Um novo projeto gestado por dois grupos de estudantes da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP pretende pegar um atalho até o espaço, lançando um foguete a partir de um balão. O primeiro voo deve ocorrer neste ano -a primeira operação do tipo realizada na América Latina.
Ambos os grupos, cerca de 30 estudantes ao todo, fazem parte de programas extracurriculares com alguma tradição. A equipe Zenith Aerospace vem desde 2014 desenvolvendo sondas para experimentos na estratosfera levados por balões de alta altitude (o primeiro voou em 2016).
Fomentada inicialmente pelo engenheiro espacial Lucas Fonseca, brasileiro que participou da missão europeia Rosetta ao cometa Churyumov-Gerasimenko, a iniciativa também focou o desenvolvimento de cubesats, minissatélites.
Já a Topus Projetos Aeroespaciais, fundada em 2005, sempre se concentrou no desenvolvimento de foguetes de pequeno porte, destinados a competições universitárias. Para este ano, as duas decidiram se unir no projeto Zeus-22, que pretende lançar um foguete a partir de um balão estratosférico.
"Até abril devemos ter a entrega do projeto estrutural, um modelo de CAD [desenho em computador] das estruturas, juntamente com todos os testes de hardware, simulação e design", explica Luísa Machado Saldanha, estudante da EESC que faz parte dos dois grupos. "Logo depois iniciaremos a manufatura das estruturas e alguns testes do foguete. E, finalmente, seria feita a integração da sonda para que haja o lançamento em julho de 2022."
Além do apoio da própria USP, que incuba as iniciativas Zenith e Topus, o projeto conta com o patrocínio da companhia WallJobs, que atua para fazer a ponte entre estudantes universitários e empresas para colocação profissional.
"Além de nos prover recursos financeiros, eles nos auxiliam na divulgação do projeto e na procura por eventuais companhias que possam contribuir em sua consolidação, fornecendo materiais como componentes para a construção do foguete e/ou da sonda, softwares para simulações, acesso à infraestrutura, ou mesmo recursos imateriais, como aconselhamento técnico", diz Davi Gonçalves Sellin, um dos diretores do Zeus-22, ao lado de Kael Bastos e Pedro Pignanelli.
PROVAS DE PRINCÍPIO
Como ideia, os "rockoons" (como são chamados os conjuntos foguete+balão, ou rocket+balloon) não são uma novidade. Os primeiros experimentos do tipo nos EUA remontam ao grupo de James Van Allen, na Universidade de Iowa, em 1952. Mais tarde, Van Allen seria o responsável pela carga útil do primeiro satélite americano, o Explorer-1, lançado em 1958.
Realizar um experimento do tipo, contudo, parece mais simples do que é de fato. "É bem complexo lançar um foguete de uma sonda [num balão] sem desestabilizá-la ou danificar o foguete, por conta da dinâmica do conjunto, que não é rígida e sofre grande interferência do vento", explica Sellin. "No mais, uma grande área que vamos precisar gerar muito conhecimento é na ignição do foguete numa altitude que não é muito usual de se trabalhar."
Para o voo do Zeus-22, a equipe está pensando em um foguete com massa inferior a 6 kg, capaz de subir mais 1 km a partir de seu ponto de lançamento, a uma altitude entre 23 e 30 km (o plano é estabilizar a altitude para a ignição em 25 km).
O próprio foguete não carrega experimentos adicionais, além da eletrônica responsável pela telemetria do voo e sua transmissão para a base no solo. Mas esse é só o começo. A ambição do grupo para médio e longo prazo é desenvolver veículos capazes de voos realmente espaciais, cruzando a chamada linha de Kármán (a divisão entre a atmosfera e o espaço, arbitrariamente fixada 100 km acima do nível do mar).
"Atualmente não pretendemos utilizá-lo para levar experimentos e/ou cargas pagas como cubesats ou cansats, mas nada impede de revisarmos o escopo do projeto futuramente e alterarmos seu design com esta finalidade", conclui Sellin.
Vale lembrar que uma iniciativa como essa pode ser muito útil para voos e experimentos suborbitais, mas
muito mais complicada para missões orbitais. É verdade que partir de um balão a 25 km de altitude coloca um foguete mais perto do espaço, o que exige menos propelente para cobrir o resto do caminho. Mas o que garante uma inserção orbital não é a altitude, e sim a velocidade (que precisa chegar a cerca de 27 mil km/h). Um balão oferece bem pouco nesse sentido.