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O Comedor do Futuro

10 ago 2005 às 11:00

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snuppy, cachorro clonado por cientistas sul-coreanos - divulgação
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Recentemente a clonagem voltou à mídia como se fosse a ultima bolachinha do pacote, tudo por causa de um simples bichinho de estimação, um cachorrinho da raça Afghan, chamado snuppy. Bem, na verdade o bichinho não é tão simples assim, já que ele foi concebido graças a esse complexo e controvertido método científico.
Os autores da façanha da vez foram os sul-coreanos, e enquanto todos ficam por aí discutindo as questões éticas envolvidas na clonagem, eu, pra variar, estou mais preocupado com as questões culinárias.
Estranho? Não para os coreanos, uma vez que carne de cachorro é prato típico da Coréia, e embora eu não acredite que o simpático snuppy vá parar na panela, sua aparição é um bom pretexto pra trazer à tona um outro tema polêmico: os alimentos geneticamente modificados, vulgo transgênicos.
A clonagem, em sua forma mais famosa, ainda está longe de ter uma aplicação comercial, verdadeiramente viável, para nos preocuparmos com ela. Mas outras técnicas dessa mesma laia estão mais presentes entre o céu da nossa boca e a terra, do que sonha a nossa vã gastronomia.
São sementes modificadas para resistir a pragas e pesticidas, fertilização de embriões in vitro que garantem rebanhos maiores e melhores, hormônios e mais hormônios desenvolvidos e utilizados para aumentar a produtividade.
Tá, e o que tudo isso tem a ver com o pãozinho francês nosso de cada dia? Se você viver numa comunidade hippie que cultiva seu próprio trigo, talvez não muito, mas se como a maioria das pessoas você costuma consumir alimentos industrializados, saiba que não só o pão como todo o resto da sua dieta é o objetivo final dessa espécie de corrida "tecno-alimentar".
É a velha e "boa" lógica capitalista, sentando, sem ter sido convidada, à nossa mesa. Como a indústria alimentícia é dominada por mega-corporações, invariavelmente, mais preocupadas com números do que com pessoas, vale aquela velha máxima "os fins justificam os meios", ainda que isso seja o nosso fim.
Agora, deixando a teoria da conspiração maquiavélica um pouco de lado, o fato é que o consumidor se encontra numa situação realmente complicada nessa questão. Diante da inegável eficiência da biotecnologia, fica difícil para qualquer governo, simplesmente, proibir o uso dessas técnicas, pois numa economia regida pelas leis de mercado, isso representaria um verdadeiro genocídio da produção local, acabando com a sua competitividade.
Por outro lado, grande parte dos produtos provenientes da biotecnologia ainda não foi suficientemente testada, por isso, não se pode garantir que seu consumo seja seguro. E, enquanto se desenrola toda essa questão, os transgênicos continuam na boca do povo, ainda que ele não tenha digerido muito bem essa história.
Aliás, esse é outro problema. Pouca gente sabe quando está ingerindo produtos geneticamente modificados, já que nem todos os países obrigam as empresas a identificar tais produtos. Existem ainda pessoas que nem sabem o que são transgênicos, e mesmo aqueles que sabem e se importam, pouco podem fazer a respeito.
Alguns até tentam, como é o caso do ativista francês José Bové, que já incendiou, entre outras coisas, sementes transgênicas, plantações e até uma loja do Mc Donald’s ou Mc Do, como eles chamam na França. Mas embora Bové faça, às vezes, bastante barulho, conseguindo chamar atenção para questão da biotecnologia, atitudes isoladas como a dele não geram resultados efetivos no combate aos transgênicos.
Na verdade, até para declarar guerra aos transgênicos, ainda é um pouco cedo demais. Pois, da mesma forma que sobram razões para desconfiar da qualidade dos produtos biotecnológicos, falta qualquer comprovação científica de que eles sejam, realmente, nocivos à saúde. Mas como canja de galinha e precaução nunca fizeram mal a ninguém, procure saber a origem dos produtos que você consome, dando preferência para aqueles que informam como foram produzidos.
Duvido que Gregor Mendel, quando fez suas primeiras experiências com ervilhas, lá no século 19, imaginava que um dia comida e genética voltariam a se encontrar. Mas, dado ao montante dos interesses envolvidos nessa questão da biotecnologia, parece que esse cruzamento ainda vai render muitos frutos transgênicos.

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