No momento em que a China aperta o cerco contra a Covid-19 e que países da Europa monitoram pequenos repiques de casos, o presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a defender a flexibilização de restrições contra a crise sanitária e disse que o Brasil deve voltar à "normalidade" em abril.
Em entrevista à TV Ponta Negra, do Rio Grande do Norte, divulgada nesta quarta-feira (16), Bolsonaro também repetiu que o plano do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, é rebaixar o status da Covid-19 nas próximas semanas.
"Deve acontecer até o fim deste mês. Não se justificam mais todos estes cuidados no tocante aí ao vírus. Todo mundo vê que praticamente acabou isso aí", declarou o presidente.
"O povo abandonou praticamente as máscaras e outros cuidados", disse ainda.
As declarações de Bolsonaro ocorrem no momento em que o governo monitora casos suspeitos da deltacron, uma recombinação das variantes delta e ômicron da Covid. Além disso, há preocupação na pasta por novo surto de casos da doença na China.
O ministro Queiroga tem dito que irá declarar o fim da pandemia, o que cabe à OMS (Organização Mundial da Saúde), e rotular como endemia a doença no Brasil.
Segundo auxiliares do ministro, a ideia é apontar que o governo venceu a crise sanitária e desestimular as restrições contra o vírus, como uso de máscaras.
De forma geral, a mudança de pandemia para endemia ocorre quando a doença deixa de ser uma situação de emergência sanitária global e passa a apresentar número estável, mesmo que alto, de casos e morte em um local determinado.
"Acreditamos que a questão do vírus, Covid, está controlada. Ou seja, grande parte da população está imunizada", disse o presidente, que não se vacinou e distorce dados de segurança e eficácia das doses.
"Devemos, a partir do início do mês que vem, com a decisão do ministro da Saúde de colocar fim à pandemia, voltarmos à normalidade no Brasil", disse Bolsonaro.
Desde a volta do Carnaval a equipe de Queiroga tenta decifrar e colocar no papel a vontade do ministro. Assessores do ministro avaliam que é um erro afirmar que a pandemia será encerrada, pois quem toma esta decisão é a OMS.
Queiroga tem poder apenas de acabar com a Espin (Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional), que foi reconhecida por portaria publicada em fevereiro de 2020. Este movimento seria o principal caminho para esvaziar as restrições contra a Covid, avaliam auxiliares de Queiroga.
Mas encerrar a emergência nacional também levanta preocupações dentro do Ministério da Saúde. Isso porque é este status que dá lastro ao aval para uso emergencial de vacinas, compras sem licitação, restrições de importação de insumos de saúde e outras regras ligadas à pandemia.
Além disso, a Espin deve ser mantida enquanto há risco de surtos e epidemias de disseminação nacional, com gravidade elevada ou que podem superar a capacidade de resposta do SUS, segundo as regras atuais.
Ou seja, o governo teria de mostrar que o cenário atual no Brasil não abre margem para nova piora da Covid-19.
Por isso uma ala da Saúde defende uma saída de menor impacto, como apenas divulgar um documento orientando a flexibilização das restrições da Covid, ainda que Bolsonaro e Queiroga mantenham as falas de que venceram a pandemia.
Queiroga encomendou estudos a sua equipe sobre o cenário da doença no Brasil. Ele ainda tem se encontrado com autoridades para defender a mudança de status da Covid-19. Na terça-feira (15), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), manifestou preocupação com a ideia.
"Diante da sinalização, manifestei ao ministro preocupação com a nova onda do vírus, vista nos últimos dias na China, mas me comprometi em levar a discussão aos líderes do Senado", afirmou Pacheco em redes sociais.
A mudança de status da Covid-19 no Brasil ainda divide gestores do SUS. Os conselhos de secretários de saúde estados (Conass) e de municípios (Conasems) ainda não defendem a ideia, mas a Prefeitura do Rio e o governo do Distrito Federal, por exemplo, já desobrigaram o uso das máscaras mesmo em ambientes fechados.
O Brasil registrou 323 mortes por Covid e 50.078 casos da doença na terça. Com isso, o país chega a 655.649 vidas perdidas e a 29.432.274 pessoas infectadas pelo Sars-CoV-2 desde o início da pandemia. As médias móveis de mortes e casos continuam em queda, em relação aos dados de duas semanas atrás. A de óbitos agora é de 388 por dia, redução 24%. A de infecções chegou a 41.044, queda de 19%.
Apesar de estes números serem menores do que os registrados no pico da Covid, ainda são superiores a de outras doenças. Em 2015, por exemplo, o Brasil registrou o pior ano da dengue, com 986 mortes.