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O Carnaval no fio da memória

27 fev 2001 às 16:28

Muitas e muitas linhas já foram escritas a respeito do carnaval de Curitiba, com uns poucos defensores de um lado e numerosos detratores de outro. Também houve quem propusesse aproveitar os feriados de Momo para realizar um encontro de música antiga e operística. A idéia não vingou, mas os foliões por sua vez não subiram nas tamancas para reivindicar seus direitos como súditos momescos, endossando assim a tese de que a cidade não tem o mesmo gás dos cariocas, dos baianos, nordestinos.

A classe média curitibana acompanha o trio elétrico em Caiobá, as escolas de samba lutam contra a falta de dinheiro e os clubes aos poucos vão minguando seus bailes. Milhares invadiam os salões ainda na década de 70, mas esse é mais um cenário envelhecido, como foto pregada na parede. E quando se procura pistas sobre o início carnavalesco em Curitiba, descobre-se que tudo que foi dito nas variadas publicações é uma repetição dos mesmos fatos, igual a um filme rodando sem parar. Acompanhe essa história.


Foi uma explosão aquela festa de 1857, no Theatro de Corityba, hoje considerada o marco zero do carnaval da cidade, mesmo tendo sido realizada num sábado de Aleluia, segundo um cronista da época: "Estrondoso baile mascarado houve neste ano no sábado de Aleluia, alegrado por boa orquestra". A diversão foi geral, mas como o teatro ofereceu apenas o espaço, quem quisesse sentar tinha que levar cadeira de casa.


As chuvas torrenciais que inundaram a estação em 1858, manteve os ânimos dos foliões em baixa, mas em compensação no ano seguinte o entusiasmo voltou em dobro. Nas ruas as brincadeiras de molhar as pessoas com bisnagas d"água e laranjinhas começavam a se tornar tradição. Aliás, esse tipo de diversão fazia parte do Entrudo, ou seja, o intróito para a Quaresma, que seria o gens do carnaval. A existência do Entrudo no Brasil volta-se no tempo até o século 17, com as manifestações adquirindo comportamentos característicos em cada região.


Em seu início era até recomendável a participação das pessoas que não só jogavam água nos transeuntes, usando para isso bisnagas, limões e laranjinhas de cera, mas também farinha, pó, talco. Porém, como resvalou ao mau gosto e à violência - havia quem atirasse graxa e lama nos incautos - acabou sendo reprimido no carnaval de 1863. Historicamente a manifestação perdurou até a República, quando se introduziram os hábitos de confete, serpentina e lança-perfume.


Considerado como um dos primeiros grandes carnavais curitibanos, o de 1863 foi "diferente de todos os outros". Bandos mascarados a cavalo e a pé encheram as ruas, "divertindo o poviléu", enquanto no Theatro Sete de Setembro o público se esbaldava em três bailes grandiosos.


No ano seguinte aumenta o número de foliões travestidos e mascarados; surgem os blocos Beduínos e Zuaces que aproveitam o desfile para distribuir máximas e pensamentos impressos ao público. Por causa da guerra do Paraguai pairam dúvidas sobre a realização da festa de 1865: centenas de voluntários partem para os campos de combate.


Em 1900 uma nova fase se inicia para o carnaval da cidade - nos próximos 30 anos vão imperar o corso, os bailes mascarados. Nesse 1900 o ar ganhou novos perfumes: eram as "bisnagas de vidro", novidade recém-chegada de Paris que não molhava, nem manchava as roupas. Aspergia fragrâncias de acácia, heliotrópio, violeta e cravo.


A Rua Quinze de Novembro transformava-se em cenário para os desfiles que aconteciam no domingo e na "terça-feira gorda"; os corsos eram a festa dos ricos alimentada pelos aplausos do povo nas calçadas. Organizados pelos clubes e famílias associadas, eram uma manifestação pacífica e cordata: os carros seguiam em filas, cada qual com uma decoração diferente, e a certa altura participavam de guerra de serpentinas.


A disputa para melhor acompanhar o féretro levou os mais espertos a alugar as sacadas de suas residências para famílias inteiras. O corso de 1929 teve 623 veículos, mas em anos anteriores os carros eram a tração animal. Podia-se alugar carros ali perto, nas cocheiras da Rua Ébano Pereira.


Os cavalos puxavam as carroças ornamentadas com uma profusão de flores e papel crepom. Moças e rapazes vestiam suas melhores fantasias, eles dando um toque de elegância apoiando-se em bengalas; elas carregando sombrinhas ou leques.


