"Buenas tardes, buenas tardes." O ator Wagner Moura chega à sala de entrevistas onde começará a divulga a segunda temporada de Narcos, na qual interpreta de forma poderosa o narcotraficante Pablo Escobar, com um sorriso confiante nos lábios. Usa do espanhol que lhe garantiu a indicação para o Globo de Ouro no ano passado. O mesmo espanhol pelo qual foi criticado, principalmente pelo público brasileiro, ao vê-lo interpretar um personagem colombiano.
A leveza pode se dever ao fato de que o trabalho de Moura está próximo do fim. As gravações para o brasileiro já haviam terminado. A nova safra de episódios estreia no serviço de televisão por streaming Netflix no dia 2 de setembro. Naqueles dias de junho, a questão era cumprir as rodadas de entrevista e, quem sabe, garantir mais uma lembrança entre os melhores do ano nesta despedida do personagem mais controverso já interpretado pelo baiano.
Há quem tenha comparado Escobar com o Capitão Nascimento, policial do Batalhão de Operações Policiais Especiais incorruptível, porém com uma inclinação à violência, que protagonizou os dois Tropa de Elite, filmes que levaram Moura e o diretor José Padilha para os holofotes internacionais. Há uma dualidade no caráter de ambos. E, por pior que Nascimento fosse, ele ainda estava do lado dos mocinhos da história. Por melhor pai de família, por mais que ele tenha se preocupado com os pobres de Medellín, cidade onde morou por grande parte da sua vida, por mais que exista uma porção enorme de razões para buscar um lado solar no personagem, Escobar integra o time oposto.
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O segredo de Narcos, assim como de Tropa de Elite, é fugir do maniqueísmo barato. E, é claro, Escobar não é apenas o maior narcotraficante que o mundo já viu e o assassino implacável. Independentemente do time pelo qual o personagem esteja jogando, Moura se interessa pela profundidade daquele que vai interpretar. "Pense que Pablo Escobar não existisse na vida real. Pense em todas as características dele. Aquelas que o transformam numa pessoa ruim, pense naquilo que o faz um humano como eu e você. Tudo isso torna o personagem de Pablo Escobar alguém fascinante", explica Wagner, em inglês, para ser compreendido por um grupo que reunia jornalistas da Alemanha, Argentina, México, Inglaterra e, claro, Brasil. "Com o capitão Nascimento, as pessoas me perguntavam: ‘Ele é o herói ou o vilão?’. Eu não o vejo como um ou outro. Eu entendo o personagem como uma pessoa. Somos todos assim, de alguma forma. Não podemos falar que o Pablo, por exemplo, é uma má pessoa. Ele é um ser humano".
Existe um notável controle maior da situação por parte do ator, se comparado à situação similar na qual ele se encontrou no ano passado, antes da estreia de Narcos - e do sucesso experimentado pela série exclusiva do Netflix desde o seu lançamento. O Globo de Ouro só ajudou a coroar o projeto que, a princípio, poderia ser um tiro n’água. Uma produção norte-americana sobre um personagem local, filmada na Colômbia, com atores também mexicanos e um protagonista brasileiro. "É uma questão importante para os colombianos. Quero dizer, entendo quando um sujeito chega com seu passaporte colombiano a alguma alfândega, fazem alguma piada com a cocaína e ele fica nervoso. Entendo por que eles estão se reconstruindo depois de tudo o que aconteceu por aqui", diz.
A segunda temporada de Narcos reserva seus dez episódios apenas aos últimos oito meses de vida de Pablo Escobar, caçado e morto em 2 de dezembro de 1993. Uma narrativa que se aprofunda muito mais no caráter do personagem e nos seus questionamentos internos do que nos fatos históricos que marcaram a trajetória sangrenta do personagem ao longo de uma década, como aconteceu na trama do primeiro ano da série. Curiosamente, o que acontece com Pablo Escobar nos seus últimos meses de vida é o maior mistério.
Rodeado de jornalistas, Moura mostra estar confortável no papel do intérprete de Escobar. Sem medo, fala de questões como o combate ao tráfico de drogas. "Essa é minha opinião e não tem nada do Netflix aqui", inicia ele. "Sempre achei que as drogas deveriam ser legalizadas. E, fazendo Narcos, tive 100% de certeza de que a guerra contra as drogas é um grande erro. É um grande fracasso. É uma política norte-americana, mas a guerra não acontece lá. Acontece no México, na Colômbia, nos países que exportam a droga", ele diz.
Pouco se sabe sobre os derradeiros dias, até a ligação do narcotraficante para o filho ser triangulada pelos agentes que o procuravam. Até o tiroteio nos telhados de Medellín, até o corpo rechonchudo do maior narcotraficante da história ser perfurado por disparos norte-americanos e cair, sem vida, no chão. "Pablo Escobar era resiliente", conclui Moura, por fim. "Um cara gordo e durão."
O repórter viajou a convite da produtora. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.