Depois de semanas de pressão para que o Supremo Tribunal Federal analise novamente a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, ministros da Corte discutem nesta terça-feira (20), em reunião, uma possível solução para o impasse em torno do tema. O encontro será no gabinete da presidente do STF, Cármen Lúcia, que tem resistido a pautar um novo julgamento dessas ações e do habeas corpus apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Nesta segunda-feira (19), o ministro Gilmar Mendes criticou, sem citar nomes, o fato de habeas corpus não terem sido pautados para julgamento. "A casa do pai tem muitas moradas e o caminho para a casa do pai é diverso. De modo que discutir se a questão será julgada em habeas corpus ou em ação direta de inconstitucionalidade não é importante. O importante é que seja discutido e não se negue jurisdição. O que é grave para o Judiciário e não pode ocorrer é não julgar."
Sorteado relator de habeas corpus coletivo que pedia a libertação de condenados em segunda instância, Gilmar negou o pedido. A ação buscava beneficiar os que estão presos e os que se encontram perto de receber uma ordem de prisão, na fase final dos recursos. Para ele, há presos que, pela gravidade dos atos, não poderiam ser beneficiados por decisão que lhes permitissem responder em liberdade.
Cármen Lúcia vem sendo pressionada a pautar um julgamento definitivo sobre as ações que discutem a prisão após a condenação em segundo grau. A defesa de Lula quer ter analisado no plenário habeas corpus em que pede para responder em liberdade até o último recurso na ação penal do caso do triplex do Guarujá (SP). Ele foi condenado a 12 anos e 1 mês por corrupção passiva e lavagem de dinheiro e pode ter o recurso analisado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) até o fim deste mês.
'Não cedo'
À GloboNews, Cármen Lúcia voltou a dizer que não vai pautar o tema, decidido em 2016. "Não há nenhuma razão para que a matéria volte agora, abstratamente, para levar à mudança da jurisprudência. Não cedo a que isso venha acontecer." Segundo ela, a segunda instância "foi uma conquista do STF e do Judiciário para garantir a continuidade dos processos de todas essas operações de combate à corrupção".
Em entrevista à rádio Itatiaia nesta segunda-feira, Cármen afirmou que o convite para a reunião de hoje foi feito pelo ministro Celso de Mello, o mais antigo da Corte. "Não é reunião formal, nem fui eu que convoquei, mas é comum a conversa acontecer. Não tem nada de convocação, coisa que não fiz, nem tem nada de extraordinário." O encontro foi revelado pela colunista do jornal O Estado de S. Paulo Eliane Cantanhêde, no Domingo (18).
O gabinete de Celso de Mello informou que ele não comentaria. O decano, defensor da presunção da inocência, é um dos que têm cobrado publicamente uma data para o julgamento. Na semana passada, o advogado de Lula e ex-ministro do STF, Sepúlveda Pertence, se reuniu com Cármen Lúcia para pedir a inclusão do tema na pauta. No mesmo dia, um grupo de 20 deputados do PT também foi recebido por ela, que não deixou espaço para negociação. A estratégia dos petistas agora será tentar pressionar o ministro Edson Fachin, relator de um habeas corpus de Lula.
Ministros favoráveis à rediscussão do tema buscam uma solução. Uma possibilidade seria que o ministro Marco Aurélio Mello, relator das ações que tratam da prisão em segunda instância, apresentasse questão de ordem que levasse a uma nova análise pelo plenário da Corte.
Outra opção seria o conjunto de ministros rediscutir a questão ao analisar embargos de declaração (tipo de recurso) interpostos contra o acórdão do julgamento de outubro de 2016. A jurisprudência atual do STF é de que cabe prisão após condenação em segunda instância. Gilmar indicou que pode mudar de voto, por isso os advogados esperam novo julgamento. Já Alexandre de Moraes não integrava a Corte quando o caso foi a plenário e pode votar agora.
Trânsito em julgado
Ministro do Supremo Tribunal Federal contrário à execução antecipada da pena, Marco Aurélio Mello disse que poderia rever sua posição se houvesse uma mudança na Constituição que definisse a condenação em segunda instância como trânsito em julgado. "Quem sabe a solução estaria aí, em uma emenda para dizer: havendo duplo pronunciamento com o crivo do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Federal, após não caber mais recursos nesses tribunais, tem-se o trânsito em julgado. É uma solução", disse ele.
Marco Aurélio afirmou ainda que o ex-ministro da Corte Cezar Peluso propôs a mudança em 2011, que virou uma proposta de emenda à Constituição (PEC), que não foi adiante. A alteração, no entanto, caberia ao Congresso. Para Marco Aurélio, a mudança seria uma solução para a característica de "recursos sucessivos" que enfrenta a Justiça brasileira no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no STF. "Se o nosso sistema enseja recursos sucessivos, devemos modificar o sistema, não o colocar em segundo plano", disse o ministro.
Questionado se seria simpático à ideia da execução de pena após decisão do STJ, Marco Aurélio declarou que a tendência é de reafirmar o voto de outubro de 2016, pela prisão após esgotamento de todos os recursos. Autor da PEC que propõe a conclusão dos processos a partir de segunda instância, o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) quer que ela seja aprovada para garantir segurança jurídica no País. "Não há como a gente conviver com essa situação." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.