Quem te viu, que te vê. O incendiário virou bombeiro. A menos de uma semana para o primeiro jogo com o Peñarol, pela decisão da Copa Libertadores, Muricy Ramalho abandona o estilo explosivo e assume postura light, quase na base do paz e amor, tão em moda nos tempos em que era boleiro e cabeludo na metade dos anos 1970.
O treinador do Santos garante que encara os duelos com os uruguaios com naturalidade e avisa que não vê como obsessão o título, um dos poucos que não tem na carreira que inclui como destaques quatro Brasileiros (2006, 2007, 2008 e 2010). "Não tenho essa loucura pela Libertadores", confidenciou Muricy, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
O tom moderado faz parte também da estratégia para os confrontos decisivos contra um rival com o qual o Santos histórico de Coutinho, Pelé e Pepe topou pela frente em 1962 (e de quem ganhou). Muricy pede um time atento, ligado, mas não "pilhado". Bate na tecla de que Libertadores "é futebol, não guerra", promete esquema atrevido e nem cogita a possibilidade de reprimir Neymar. "Como vou me meter com um cara que é fora de série?", questionou.
A versão suave de Muricy será colocada à prova nas duas próximas quartas-feiras: a primeira, em Montevidéu. A outra, no dia 22, em São Paulo. Ao falar sobre a importância da Libertadores, o comandante afirmou: "Torneio importante, diferente, mas não sou maluco por isso. Os outros é que ficam falando que preciso ganhar Libertadores. Nem penso nisso. Durmo muito bem antes dos jogos. Só perco o sono depois, por causa do estresse. Vou dormir às 5 da manhã e acordo às 7. Fora isso, nada, sou técnico de futebol e fui contratado pelo Santos para fazer trabalho de longo prazo".
O treinador também minimizou o fato de não ter conseguido sucesso em outras edições de torneios mata-mata. "Não sou bom de lembrar. Sei que cheguei uma vez na final da Libertadores, em 2005 (na verdade, em 2006, quando o São Paulo caiu diante do Inter), e perdi. Mas ganhei muitos torneios e perdi outros desse jeito. É da profissão. Eu vivo disso. E sei que vivo dos resultados", enfatizou.
Já ao comentar sobre a sua postura menos enérgica dentro de campo nos últimos tempos, Muricy declarou que as experiências do passado o fizeram ficar mais calmo à beira do gramado. "Acho que a gente vai ficando mais velho e muda. Levanto menos do banco, já não saio sem voz dos jogos", admitiu.
Prestes a lutar diretamente pelo título da Libertadores sob o comando do Santos, Muricy também voltou a revelar o seu descontentamento com a atual administração no Fluminense, clube que ele deixou neste ano depois de ter sido campeão brasileiro em 2010.
"Quando cheguei no Flu, fazia três anos que (o clube) brigava para não cair. Não tinha lugar para treinar, às vezes eu arrumava academia com algum amigo. Cheguei e não mexi com ninguém da comissão técnica e fui ganhando as pessoas. Na reta final, tinha jogadores machucados e todos se superaram. Ganhamos o título. Aí chegou gente nova no clube. E é que nem treinador, que não gosta de chegar em time campeão. Numa reunião no Clube dos 13, um dirigente disse para o presidente que ia me contratar. Ele respondeu que ia fazer mesmo grande mudança na comissão. Aí saiu o assessor de imprensa, que eu adorava. Depois, o diretor de futebol, que eu adorava. Pedi três reuniões, o presidente não foi em duas. Na única que tivemos, falamos três horas e em nenhum momento ele disse que ia acertar o que pedi. Os caras não queriam que eu ficasse. Não foram meus parceiros e saí", ressaltou.