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Resenha

Professor brasileiro explica Jesus e o cristianismo desde o começo

Reinaldo José Lopes - Folhapress
04 abr 2021 às 16:05

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- Pixabay
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O milagre da multiplicação dos livros sobre a figura histórica de Jesus se tornou uma das tradições da Semana Santa. Entretanto, não é fácil achar uma obra com essa temática que se disponha a começar do início, explicando as bases dessa área de pesquisa, em vez de expor uma nova hipótese bombástica sobre o Nazareno. Para quem quer dar os primeiros passos nessa discussão, um livro recém-lançado por um historiador brasileiro pode ser útil.


"Jesus: Um Breve Roteiro Histórico para Curiosos" é a primeira obra escrita sobre o tema por Alex Fernandes Bohrer, professor do IFMG (Instituto Federal de Minas Gerais) e especialista em história da arte. Com uma estrutura simples, a partir de capítulos em formato de perguntas –"O que é a Bíblia?", "Como foi a infância de Jesus" etc.–, a obra busca explicar, com considerável sucesso, o que os historiadores sabem sobre Cristo e sobre as origens do cristianismo.

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Conforme mostra o livro, o estudo do chamado Jesus Histórico (assim chamado por oposição à figura do Cristo divino, cujos milagres, ressurreição e natureza eterna não podem ser comprovados ou refutados pela pesquisa acadêmica, mas são objeto de fé) exige uma leitura cuidadosa e crítica dos textos antigos que chegaram até nós.

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De um lado, as narrativas do Novo Testamento contêm muitas informações potencialmente valiosas para os historiadores, mesmo descontando os aspectos sobrenaturais, por definição não verificáveis. De outro, cada um dos Evangelhos, tanto os incluídos na Bíblia quanto os apócrifos (não oficiais), estão imbuídos das perspectivas teológicas e políticas de seus autores e frequentemente se contradizem entre si, tanto nos detalhes quanto em traços mais importantes.

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O historiador mineiro ajuda o leitor a navegar por essas dificuldades de interpretação e, ao mesmo tempo, incorpora ao debate as (poucas) evidências materiais dos princípios do cristianismo.


Em geral, as mais importantes são as obtidas pelos arqueólogos sobre o contexto mais geral da Judeia e da Galileia de 2.000 anos atrás, que iluminam o que seria o cotidiano de Jesus e dos apóstolos.

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Mas também merece especial atenção a maneira como o livro discute algumas relíquias cristãs famosas, como o Santo Sudário e o suposto letreiro com os dizeres "Jesus Nazareno, Rei dos Judeus", colocado em cima da cruz. (Spoiler: é quase impossível demonstrar que qualquer uma dessas relíquias realmente remonte aos personagens históricos.)


O trabalho de Bohrer não faz feio quando comparado às obras sobre o Jesus Histórico escritas por historiadores americanos e europeus para um público amplo. No entanto, é importante apontar alguns defeitos consideráveis no livro.

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Do ponto de vista estrutural, o que faz mais falta é uma discussão, mesmo que fosse resumida e simplificada, dos chamados critérios de historicidade. Tais critérios são usados pela grande maioria dos especialistas que tentam filtrar as fontes antigas em busca de dados relativamente confiáveis sobre a vida de Jesus e dos primeiros cristãos.


Entre eles, podemos citar o critério do constrangimento (grosso modo, ele postula que informações embaraçosas ou mesmo escandalosas sobre Cristo presentes nos textos da Antiguidade provavelmente não teriam sido inventadas como propaganda cristã) ou o critério da múltipla confirmação de fontes (dados reproduzidos por várias fontes diferentes têm maior probabilidade de serem verdadeiros do que aqueles que aparecem numa só fonte).

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Claro que aplicar tais critérios na prática é muito mais complicado do que parece à primeira vista. É preciso saber, por exemplo, o que exatamente seria constrangedor na cultura do século 1º d.C. ou, o que é mais complexo ainda, como determinar se um texto realmente é uma fonte independente (trechos do Evangelho de Lucas e do Evangelho de Mateus, por exemplo, quase certamente foram inspirados no de Marcos; portanto, tais trechos não são considerados independentes).


Abordar a lógica por trás da metodologia e das conclusões talvez não seja tão instigante para o leitor de cara, mas é um exercício-chave se a ideia é ajudá-lo a pensar criticamente sobre questões históricas.

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Além disso, o livro dá certa ênfase afoita à possibilidade de que Jesus estaria ligado à seita judaica dos essênios –uma comunidade ascética do deserto da Judeia que teria produzido os famosos Manuscritos do Mar Morto.


É uma ideia abraçada por poucos estudiosos do Jesus Histórico, em parte porque os essênios parecem ter tido um caráter fortemente sectário e fechado, bem diferente da pregação pública e da ênfase na evangelização que eram típicas do movimento fundado por Jesus.


Descontados esses deslizes, o leitor iniciante decerto terá, com o livro, boas ferramentas para compreender a diferença entre o Jesus da história e o Cristo da fé, sem se sentir forçado a renegar nenhum dos dois.

Jesus - Um Breve Roteiro Histórico Para Curiosos
Alex Fernandes Bohrer; editora Chiado Books; R$ 20 (ebook); 252 págs.


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