóricos da conspiração" e suas incríveis obras posso citar: Jonathan Swift (irlandês, 1667-1745) com o seu As Viagens de Gulliver; Simone de Beauvoir (francesa, 1908-1986) com o seu Todos os homens são mortais; Ambrose Bierce (americano, 1842-1913) com o seu O Dicionário do Diabo; Henry Louis Mencken (americano, 1880-1956), no Brasil, sai um livro intitulado O livro dos insultos; Patrick Süskind (alemão, ainda vivo) com o seu O perfume – história de um assassino; o imortal Homero com os seus A Ilíada e a Odisseia; François Rabelais (francês, 1494-1553) com o seu Gargântua; William Shakespeare (se é que ele existiu mesmo, caso não o tenham passado por outra pessoa, inglês, 1564-1616) com o seu Rei Lear; Marquês de Sade (francês, 1740-1814) com o seu Diálogo entre um padre e um moribundo; Ítalo Calvino (ítalo-cubano, 1923-1985) com os seus O Barão nas árvores, O visconde partido ao meio e O cavaleiro inexistente; Mikhail Bulgakov (russo, 1891-1940) com o seu O mestre e Margarita; Oscar Wilde (irlandês, 1854-1900) com os seus O retrato de Dorian Gray e De profundis; Victor-Marie Hugo (francês, 1802-1885) com o seu O corcunda de Notre Dame; H.G. Wells (inglês, 1866-1946) com o seu O homem invisível; Voltaire (francês, 1694-1778) com os seus O ateu e o sábio, Zadig ou o destino, Dicionário filosófico e Cândido ou o otimismo; Petrônio (romano, caso também tenha existido, c. 27-66 d.C.) com o seu Satiricon; João Guimarães Rosa (brasileiro, 1908-1967) com o seu Grande Sertão: Veredas; Mary Shelley (inglesa, 1797- 1851) com o seu Frankenstein ou o moderno Prometeu; Travis Walton (americano, ainda vivo) com o seu Fogo no céu; R.L. Stevenson (escocês, 1850-1894) com o seu O médico e o monstro... Ad infinitum!!!... Todos (as) homens e mulheres excepcionais, muito acima da média, como pensadores, filósofos e pessoas de bem que chegam à triste e idêntica conclusão: o Homo sapiens sapiens não passa de uma besta agressiva e estúpida!!! Não sou eu que estou dizendo isso, apesar de concordar total e irrestritamente.


Inclusive, tal conclusão está sendo provada cientificamente, isto é, empiricamente, em laboratórios, entre tubos de ensaio e maquinaria de biogenética de última geração.
Até as décadas de 1960 e de 1970 (do século passado, obviamente), acredita-se que a Chita (aquela ou aquele, sei lá, macaquinho meigo e engraçadinho do seriado Tarzã, que vive se escondendo nos braços do herói selvático em busca de proteção) pertence ao "bonzinho" gênero de símios conhecidos como chimpanzés comuns, pois há ainda os bonobos (que de bobos também não têm nada). Pois sim que se vê tanta doçura! Esses hominídeos são de uma têmpera excessivamente violenta e destrutiva. A maioria deles é pra lá de bipolar e só age com afeição e paciência quando há interesse próprio envolvido.


Tal comportamento parece familiar?... Lembra alguma outra espécie de bicho terrestre?!... Está se provando que o nosso complexo de DNA se assemelha ou é igual a 98 ou 99 por cento ao dos "graciosos" chimpanzés e bonobos. "[...] Tanto a domesticação da besta humana quanto a criação de um determinado gênero de homem foi chamada ‘melhoramento’: Somente estes termos zoológicos expressam realidades." (NIETZSCHE, Crepúsculo dos Deuses, p. 58).


Sobre o que trata a Bestumanização, este termo agora e aqui criado? Ora, não dá para adivinhar?... Simples, dedica-se às questões mais profundas da natureza dos homens, das mulheres e/ou de quaisquer outros gêneros humanos existentes. Portanto e também, lida com o grande motivo do Bem e do Mal. Afinal de contas, tais "poderes" antagônicos veem-se amplamente incrustados em todos nós; sem exceção. São forças características e imanentes da nossa espécie Homo sapiens assim como de alguns animais "selvagens" – Pois, somos civilizados, não é?! – com destaque meritório para os já mencionados chimpanzés.
Quais são os principais programas televisivos de dantes e de hoje? Os classificados de "entretenimento" e que, segundo dizem ou nos fazem acreditar, são os mais assistidos ou populares.


São os programas de crime ou "policiais", casos de relacionamentos familiares e/ou entre vizinhos que se detestam, enfim: de "entretenimento rotineiro" ou, melhor ainda, de desgraceira generalizada. E quanto aos programas de "esportes"?... São os de luta ou MMS isso ou aquilo, ou então, os de futebol, basquete etc., nos quais torcidas e jogadores são anunciados como verdadeiros guerreiros (heróis) em campos de batalha... Sempre mais "entretenimento" barato!!! E, falando em animosidade, violência e espírito humano, não podemos deixar de lado o assunto guerra.

