Usuários de direita e de esquerda no Twitter se manifestavam sobre a seleção brasileira de forma semelhante até o último dia 31. Após o anúncio do Brasil como sede da Copa América, com apoio do governo Bolsonaro, a discussão na rede social polarizou.
O diagnóstico tem como base o GPS Ideológico, ferramenta do jornal Folha de S.Paulo que analisa a discussão política na rede social. A partir de um modelo estatístico, 1,7 milhão de usuários foram posicionados em uma reta, considerando os perfis que essas contas seguem.
Um usuário que segue, por exemplo, os ex-presidentes petistas Lula e Dilma fica próximo de outro que segue o candidato a presidente em 2018 Guilherme Boulos (PSOL) e o governador Flávio Dino (PCdoB).
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Ambos, porém, ficam praticamente no ponto oposto na reta de outro usuário que segue o presidente Jair Bolsonaro e o escritor Olavo de Carvalho.
A reportagem analisou como se comportaram nos diferentes grupos ideológicos mensagens postadas e encaminhadas (retuitadas) que continham termos como "seleção", "Casemiro" (um dos capitães do time), "Tite" e "Neymar".
Antes do anúncio da mudança de sede, os usuários pareciam não considerar o perfil de uma conta para encaminhar (retuitar) posts que continham essas palavras ligadas à seleção.
Um usuário mais à esquerda tendia a retuitar mensagem ligada à seleção de outro usuário mais à direita (e vice-versa).
O panorama mudou após a Argentina anunciar que não poderia mais sediar o torneio, por causa da escalada da pandemia de Covid-19 no país. No dia seguinte à desistência dos argentinos, o Brasil foi escolhido como nova sede, com apoio do governo federal.
Jogadores da seleção e a comissão técnica demonstraram contrariedade com a mudança, dizendo que souberam da alteração pela imprensa e reclamaram da maneira como a CBF (Confederação Brasileira de Futebol) conduziu o processo, sem consultar atletas e membros da comissão.
Após essa sequência de fatos, os usuários apresentaram a tendência de retuitar mensagens de contas mais próximas ideologicamente.
Considerando os tuítes com o termo "Tite", antes da mudança da sede, os usuários retuitavam em média mensagens de pessoas 28 pontos distantes de sua posição na reta ideológica (medida em 100 pontos). Após a mudança e a reclamação da equipe, a medida caiu para 15 pontos.
Isso que significa que caiu quase pela metade a distância ideológica entre quem posta e quem retuita mensagens que citaram o treinador, o que denota uma polarização sobre o tema, pois as pessoas passaram a reproduzir mensagens de contas mais próximas ideologicamente.
Para essa análise, o 1,7 milhão de usuários foram divididos em 100 posições (pontos) na reta, sendo 0 o ponto mais à esquerda ideologicamente, e o 100, a extremidade mais à direita.
Considerando o termo "seleção", a distância ideológica caiu de 23 pontos na reta para 17.
Dois tuítes podem exemplificar essa mudança. O primeiro, de 30 de maio, foi retuitado em média por usuários que estavam 40 pontos distantes do autor na reta ideológica. Ele teve esse grande alcance mesmo com a utilização de teor violento: "Tomara q nessa fase violenta do Rodrigo Caio ele tenha mais um surto psicótico e tb agrida o Tite".
O outro tuíte, depois de o Brasil assumir a organização do torneio, foi retuitado por usuários que estavam apenas 3 pontos distantes, em média, na reta: "A direita vai derrubar o petista Tite ... quer apostar ? (...) Fora Tite".
Filho do presidente Jair Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) chamou o técnico de "puxa-saco de Lula". O vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) também criticou o treinador e sugeriu que Tite fosse trabalhar no Cuiabá caso não quisesse seguir no comando da seleção.
As mensagens relacionadas a Tite e Casemiro ficaram mais polarizadas após começar a circular informação de que a equipe estava insatisfeita com a Copa América, três dias após a mudança da sede.
Os tuítes referentes ao termo seleção já ficaram polarizados assim que a sede foi alterada.
Essa mudança de comportamento na rede social, quando considerados Tite, Casemiro ou o termo seleção, não se repetiu com as mensagens que citavam o atacante Neymar (usuários de direita seguiram retuitando posts de contas de esquerda, quando mencionavam o atacante).
Em outra forma de medir a polarização do tema, a reportagem também analisou o volume de tuítes postados relacionados à seleção.
Antes da mudança de sede, usuários de direita, de centro e de esquerda postaram em número semelhante mensagens contendo os nomes Tite e Casemiro, por exemplo.
Depois, as duas pontas (esquerda e direita) aumentaram o volume de mensagens, um comportamento parecido ao de tuítes com clara inclinação politizada, como os que contêm a palavra Bolsonaro (com as pontas tuitando muito mais que o centro).