A bebida e as drogas desestruturaram a vida de João, 47. Em um município do Norte Pioneiro, onde nasceu e morou boa parte da vida, trabalhava com carteira assinada, mas o consumo de álcool em quantidades cada vez maiores fez com que ele perdesse o emprego. Foi então que decidiu se mudar para Londrina. Juntou o pouco dinheiro que tinha e alugou uma pequena casa na periferia. Mas sem conseguir arranjar uma nova ocupação, não pôde manter o pagamento do aluguel. Saiu da casa para morar com um colega em um barraco em uma favela na zona norte e foi nessa época que, além da bebida, o uso de crack passou a ser frequente na sua rotina.
O colega com quem morava também era usuário de drogas e a convivência ficou insustentável. “O crack acaba com a vida de todo mundo. Mas é muito difícil conseguir sair depois que entrou. Só se tiver muita força”, disse. Sem ter para onde ir, João passou a morar nas ruas do centro da cidade. Procurou acolhimento em um abrigo uma única vez, mas desistiu porque nesses locais, se queixa, “tem muitas regras, parece até convento”. “Na rua tem muito perrengue, não vou falar que não tem. Mas pelo menos tenho liberdade para fazer o que eu quiser.”
O morador de rua se envergonha de sua situação. Desde que passou a viver na favela não procurou mais familiares e amigos. Concordou em dar entrevista, desde que pudesse omitir detalhes de sua história que possibilitassem sua identificação. “Quem gosta de viver na rua? Ninguém gosta. Assim como ninguém gosta de ter um parente nessa situação em que eu estou. É vergonhoso. Já pensou, eu chegar na festa de Natal da família desse jeito aqui? As crianças esperando o Papai Noel e chego eu?”
João sobrevive de doações. De atos de caridade vêm as roupas, calçados, alimentos e cobertores. Mas o pouco dinheiro que recebe das esmolas dadas por quem se compadece de sua situação “vai todo para a cachaça e as pedras”. A reportagem pergunta se ele já tentou se cadastrar no CadÚnico, o Cadastro Único que dá acesso aos programas sociais do governo federal, e a resposta vem na forma de outra pergunta: “O que é isso?”
Dados oficiais apontam que entre abril e julho deste ano, o número de pessoas em situação de rua inscritas no CadÚnico subiu 24% no Paraná. Em abril, eram 9.025 e em quatro meses, outras 2.219 pessoas foram incluídas na base de dados, chegando a 11.244 em 31 de julho. Desse total, 3.087 paranaenses que não têm onde morar estão nas ruas da capital. Entre os três estados da Região Sul, Curitiba é a capital com a maior população nessa condição. Em julho, Florianópolis (SC) tinha 1.374 moradores de rua e Porto Alegre (RS), 2.489.
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