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Sem consenso

Projeto Antiaborto por Estupro divide direita, e ala vê 'tiro no pé'

Marianna Holanda e Victoria Azevedo - Folhapress
18 jun 2024 às 10:05

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- Olha Rruskykh/Pexels
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O projeto de lei Antiaborto por Estupro, que teve o regime de urgência aprovado em votação-relâmpago na Câmara na semana passada, não é consenso nem mesmo entre representantes da direita no Congresso.

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Parlamentares de partidos como União Brasil, Solidariedade, PP e PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro, admitem reservadamente que o conteúdo do texto tem problemas e avaliam que a direita perdeu para a esquerda no debate.

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Para uma ala desses deputados e senadores, o projeto foi descrito como um "tiro no pé", já que é uma pauta que poderia ter apoio da sociedade, mas trouxe elementos que são criticados até mesmo pelo eleitor de direita -como, por exemplo, a possibilidade de uma mulher vítima de estupro que faz aborto ter pena maior do que o seu estuprador.


O projeto de lei altera o Código Penal para aumentar a pena imposta àqueles que fizerem abortos quando há viabilidade fetal, presumida após 22 semanas de gestação. A ideia é equiparar a punição à de homicídio simples.

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"O tema foi mal colocado, a direita errou na condução desse processo e deu munição para ataques da esquerda", diz o líder do Solidariedade na Câmara, deputado Aureo Ribeiro (RJ).


Um líder do centrão diz, sob reserva, que essa discussão foi ruim para a direita e até mesmo para bolsonaristas. O próprio Bolsonaro teve postura comedida sobre o projeto, sem endossá-lo publicamente, o que foi interpretado por aliados como uma sinalização de que ele quer distância da polêmica.

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A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro nem sequer se manifestou sobre o projeto de lei nas redes sociais.


Para esse dirigente do centrão, a expectativa é que o tema saia do radar e não seja votado na Câmara agora.

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A crítica ao projeto de lei também encontra ressonância em parlamentares mais alinhados ao ex-presidente, que veem exageros no texto. Nas redes sociais, muitos optaram pelo silêncio.


Em sessão de debates sobre o tema no Senado nesta segunda-feira (17), a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), ex-ministra do governo Bolsonaro, lançou dúvidas sobre a proposta e disse ainda que ela pode não ter ocorrido em momento oportuno.

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"Nós temos dúvidas sobre o texto? Temos. Foi em momento oportuno a apresentação do projeto? Tenho dúvida. Será que não era para a gente estar discutindo lá no âmbito do Judiciário, ajudando o CFM [Conselho Federal de Medicina] a enfrentar este debate lá no STF?", afirmou Damares.


Segundo ela, a discussão da proposta foi uma decisão política em "uma reação do Congresso a uma decisão" do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

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Moraes suspendeu todos os processos judiciais e procedimentos administrativos e disciplinares provocados por resolução do Conselho Federal de Medicina.


A resolução proibia a assistolia fetal, procedimento que consiste na injeção de produtos químicos no feto para evitar que ele seja retirado do útero com sinais vitais.


Ele é recomendado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e é tido pelos protocolos nacionais e internacionais de obstetrícia como a melhor prática assistencial à mulher em casos de aborto legal acima de 20 semanas.


O projeto de lei é de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), ex-presidente da frente evangélica da Câmara. Um dos argumentos contrários à proposta diz respeito à forma como foi apresentada. A avaliação de parlamentares é a de que eles não conseguiram rebater a tese de que o texto não afetaria crianças vítimas de violência sexual.


Defensores da proposta falam que eles são inimputáveis, mas o texto pode levar meninas abaixo dos 18 anos a ficarem internadas em estabelecimento educacional por até três anos.


Um dos motes de parlamentares que são contrários à votação do projeto é o de que "criança não é mãe". Membros da direita dizem que essa narrativa encontrou adesão na sociedade civil.


Líder do PL na Câmara, o deputado Altineu Côrtes (RJ) minimiza as críticas e afirma que há uma "falsa impressão" de que há uma vitória da esquerda na opinião pública e nas redes.


"O que existe hoje é uma guerra de narrativa encaminhada por grande parte da imprensa, que tem falsa impressão de que existe uma vitória na opinião pública e nas redes. O projeto tem força para ser aprovado tanto na Câmara quanto no Senado", diz.


Uma liderança de direita diz que um exemplo de como as críticas ao projeto foram expressivas é o fato de que ela uniu pessoas em manifestações de rua contrárias ao texto -algo que a esquerda não vinha conseguindo mobilizar.


Ele cita como exemplo as manifestações do "Ele, não", contra Bolsonaro, em 2018, ainda que em menor escala.


A principal consequência disso, segundo parlamentares, é uma vitória para o governo Lula (PT) num momento em que o presidente estava sob pressão após enfrentar reveses em votações no Congresso, principalmente nas chamadas "pautas de costume".


Num primeiro momento, governistas disseram que o projeto antiaborto não era tema de governo -e foram criticados por apoiadores. O próprio Lula demorou para se posicionar acerca do assunto, mas depois de manifestações de ministros, deu declarações críticas ao projeto, classificando-o como uma "insanidade".


Diante da repercussão negativa ao projeto, deputados e senadores da direita já admitem mudar o teor da proposta numa tentativa de aprová-la.


O próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), declarou publicamente que "o sentimento da Casa não é para avançar para liberação do aborto e também não é para descumprir os casos que já são permitidos hoje em lei". Lira indicou que o que está em discussão no projeto é a assistolia fetal.


Uma tese que circula entre deputados de direita é a de retirar do texto a punição para as mulheres que fizerem aborto acima da 22ª semana dentro das opções da lei, mas mantê-la para médicos que realizarem esse procedimento.


Na avaliação desses parlamentares, a hipótese tira o argumento da esquerda de penalização da vítima, mas, na prática, torna inviável a realização do procedimento.


Outra possibilidade, defendida pelo próprio Sóstenes Cavalcante, é a de aumentar a pena para estupradores.


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PL Antiaborto por Estupro pode levar menores de idade a privação de liberdade por até 3 anos
Se o Projeto de Lei 1904 for aprovado, meninas abaixo dos 18 anos vítimas de estupro que fizerem aborto depois das 22 semanas ou quando houver viabilidade fetal poderão acabar internadas em um estabelecimento educacional por até 3 anos.
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