O consumo de tabaco e bebidas alcoólicas, obesidade, maus hábitos alimentares e inatividade física explicam mais de um quarto dos casos de câncer no Brasil. Em 2020, 114 mil pessoas desenvolveram um dos 20 tipos de câncer associados a algum desses fatores de risco.
Mesmo com os últimos avanços na redução do tabagismo, somente o cigarro teria provocado 15,5% dos casos totais de câncer. O excesso de peso e a alimentação não saudável –medida pelo alto consumo de carne vermelha e processada e pela baixa ingestão de frutas, verduras e hortaliças– seriam responsáveis, cada um, por 5% dos casos oncológicos. O consumo de álcool responderia por 4% e a inatividade física por 2,5% dos diagnósticos anuais da doença.
Esses dados foram encontrados pelo professor do departamento de medicina preventiva da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) Leandro Rezende em sua pesquisa de doutorado, em que estimou o número de casos de câncer e de mortes provocadas pela doença que poderiam ser evitados por modos de vida mais saudáveis.
Ele participou do painel Agentes da Mudança: Como Acelerar o Progresso em Saúde e Controle do Câncer e demais DCNTs (doenças crônicas não transmissíveis), do 8º Congresso Todos Juntos Contra o Câncer, que ocorreu entre os dias 20 e 24 de setembro.
A pesquisa de Rezende mostrou ainda que a incidência de ao menos cinco tipos de câncer –da laringe, do pulmão, da boca, do esôfago e do colorretal– poderia ser reduzida pela metade por meio de estratégias de prevenção ligadas à promoção de estilos de vida saudáveis.
No que diz respeito às mortes, mais de um terço daquelas causadas por câncer são atribuíveis à exposição a um desses fatores de risco apontados no estudo. E aqui o principal vilão também é o cigarro, cujo consumo é responsável por 21% dos óbitos por câncer a cada ano. Todos os outros fatores de risco combinados respondem, por sua vez, por 18% das mortes.
Segundo Rezende, "podemos reduzir os casos e as mortes por câncer pela metade no Brasil. Para isso, estratégias de prevenção deveriam se tornar uma prioridade para o Estado e para a sociedade em geral".
Pedro de Paula, diretor da Vital Strategies, uma organização internacional em saúde pública, chamou a atenção para a necessidade de inciativas intersetoriais para lidar com problemas complexos como o atendimento às doenças crônicas não transmissíveis. Para ele, é apenas por meio da articulação de diversas áreas do Estado, de atores da sociedade civil e de setores privados que poderemos alcançar melhores práticas e políticas públicas ligadas à prevenção e ao cuidado dessas patologias.
O outro convidado do debate foi Bruno Helman, presidente e fundador do Instituto Correndo pelo Diabetes. Em sua apresentação, ele defendeu o "engajamento ativo de pessoas com doenças crônicas não transmissíveis na formulação, no planejamento, na execução e na avaliação de políticas públicas que lhes dizem respeito".
Helman, que foi diagnosticado com diabetes ao fim do ensino médio e três anos mais tarde desenvolveu depressão e ansiedade, disse que encontrou um propósito na luta em prol das pessoas que têm doenças crônicas, especialmente diabetes e transtornos mentais, e que não tiveram, como ele, pronto acesso a informações, insumos e tratamentos adequados.
De acordo com o especialista, é fundamental, de um lado, que os pacientes se apropriem das suas condições e se tornem protagonistas da luta por seus direitos. De outro, que o Estado entenda que é oneroso tratar pessoas com doenças crônicas, mas que "é mais oneroso ainda gastar com a reabilitação e a aposentadoria precoce dessas pessoas e outros custos decorrentes de potenciais complicações de um tratamento tardio e precário."