A menos de dois meses do fim do ano, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) deve devolver para o orçamento do MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações) menos da metade dos R$ 600 milhões cortados pela Economia em outubro.
A tesourada foi aprovada pelo Congresso, a pedido de Paulo Guedes, com a ciência do Planalto, e gerou uma crise no governo com críticas abertas do ministro-astronauta, Marcos Pontes. A comunidade científica se queixa de que o corte pode inviabilizar a pesquisa no país.
O governo trabalha no texto de um PLN (projeto) para fazer um novo remanejamento de recursos para este ano, que deve ser encaminhado ainda para o Congresso. Há dois valores em circulação no Palácio do Planalto: R$ 278 milhões e R$ 150 milhões.
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Já o deputado Aliel Machado (PSB-BR), presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, disse que o Ministério da Economia trabalhava, na semana passada, com a previsão de devolver R$ 273 milhões para Ciência e Tecnologia.
"O corte está prejudicando todo o orçamento da pasta, inclusive editais já publicados", ressaltou Machado. "Esperamos votar ainda nesta semana. Isso é fruto das reunião que fizemos com o Ministério da Economia e é uma conquista, vamos recuperar parte significativa."
De acordo com o deputado, parte do montante seria destinado aos testes da fase 3 da vacina contra Covid-19 desenvolvida pelo ministério, por isso ainda não havia sido empenhado totalmente.
Segundo interlocutores do governo que trabalham nessa proposta, a ideia é criar um dispositivo obrigando o ministro a gastar parte do dinheiro apenas com o pagamento de bolsas.
Ainda que Bolsonaro devolva recursos para o MCTI, o montante ainda ficará muito aquém do valor retirado. Se prevalecer a intenção de restituir menos de R$ 200 milhões, o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) poderá ficar sem recursos para financiar pesquisadores.
O órgão vinculado ao MCTI já lançou o Edital Universal, principal chamada de bolsas de pesquisa do país, que envolve 30 mil pesquisadores, ao custo de R$ 250 milhões. Hoje só há R$ 50 milhões em caixa.
Em 15 de outubro, o presidente do CNPq, Edvaldo Vilela, falou da importância da restituição desses recursos e chamou o corte de "rasteira".
"Precisamos nos reunir e fazer uma ação conjunta e mais forte, porque as adversidades são muito grandes. E nós estamos avançando muito pouco, e de repente a gente leva uma rasteira dessa que aconteceu aí, muito de improviso", disse em evento da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência).
Como pano de fundo do corte no ministério, está a disputa acirrada nos bastidores do governo por recursos a um ano da eleição. Os R$ 600 milhões foram repassados para os ministérios da Educação, das Comunicações, da Saúde, da Cidadania, da Agricultura e do Desenvolvimento Regional.
Este último, sob o comando de Rogério Marinho, levou a maior fatia: R$ 150 milhões. A pasta é uma das principais apostas do governo para a eleição.
O corte deflagrou uma crise no primeiro escalão do governo. Marcos Pontes foi cobrado pelos colegas da Esplanada e pelo próprio presidente a "jogar junto".
Ele chamou os cortes de equivocados e ilógicos,e disse que pensou em deixar o governo por causa da medida. Depois da pressão, evitou se manifestar em público.
Enquanto os recursos deste ano ainda estão em suspenso, a comunidade científica também busca se mobilizar para garantir orçamento no próximo ano.
A SBPC e mais sete entidades que compõem o Comitê Executivo da Iniciativa de Ciência e Tecnologia no Parlamento enviaram uma carta à Comissão Mista de Orçamento pedindo já restituição e correção da fatia destinada à pesquisa no país.
"Esperamos que a Comissão Mista do Orçamento ajude a recuperar o Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia, prejudicado por sucessivos cortes orçamentários. Ciência, Tecnologia e Inovação são elementos essenciais para que o país encontre uma saída sustentável da crise em que se encontra", diz o texto.