Guerra. S.f. Subproduto da Ciência da Paz. Um período de amizade internacional é a situação política mais ameaçadora. O estudioso de história que não está preparado para o inesperado pode vangloriar-se com razão de ser refratário ao saber. A máxima: "Se queres a paz, prepara-te para a guerra" tem um significado mais profundo do que sua interpretação habitual... Significa que o solo da paz está semeado com as sementes da guerra. – Ambrose Gwinett Bierce (1842-1914), pensador, escritor e jornalista de guerra norte-americano. (BIERCE, 1999, p. 108).


Eclode-se guerra devido aos assuntos mais idiotas e irrelevantes possíveis e há para todos os gostos e desgostos. Se houvesse um mote ideal para a espécie humana, este seria: A guerra é nossa vida para destruir, matar e aniquilar qualquer coisa que respire ou não!!! (infelizmente, não sei como fica isto em latim). E, não adianta dissimular, essa é a nossa autêntica natureza.
A estupidez humana atinge tal ponto que os seres humanos exterminam-se uns aos outros por causa de coisas insignificantes, de nenhuma importância. Existe um exemplo pertinente a essa questão, muito conhecido, na Literatura Universal. Trata-se de uma sanguinolenta guerra deflagrada entre duas nações devido ao desacordo em relação a melhor forma para se quebrar um ovo. Isto se verifica no capítulo I (Viagem a Lilipute) de Viagens de Gulliver do escritor e doutor em Teologia irlandês Jonathan Swift (1667-1745). Ei-lo narrado pelo próprio personagem Gulliver.


[...] Dois grandes impérios de Lilipute e de Blefuscu. Duas grandes potências que andam empenhadas, há mais de 36 luas, numa guerra encarniçadíssima, cujo móvel foi o seguinte: reconhece-se universalmente que a maneira primitiva de quebrar os ovos para comê-los consistia em quebrá-los pela ponta mais grossa, mas ao avô de Sua Majestade (de Lilipute), quando menino, numa ocasião em que se dispunha a comer um ovo e quebrá-lo consoante o hábito antigo, sucedeu-lhe cortar um dedo; pelo que o imperador, seu pai, saiu com um edito em que ordenava a todos os seus súditos que, sob grandes penalidades, quebrarem os seus ovos pela ponta mais fina. Ressentiu-se por tanta maneira o povo dessa lei, que, referem as nossas histórias, seis rebeliões estalaram por causa disso, nas quais um imperador perdeu a vida e outro, a coroa [...] Calcula-se que onze mil pessoas, em diversas ocasiões, preferiram morrer a se sujeitarem a quebrar os seus ovos pela ponta mais fina. (SWIFT, 1979, p. 41 e 42).


Temos encontros belicosos longos e encarniçados de todas as idades: Dos Nove Anos, Dos Trinta Anos, Dos Cem Anos etc.; de nomes diversos: Guerras Greco-Pérsicas, Guerras Púnicas, Guerra das Duas Rosas, Guerra Civil (espanhola, americana, romana, francesa, italiana, mexicana, guatemalteca, cubana, inglesa, russa etc.), Guerra do Peloponeso, Guerra do Golfo, Guerra do Vietnã, Guerra Franco-Prussiana, Guerras Napoleônicas, Primeira Guerra Mundial, Segunda Guerra Mundial, Guerra Hispano-Americana, Guerra da Coreia, Guerra Anglo-Espanhola, Guerra Anglo-Escocesa, Guerra do Afeganistão, Guerra Sino-Soviética, Guerra Fino-Soviética, Guerra Anglo-Afegã, Guerras de Independência (americana, mexicana, grega, irlandesa, líbia, argelina, indiana, polonesa, brasileira, uruguaia, ucraniana, sul-africana etc.), Guerra Sino-Japonesa... Ad infinitum. E quanto às "briguinhas" de outras categorias então: as batalhas, as revoluções, os levantes, as guerrilhas... A lista ultrapassa o infinito.
Temos legiões, tropas e grupos elitizados de todos os nomes e para toda e qualquer função. Noticiários, reality shows de todos os tipos – laicos ou não –, programas de auditório, simplesmente, sacramentam ao vivo, e em cores, toda a sucessão de desgraças da qual fazemos parte. É um festival televisivo, "jornalístico" e radiofônico diário de lorotas, farsas, informações inúteis, desinformações capciosas e propagandas hipócritas de filantropia ou de amor ao próximo.


Qual o livro mais consumido, e lido, no mundo? E quais são os outros grandes best-sellers mundiais?... Tratam de quê?... Pois é. Não é à toa que a atividade de mercenário é tida como a segunda profissão mais antiga do mundo (BRUYÉRE-OSTELLS, 2012, p. 7).
Tudo isso dito e todos os exemplos factuais encontram-se escancarados a nossa frente. Só não enxerga quem, infelizmente, não é provido de uma capacidade mental e/ou intelectual razoável ou quem prefere que as coisas caminhem e fiquem do jeito que estão ou que piorem ainda mais. É o tal: "Tá ruim (uma merda), mas tá bom!"
A Bestumanização não é uma realidade; é ficção científica, uma "teoria da conspiração"... Ah, é?!... Basta que se tenha um mínimo de conhecimento histórico e o menor grau de percepção das coisas e das pessoas para concluir o que somos de verdade. E como eu já disse no artigo anterior: que se reinvente outro modelo de ser humano porque esse que está aí deu errado, e muito.

Há solução? Sim, podemos nos curar.
E existe esperança ainda?... Paro aqui, pois como diz o sábio, e resignado, ditado popular: "Fazer o quê?".


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