Durante o inverno, quando as temperaturas médias ficam abaixo de 14°C, uma série de doenças cardiovasculares tem incidências maiores. A cada diminuição de 10°C, o perigo de infarto agudo do miocárdio aumenta em 7% e, como consequência, as mortes por esta causa sobem em até 30%. Da mesma forma, o acidente vascular cerebral, ou derrame cerebral, tem um crescimento em sua ocorrência. Pacientes com doenças crônicas, com predisposição a problemas cardíacos, e pessoas com mais de 65 anos formam o grupo de maior risco.
Nos idosos em especial, que apresentam doença obstrutiva crônica nas artérias dos membros inferiores, a vasoconstrição periférica estimulada pelo frio diminui o fluxo arterial, o que leva à baixa da irrigação das extremidades (isquemia), que pode até levar ao aparecimento de necrose e gangrena nos casos mais graves.
O cirurgião vascular e membro do Conselho Superior da Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular – Regional São Paulo (SBACV-SP), Calogero Presti, explica que a doença arterial obstrutiva periférica pode se agravar com as baixas temperaturas. Além disso, pacientes portadores de microangiopatia diabética, oclusão de artérias de pequeno calibre (arteríolas e capilares) e indivíduos portadores de doença arterial inflamatória (arterites) precisam se proteger rigorosamente do contato com o frio.
Ainda de acordo com o especialista, as pessoas que possuem diabetes de evolução mais longa têm uma menor perfusão das extremidades e, quando submetidas ao frio intenso, a isquemia piora e há um limiar para o desencadeamento de tromboses arteriais e necrose das extremidades.
Outra causa de mecanismo não bem conhecida é a perniose. “Existem pessoas que apresentam extrema sensibilidade ao frio e desenvolvem quadros denominados de eritema pérnio (ou perniose). Caracteriza-se pelo aparecimento de alterações cutâneas, com manchas ou nódulos na pele de coloração vermelha (eritema) e, nos casos mais severos, surgem vesículas, bolhas e ulcerações. Os dedos das mãos e pés são as áreas mais afetadas em geral, de maneira simétrica e com menos frequência esse fenômeno acomete a ponta do nariz e das orelhas. O eritema pérnio pode ser secundário à presença de doenças sistêmicas, como distúrbios hematológicos (do sangue), hepatites virais, doenças autoimunes e malignas”, esclarece o médico.
Fenômeno de Raynaud
O fenômeno de Raynaud é outro exemplo de manifestação funcional da microcirculação desencadeada pelo estresse e pelo frio. As extremidades, mãos e pés em contato com o frio desencadeiam um fenômeno trifásico inicialmente com intensa vasoconstrição e palidez dos dedos e, após algum tempo (segundos ou minutos), os dedos tornam-se azulados (cianóticos) devido à falta de oxigênio e acúmulo de gás carbônico no sangue da extremidade.
Numa terceira fase, as arteríolas e capilares voltam a se abrir devido a uma vasodilatação compensatória (hiperemia reativa) e as extremidades (mãos e pés) apresentam intenso rubor (coloração vermelha). Esse fenômeno em geral é benigno. “O paciente que tem fenômeno de Raynaud deve procurar o médico para investigar a presença de possível doença autoimune ou reumatológica em curso, ou de uma provável manifestação futura”, esclarece Calogero.
Outra alteração microcirculatória funcional que ocorre em jovens é a acrocianose. Caracteriza-se pelo arroxeamento das extremidades, dedos das mãos e pés, e também é agravada pelo frio ou pelo estresse. Em casos raros e de extrema intensidade podem ocorrer pequenas necroses das polpas digitais.
Cuidados com a saúde no inverno
Para se proteger do frio, Calogero dá algumas dicas, como manter-se bem agasalhado (usar luvas, cachecol, tocas, meias de lã) e realizar atividade física habitual. É aconselhável fazer exames de rotina para acompanhar níveis de colesterol no sangue e controle da pressão sanguínea, ter uma dieta saudável, beber bastante água, evitar fumar e não ingerir quantidades excessivas de álcool (pois isso também eleva o risco de hipertensão arterial, infarto do miocárdio e derrame cerebral). Vacinar-se contra a gripe no outono, em especial os idosos, reduz o risco de infarto no inverno.
“As infecções respiratórias (gripe) produzem um estado inflamatório no organismo que interfere nas placas de ateroma (colesterol na parede arterial) e, com isso, aumenta a chance de desestabilização e ruptura dessas placas de gordura podendo levar à obstrução das artérias coronárias e, como consequência, ao infarto do miocárdio. Nas artérias cerebrais, mesmo fenômeno de oclusão, conduz ao derrame cerebral e nas artérias periféricas à trombose arterial aguda dos membros inferiores, com risco de gangrena”, pontua o cirurgião vascular.
O presidente da Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular – Regional São Paulo, Fabio Rossi, observa: “A maioria dos portadores de doenças vasculares é inicialmente assintomática, ou apresenta sintomas leves que podem passar despercebidos, até mesmo por médicos de outras especialidades. O infarto agudo do miocárdio, o acidente vascular cerebral, a trombose venosa profunda e a embolia pulmonar são as principais causas de morte nos países ocidentais. Outras emergências vasculares, como a ruptura e dissecção de aneurismas, vasculites e as síndromes vasoespáticas, também apresentam incidência aumentada no inverno. Na ocorrência de sinais e sintomas sugestivos, a procura imediata por um serviço de saúde e a consulta com um especialista vascular são muito importantes para evitar sequelas graves”.
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