A educação pública é uma das políticas mais eficazes no combate às desigualdades no Brasil, segundo levantamento exclusivo do Made/USP (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades). Os dados apontam que os gastos com educação reduzem em até 9,62% o índice que mede a diferença de renda.
O índice de Gini serve para indicar a desigualdade, em uma escala que varia de 0 (perfeita igualdade) a 1 (desigualdade máxima). Com os investimentos em ensino público, de acordo com o levantamento, esse índice cairia de 0,568 (com base em dados de 2017 e 2018) para até 0,513.
O levantamento do Made/USP tem por base os dados da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares), do IBGE. Também foram considerados os investimentos diretos por estudante divulgados pelo Inep, do Ministério da Educação.
Os pesquisadores concluíram que os investimentos em fases diferentes da formação também têm pesos distintos na redução da desigualdade. Os principais gastos responsáveis pela queda são os destinados ao ensino fundamental público, que reduz o índice de Gini de 3,08% a 6,27%.
No caso do ensino médio, a queda é de 1,20% a 2,05%. Já os gastos públicos com ensino superior podem ser considerados neutros para efeito de redução da desigualdade.
O pesquisador Gaiger lembra que a educação pública fundamental passou por um processo mais antigo de universalização. "A evasão escolar acaba sendo mais comum, no entanto, a partir do ensino médio, o que se reflete na baixa qualificação do trabalhador brasileiro, em geral."
Do ponto de vista racial, as famílias cujos responsáveis são pretos ou pardos, pela classificação do IBGE, são as que têm maior participação nos gastos públicos com educação, por estarem concentradas nas camadas de menor renda.
O estudo aponta o quanto as famílias mais pobres dependem do gasto com ensino público e elas são beneficiadas com mais de 55% dos investimentos em educação. Entre as mais ricas, esse percentual cai para 12%.
"Os mais pobres só podem contar com a educação pública, enquanto a classe média acaba pagando por escolas particulares, muitas vezes de qualidade baixa, e os filhos das famílias de maior renda só entram no sistema público no nível superior", afirma o pesquisador.
Quando se olha para os extremos, os dados do Made apontam que 93,3% dos gastos totais em educação dos 10% mais pobres são públicos, enquanto no caso do décimo mais rico, esses gastos correspondem apenas a 13,3% do total.
Com as perdas impostas pela pandemia, a situação dos jovens brasileiros se tornou ainda mais preocupante. Uma estimativa recente do FMI (Fundo Monetário Internacional) também aponta que as aulas perdidas, caso não sejam compensadas, podem levar a uma redução de cerca de 8% da renda ao longo da vida para estudantes brasileiros que têm de 10 a 19 anos.
Reportagem recente do jornal Folha de S.Paulo também mostrou como as chances de um filho repetir a baixa escolaridade dos pais no Brasil é o dobro da probabilidade disso ocorrer nos Estados Unidos, segundo dados do Imds (Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social).
"O Brasil tem aumentado o gasto com educação desde a década de 1990. Quando se comparam os resultados com outros países, que estão no Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), no entanto, gastamos muito, mas os resultados são piores. Investir em educação é fundamental, mas é preciso gestão", lembra o diretor-presidente do Insper, Marcos Lisboa.
Um outro levantamento recente, publicado pela FGV (Fundação Getulio Vargas), aponta que, se o Brasil investir apenas 1% a mais do seu PIB (Produto Interno Bruto) por ano em educação básica, o padrão de vida médio da população poderá aumentar em mais de um quarto nos próximos 50 anos.
"Há quase cem anos, o Brasil estava sob um governo altamente centralizado que ampliou e implementou uma forte visão de desenvolvimento baseada na rápida industrialização, só que o investimento em formação não fazia parte da estratégia de desenvolvimento", afirma Edmilson Varejão, diretor da startup Al Consult e um dos autores da pesquisa. "O descaso com a educação básica, de certa forma, persistiu nos anos seguintes", avalia.