Entre as montanhas verdes da região amazônica, uma casa de cores vibrantes se ergue de forma fantasiosa. Um povoado humilde orbita aquela construção imponente, adornada ainda por flores e animais como tucanos, capivaras e onças. Do lado de dentro, uma grande família troca beijos e abraços de forma constante e apesar das brigas. Poderia ser o Brasil, mas "Encanto", na verdade, se passa na Colômbia.
Nem por isso a 60ª animação do Walt Disney Animation Studios deixa de ter um valor especial para os brasileiros –e, na verdade, para boa parte dos latino-americanos. Apesar da ambientação no país vizinho, a trama deve encontrar maneiras de se conectar com todo esse canto da América ao rejeitar o arquétipo da donzela europeia que já foi onipresente no estúdio.
Em "Encanto", os tons pastéis de vestidos como os de Cinderela e Aurora e os cavalos lustrosos dos príncipes encantados dão lugar a figurinos de cores que nem sempre combinam e a burros que são o meio de locomoção dos personagens. Já os casais têm vários filhos, que se reúnem numa longa mesa que faria inveja ao quarteto real de "Frozen".
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Estreando agora, "Encanto" precisa de uma longa canção de abertura para dar conta de apresentar todos os membros da família Madrigal. O musical animado mostra como Abuela Alma, após perder o marido, com três filhos pequenos para criar, recebe um milagre –em forma de uma vela mágica, que ergue uma bela casa do chão e concede poderes a seus descendentes.
Luisa tem superforça. Isabela faz flores nascerem. Camilo assume a aparência de qualquer pessoa. Antonio fala com os animais. Pena muda o clima conforme seu humor. Dolores ouve até um alfinete cair. Julieta pode curar machucados com arepas e outras receitas regionais. Mas Mirabel, a protagonista, não ganhou nenhum dom.
Por isso, ela é uma espécie de patinho feio da família –até que a mágica dos Madrigal começa a rarear e ela parte, então, numa jornada para tentar salvar os pais, irmãos, tios, primos e a avó, que tantas vezes olharam para ela com desdém.
"Eu via muitas telenovelas com a minha avó enquanto crescia, então eu tenho certeza que elas encontraram um caminho para aparecer no filme. Elas influenciaram a maneira como eu conto histórias, sempre dessa forma muito dramática", diz Charise Castro Smith, corroteirista e codiretora do filme, que tem ascendência cubana.
"'Encanto' é sobre família e, no centro do filme, há a pergunta sobre o quanto conhecemos nossa família e o quanto ela nos conhece. Nós queremos que as pessoas vejam esse filme com suas famílias e que percebam que, apesar de passarem pelas mesmas experiências, cada indivíduo as percebe de forma particular", completa a produtora Yvett Merino sobre o conflito principal.
Nessa trama de dezenas de personagens, picuinhas bobas e um amor pela família maior do que qualquer coisa, é fácil reconhecer um tipo de afeição muito característica dos latinos. Além de Castro Smith, vários funcionários com raízes na América Latina ajudaram a levar o filme às telas, como o chefe de animação Renato dos Anjos, que é brasileiro.
"Eu queria que o filme fosse bem específico culturalmente, que a gesticulação, a articulação dos personagens fosse bem parecida com a realidade, que houvesse proximidade nas interações", diz o animador. "E isso em computação gráfica é um tanto quanto difícil."
Outros temas comuns à realidade latino-americana estão muito presentes. A magia da família, por exemplo, é resultado de uma tragédia causada por uma versão do que conhecemos como coronelismo, e é explicada como sendo um "milagre", escancarando a religiosidade e o misticismo pulsantes deste lado do continente.
Isso tudo é entregue numa embalagem igualmente regional, por meio de músicas criadas por Lin-Manuel Miranda. Colaborador frequente da Disney –ele esteve envolvido em "Moana", "O Retorno de Mary Poppins" e no ainda inédito live-action de "A Pequena Sereia"–, o filho de porto-riquenhos buscou inspiração em ritmos como bambuco, mapalé, cúmbia, joropo e no "rock do início da carreira da Shakira" para a trilha sonora.
Mas como os filhos de cubanos, brasileiros e porto-riquenhos concordaram em situar "Encanto" na Colômbia, e não em outro país latino ou num reino imaginário? Jared Bush e Byron Howard, diretores da animação que também trabalharam juntos no oscarizado "Zootopia", contam que a rota até o país foi traçada aos poucos.
A ideia de fazer um filme com sangue latino-americano já existia, e vários elementos foram incorporados à trama conforme a Disney buscava uma coordenada geográfica exata para a história. Por sugestão de alguns amigos, a dupla fez uma visita à Colômbia e, lá, se apaixonou pela cultura e pelo visual do país.
"O fato é que a Colômbia é o país onde o realismo fantástico nasceu, com Gabriel García Márquez. A maneira como essa literatura conversa com a emoção, e como a mágica nela vem das coisas do dia a dia, fez todo o sentido para o filme que queríamos fazer", diz Howard.
Com suas músicas dançantes e visual alegre, a animação promete encantar de crianças a seus familiares crescidos, de noveleiros a fãs de teatro musical. Levando, consigo, um gostinho de América Latina para as telas ao redor do mundo.
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ENCANTO:
Quando Estreia nesta quinta (25), nos cinemas
Classificação Livre
Produção EUA, 2021
Direção Jared Bush, Byron Howard e Charise Castro Smith
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