O governo Jair Bolsonaro ainda não garante se vai aplicar provas do Enem em 2021. Responsável pelo exame, o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) afirma não ter definição do cronograma da prova por questões orçamentárias e também logísticas, devido à pandemia de coronavírus.
Entretanto, documentos obtidos pela reportagem mostram que o Inep havia definido desde o dia 3 de maio, em reunião às 9h, que as provas seriam adiadas para 16 e 23 de janeiro de 2022.
Um ofício assinado pelo diretor de Avaliação da Educação Básica do Inep, Alexandre Gomes da Silva, afirma que a decisão foi debatida com o presidente do Inep, Alexandre Lopes.
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O instituto é ligado ao MEC (Ministério da Educação). A última prova, do Enem 2020, que seria originalmente aplicada no final de 2020, também aconteceu somente no início de 2021 por causa da pandemia de Covid-19.
"Em consonância com as informações do Senhor Presidente do Inep apresentadas na Reunião de Diretorias ocorrida em 03 de maio às 09 h, encaminho para ações decorrentes deste Gabinete e das respectivas Diretorias, ratificando que os dias 16/01/2022 (domingo) e 23/01/2022 (domingo) são as datas definidas para as aplicações das provas do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) regular em sua edição 2021", diz o ofício circular obtido pela reportagem.
O documento afirma que o Enem digital será aplicado nas mesmas datas. O ofício foi endereçado às diretorias de Gestão e Planejamento, de Tecnologia e Disseminação de Informações Educacionais e à chefia de gabinete do Inep.
Em contatos com a reportagem desde quarta-feira (12), o Inep garantiu que não havia definição sobre adiamento. A assessoria de imprensa do instituto afirmou na quinta (13) que o presidente do órgão ainda não bateu o martelo sobre o adiamento.
Segundo o órgão, as datas oficiais só serão definidas em portaria do presidente do Inep.
Mas no mesmo dia 3 de maio, os diretores de Gestão e Planejamento do Inep e o de Tecnologia encaminharam despachos avisando sobre as datas às suas respectivas coordenadorias envolvidas na elaboração do Enem, segundo documentos também obtidos pela reportagem. Dessa forma, as áreas técnicas do Inep trabalham desde o início de maio com a aplicação somente em 2022.
Uma portaria com as metas do Inep para o ano, publicada no Diário Oficial da União de terça-feira (11), não incluiu a aplicação da prova. Isso levantou dúvidas sobre a realização do exame.
A reportagem questionou o órgão na ocasião. O instituto havia respondido que MEC e Inep "trabalham para realizar o Enem em 2021".
Na quinta-feira (13), após ser questionado, o presidente do Inep, Danilo Dupas Ribeiro, falou a membros do CNE (Conselho Nacional de Educação) sobre o exame. Relatos de integrantes do conselho indicaram à reportagem que Dupas Ribeiro havia confirmado o adiamento.
A assessoria de imprensa do Inep negou que o adiamento esteja definido e encaminhou um áudio com a fala do presidente do instituto.
"O Enem está nesse processo de planejamento [que envolve questões de orçamento]. Não tinha como eu assinar algo sem ter esses alinhamentos prévios e neste mês vamos definir a data do Enem. Como sabemos, isso impacta na logística", diz ele na gravação. "Estamos engajados para que o Enem ocorra neste ano, mas temos essas variáveis sensíveis que estamos alinhados junto ao MEC. E em breve vamos alinhar com vocês [do CNE]."
A reportagem consultou integrantes do MEC, que confirmaram que o status do processo era de indefinição. Na última edição, realizada na pandemia, o exame teve abstenção recorde.
O Inep afirma ter orçamento garantido para a realização do exame em 2021. Mas, segundo interlocutores, ainda há indefinições sobre custos caso a aplicação seja em meio à pandemia –na última edição, vários participantes foram barrados na prova porque alguns locais de prova não comportavam todos os candidatos no esquema montado para garantir o distanciamento social.
As provas costumam acontecer em novembro, mas ainda não havia datas para a realização do exame em 2021. O Inep mantém, no entanto, planejamento para abrir no próximo dia 17 solicitações de isenção de taxa de inscrição.
O Enem é a principal porta de entrada para o ensino superior. A nota é usada por praticamente todas as instituições públicas federais e serve de critério para acesso a programas de inclusão em faculdades privadas, como o ProUni (Programa Universidade para Todos) e Fies (Financiamento Estudantil).
A equipe do ministro Milton Ribeiro não queria aplicar em 2021 o Saeb, avaliação da educação básica. Pressionado, o MEC voltou atrás e garantiu a prova de forma censitária.
Na fala de Dupas Ribeiro feita ao CNE, ele relacionou as dúvidas sobre o orçamento para aplicação do Saeb ao planejamento envolvendo o Enem.
O governo Bolsonaro havia planejado iniciar em 2021 o chamado Enem seriado. Os alunos do ensino médio poderiam fazer provas nos três anos da etapa para servir como forma de acesso às universidades.
Esse processo começaria em 2021, com a aplicação do Saeb no 1º ano do ensino médio. No entanto, a equipe de Milton Ribeiro cancelou a expansão do Saeb no formato planejado durante a gestão do ex-ministro Abraham Weintraub.
Servidores do Inep tem acusado a atual gestão de Milton Ribeiro de esvaziamento do órgão. Em carta, servidores alertaram sobre riscos de nomeações ideológicas no órgão.
A Frente Parlamentar Mista da Educação divulgou nota em que expõe preocupação com a indefinição. "Ao não ser incluído nas metas globais do corrente ano do Inep, publicadas no Diário Oficial da União, a avaliação tem o risco de ficar de fora do planejamento orçamentário", diz a nota.
"Os alunos não podem conviver o tempo inteiro com dúvida se farão ou não um exame tão importante. Essa insegurança causa graves prejuízos, como a evasão escolar, que custa milhões aos cofres públicos todos os anos", avalia o presidente da frente, deputado Israel Batista (PV-DF).
Entenda o caso
O que é o Enem - Avaliação usada como vestibular pela maioria das instituições federais de ensino superior. Universidades estaduais, como a USP, também adotam a prova para selecionar parte dos aluno. Exame é critério para ProUni e Fies.
Enem sob Bolsonaro - Na primeira edição do exame no atual governo, em 2019, milhares de candidatos receberam notas erradas. Inep, que organiza o exame, atribuiu problema a uma falha na gráfica.
Na pandemia - Após pressão de secretários de Educação, MEC adiou Enem de 2020 por causa da pandemia e o fechamento de escolas. Prova que ocorreria em novembro de 2020 só aconteceu em janeiro de 2021.
Alunos de fora e abstenção - Edição ficou marcada por candidatos impedidos de fazer a prova por falta de espaço. Em vários locais de prova, regras de distanciamento não previram espaço para todos os inscritos. Abstenção na prova foi a maior da história
Novo adiamento - Inep definiu, segundo ofício distribuído internamente, que Enem 2021 só será aplicado nos dias 16 e 23 de janeiro de 2022. Áreas técnicas trabalham com essa informação desde 3 de maio. Oficialmente, Inep nega que haja definição de adiamento e que isso só ocorrerá com a publicação do edital do exame.