Eram odaliscas, baianas, havaianas; dominós, palhaços, árabes, piratas, arlequins e pierrôs. Todos filhos de famílias abastadas, costumavam se cotizar para comprar em média, para cada carro, um saco de confeti, 50 serpentinas, duas dúzias de lança-perfume. A propaganda veiculada na época apresentava o lança-perfume Pierrot como sendo: "uma declaração de amor engarrafada".


No começo do século a preocupação das foliãs era com a toalete, e as máscaras elas escolhiam na casa de Alfredo Hoffman, na Rua Riachuelo, 79. Os playboys tinham especial preferência em usar meias brancas femininas e corpetes como os dos cavaleiros medievais, confeccionados com tecidos baratos.


A década de 30 registra os carnavais glamurosos do Clube Curitibano. Ali, os bailes eram a rigor: mulheres ricamente vestidas cruzavam com homens envergando casacas e smoking. Claro, era um convite irrecusável para a elite comparecer em peso. Já num ambiente diverso os pobres e remediados também se divertiam: no Cassino Curitibano e Sociedade Operária Treze de Maio realizavam-se as sessões populares. Nestes tempos acontecem os primeiros concursos de fantasias nos clubes, há o surgimento maciço dos blocos.


As escolas de samba, os grupos organizados despontam entre os anos 40 e 50. Entre os pioneiros estavam os Títeres do Diabo (a marca de seus integrantes era a camiseta vermelha) e os Bohemios, de casaca. Eram duas sociedades rivais e aconteceu de, certa vez, se encontrarem num lugar onde havia pilhas de tijolos. A alegria para eles acabou ali, que se engalfinharam numa luta renhida. Já o último grande corso da cidade saiu em 1946.


É na década de 40 que o samba finalmente chega a Curitiba, apesar de estar amplamente difundido em outras localidades, a partir do Rio de Janeiro. Até então a predominância era a marcha como música de animação. A evolução leva ao surgimento das escolas de samba que só desfilarão competindo em 1957. A campeã foi a "Não Agite".


A história desta escola tem versões diferentes. Uma diz que ela foi fundada em 1948 com o fim do bloco de salão Vira-Lata. Há quem afirme que a "Não Agite" já existia, mas era muito pequena. Veio a se fortalecer quando alguns instrumentistas deixaram a Embaixadores da Alegria e se uniram ao bloco. Por fim tem-se o argumento de ter sido fundada em 19 de janeiro de 1949 e alçada à condição de escola de samba em 1957.


A "Embaixadores da Alegria" nasceu em 1948 graças a José Cadilhe de Oliveira, folião de marca maior. Tudo teve início no Bar e Confeitaria Stuart, ao som de batuque improvisado nas garrafas de cerveja e caixas de fósforo. O bloco ganhou o nome de "Cevadinhos do Amor" e, no carnaval desse ano, seus 38 figurantes saíram fantasiados de garrafas de cerveja Brahma. Em 1950, já como escola de samba, ostentava "Os Embaixadores da Alegria".


Um grupo de moradores do bairro Capanema, em sua maioria ferroviários, fez uma caixinha para comprar fantasias e sair "perturbando". Era o ano de 1946. Daí surgiu a Escola de Samba Colorado. Já o Grêmio Recreativo Escola de Samba Mocidade Azul ampara sua história em 1959 com a desistência do bloco "Ases da Alegria", formado por soldados e oficiais da Base Aérea do Bacacheri, que resolveu criar um novo grupo. Deixou a Sociedade D. Pedro II, transferiu-se para o Esporte Clube Belmonte, depois para a Sociedade Universal e por fim instala-se nas dependências do Esporte Clube Pinheiros. Em 1975 passa a se chamar Grêmio Recreativo Escola de Samba Mocidade Azul. Chegou a ser pentacampeã do carnaval curitibano.

Já o Bloco Carnavalesco D. Pedro II ressurge em 1979, torna-se campeão do grupo B em 1981 e no ano seguinte transforma-se no Grêmio Recreativo Escola de Samba Dom Pedro II. E foi de uma pequena charanga que acompanhava um clube de futebol do bairro Prado Velho que nasceu o Grêmio Recreativo Escola de Samba Sapolândia, em 1970. Mais precisamente "na quarta-feira de cinzas", conforme Júlio Cesar Amaral de Souza, seu fundador.


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