Você é capaz de imaginar uma grande empresa cujo modelo de gestão não admita um mísero gerente em seu quadro de quatrocentos colaboradores, a não ser o dono do negócio? Este é o caso da americana Morning Star, que é a maior processadora de tomates do mundo e tem um faturamento próximo a US$ 700 milhões anuais.
Eles encontraram uma forma de trabalhar na qual cada colaborador é consciente da sua missão e a cumpre. Assim, quando alguém precisa de apoio negocia responsabilidades diretamente com os próprios colegas de trabalho e trata de adquirir ele mesmo os recursos que julga necessários para o desempenho de suas atribuições. E mais ainda: como não há cargos ou promoções, os aumentos salariais são decididos por um comitê formado pelos pares avaliadores.
Mas por que ela investiu fortemente na descentralização do poder? Segundo Chris Rufer, seu proprietário, além do nível gerencial exigir salários muito altos, quanto maior a posição hierárquica maiores também são as chances de decisões desastrosas tomadas por uma única pessoa afetarem o futuro de toda a companhia – afinal poucos têm a coragem de questioná-las. E ele ainda lembra que muitas boas ideias são simplesmente descartadas por quem está no topo quando não atendem seus interesses políticos.
Na prática, quem trabalha na Morning Star sabe que o dinheiro está disponível caso precise comprar algo que julgue imprescindível para fazer bem o seu trabalho, pois inexiste um departamento central que se encarregue disto. Mas não pense que tal liberdade crie uma cultura de desperdício. As pessoas foram capacitadas a utilizar tamanha autonomia com o máximo de responsabilidade e sabem que seus atos serão avaliados e terão consequências. Positivas ou negativas.
Outro traço da cultura organizacional é que as pessoas lutam por contribuir de verdade com o trabalho de seus colegas – já que não precisam rivalizar por melhores cargos – e se interessam por desenvolver novas habilidades a fim de alcançarem uma boa reputação e avaliações positivas de seus pares. A hierarquia, portanto, é de influência e não de posição.
Também cabe destacar que a autogestão funciona na Morning Star porque as metas são muito claras e a total transparência faz com que qualquer exagero nos gastos ou ineficácia em determinada unidade de negócios seja escancarada para a empresa inteira. Ou seja, há controle, mas ele não é exercido por pessoas e sim pelo próprio modelo de gestão implantado.
Você talvez esteja ficando animado ao ler este relato e com uma vontade tremenda de implantar iniciativa semelhante em sua empresa, mas lembre-se de que não se constrói uma cultura de autogestão de uma hora para a outra. Estudo conduzido pela consultora Betania Tanure em 2011 com executivos de treze países revelou que as empresas brasileiras estão no topo do ranking do autoritarismo e por isto ainda precisaremos de algum tempo para assimilar uma ruptura ao modelo vigente.
A maior parte dos colaboradores da sua empresa deve ter construído a carreira em companhias hierarquizadas e não conseguiriam atuar num ambiente com autonomia total, mesmo que este seja um sonho recorrente deles. Quer um exemplo? Na hora de fornecer um feedback duro para o colega que apresentou baixo desempenho, muitos escolheriam a política de boa vizinhança, instituindo o pacto de mediocridade. Na Morning Star isto seria inconcebível.
As práticas bem-sucedidas das empresas que escolheram a autogestão são consequência de uma filosofia de trabalho que perdura mesmo quando os resultados de curto prazo são desanimadores. Não decorrem da empolgação momentânea surgida na reunião de terça-feira pela manhã e sim de uma decisão amadurecida e consciente.
No fundo, enganamo-nos ao pensarmos que empresas assim não têm gerentes. Lá, todos pensam e agem como um deles.
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