A expectativa é que esse conhecimento abra uma avenida rumo a novas terapias e tratamentos, relatam pesquisadores da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign e da Clínica Mayo, ambas nos EUA.
Ao longo dos últimos anos, os cientistas analisaram mais de 90 mil amostras de cálculos renais para entender os mecanismos por trás da formação deles, e conseguiram mostrar que a ideia de um crescimento camada a camada, formando uma entidade compacta e resistente, não fazia muito sentido.
Até então se supunha que os cálculos não conseguiam ser desfeitos naturalmente dentro do rim, mas a investigação mostrou que, assim como certas rochas sedimentares, os cálculos passam por repetidos ciclos de cristalização, dissolução, fratura e falhas, num processo conhecido como diagênese.
"Quando um cálculo passa pela etapa de dissolução, ele não se desmancha completamente. Um cálculo cresce e então se dissolve apenas parcialmente durante um desses ciclos. Ele parece um pequeno queijo suíço, e deixa para trás um pouco de massa mineral, que contém cristais, orifícios, fraturas e falhas anteriores. Na próxima sequência, ocorre mais crescimento mineral, dissolução, fraturamento e falhas, e assim por diante", explica Bruce Fouke, professor da Universidade de Illinois e um dos responsáveis pela pesquisa.
Esse conhecimento biogeológico, ou biogeomédico, ganhou sustentação com a descrição detalhada dessa série de etapas de formação rochosa, o que os especialistas chamam de sequência paragenética. Os achados mais recentes do grupo foram publicados na revista científica Nature Reviews Urology.
Não é de hoje que a humanidade sofre com pedras nos rins. O caso mais antigo de que se tem nota é de 4.400 a.C, descoberto graças às investigações de uma múmia egípcia -o cálculo ainda estava lá. Infelizmente, mesmo hoje, ainda não há um tratamento definitivo para essa condição.
Os cálculos estudados pelo grupo eram fatiados, e os cortes ultrafinos, de até um bilionésimo de metro, eram avaliados por meio do microscópio. Nessa situação, as fatias são tão finas que a luz é capaz de atravessá-las, formando as imagens que são analisadas pelos cientistas.
A composição diversa observada, com deposição de camadas sobre camadas, e ainda a presença de cristais individuais, cortados transversalmente por outros, além da presença de fraturas, orifícios e falhas deu as pistas necessárias para as mudanças no entendimento de como surgem e para onde vão os cálculos.
Felizmente a natureza pode servir de fonte de inspiração para ajudar nessas descobertas.
E uma das razões desse depósito acelerado é a presença de certas proteínas produzidas por bactérias. Os cientistas então se perguntaram se micróbios e seus componentes poderiam também explicar a formação de pedras no rim humano.
A resposta curta é que sim, mas a história é mais complexa, já que há várias bactérias diferentes em um ser humano. Além disso, existem outros mecanismos que também podem promover ou inibir o crescimento de cálculos, como a quantidade de determinados sais no organismo e até mesmo alguns medicamentos.
De toda forma, saber do potencial papel dos micróbios na história já permite que cientistas especulem caminhos de tratamento com probióticos (microrganismos benéficos à saúde humana) ou prebióticos, substâncias que buscam fomentar o crescimento dos micróbios adequados para o efeito desejado.
Essas observações dos cientistas valem especialmente para os cálculos compostos de oxalato de cálcio, um dos mais principais comuns. Ele é mais frequente quando há baixa ingestão de água e consumo inadequado e excessivo de cálcio.
Há ainda outros três tipos importantes: cálculos de ácido úrico (muito ligado à dieta); de estruvita (associado a infecções); e de cistina (condição hereditária).
Além do rim, outros órgãos também podem sofrer com a formação de cálculos -um exemplo é o da vesícula biliar, que tem outra composição. A biomineralização também pode ter outros efeitos no corpo: placa nas artérias, placa dentária, aterosclerose, calcificação da valva aórtica, entre outros.
No entanto, existem dificuldades a serem superadas, afirma John Lieske, da Mayo Clinic, o outro líder do grupo. "Um problema nos estudos é que os cálculos renais crescem relativamente devagar e numa forma errática em humanos, de forma que os estudos são demasiadamente longos e com um grande número de pacientes. Infelizmente, não há bons modelos animais de formação de cálculo renal. Por fim, é difícil conseguir tecido renal humano para estudar os cálculos enquanto eles estão surgindo."