Segundo um dossiê assinado por 15 médicos, profissionais eram coagidos a prescrever remédios como hidroxicloroquina sem consentimento de parentes dos pacientes e eram obrigados a trabalhar mesmo quando infectados com o coronavírus.
Além disso, o documento afirma que a Prevent teria omitido sete mortes durante um estudo clínico sobre a eficácia dos remédios.
Walter Correa de Souza Melo, um dos médicos que realizou as denúncias, gravou a conversa telefônica de uma ligação com Batista Júnior, após ter relatado irregularidades à imprensa, sob condição de anonimato.
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O áudio e os documentos sobre o caso foram obtidos pela reportagem e também estão entre os arquivos sigilosos da CPI da Covid. O profissional ainda registrou as ameaças em um boletim de ocorrência na Polícia Civil de São Paulo contra Batista Júnior.
O registro também foi anexado a um processo que o médico responde no Cremesp (Conselho Regional de Medicina), a pedido da Prevent Senior, por "vazamento de prontuários", em seus depoimentos.
Em uma nota breve, a assessoria de imprensa da Prevent Senior afirmou que "o dr. Pedro Batista Júnior nega qualquer ameaça a colegas". À PGR (Procuradoria-Geral da República) a empresa disse ser vítima de armação e pediu investigação do caso.
O nome do médico havia sido preservado na publicação inicial desta reportagem, mas ele autorizou sua divulgação horas depois.
Segundo denúncia dele, profissionais de hospitais da Prevent Senior eram obrigados a prescrever medicamentos do "kit Covid", sob pena de serem até mesmo demitidos.
Ele próprio também relatou que foi obrigado a trabalhar em um plantão, mesmo estando infectado pelo novo coronavírus.
Após ter feito as denúncias, ele recebeu um telefonema de Batista Júnior, no qual o diretor-executivo indica que vai prejudicar o médico profissionalmente e chega a mencionar que o ex-funcionário iria desta forma "expor sua filha, sua família".
Por isso pede que o ex-funcionário retire o depoimento e as denúncias feitas à imprensa contra a empresa e afirma que o médico "tem muito a perder".
"Você não ganhou nada com isso. Eu vou pegar cada um dos prontuários dos pacientes que você não tratou e vou mostrar quantos deles foram para a UTI [Unidade de Terapia Intensiva]. É isso que eu vou mostrar, porque eu tenho que provar alguma coisa", afirmou o diretor-executivo na conversa telefônica.
"E sabe o que eu vou provar? Eu vou provar que você mentiu. Vou provar que você é um cara antiético, que você é um dos caras que tinha compliance [queixas na empresa]. Eu vou levar tudo isso, cara", afirmou.
O médico então questiona quais as denúncias pesavam contra ele e o que teria deixado de fazer eticamente no período de trabalho na Prevent Senior.
"Agora não interessa mais. Agora não é mais problema seu. Agora é um problema do mundo, que você jogou pra cima. Entendeu? E você vai sujar o seu nome", respondeu o diretor da empresa.
Batista Júnior em seguida afirma que o ex-funcionário vai expor toda a sua família com a denúncia contra a operadora de saúde. O médico se exalta e pergunta se estaria recebendo uma ameaça.
O diretor-executivo fala que não está realizando nenhuma ameaça e repete essa versão em diversos momentos da conversa. E completa que estava fazendo a chamada telefônica ao lado de um advogado, justamente para tentar provar que o médico estaria tentando desvirtuar a conversa ao dizer estar sendo ameaçado.
"Eu só te falei isso nessa ligação: você tem muito a perder, é sua filha, sua família, que vai ser exposta por uma mídia que hoje destrói tudo", afirmou.
Além de ter efetuado a gravação, o médico registrou no boletim de ocorrência que Batista Júnior seguiu na conversa "com ameaças contra a esposa e a filha".
No processo no Cremesp, o profissional disse ainda que o objetivo da ligação do executivo era coagi-lo a fim de que ele convencesse um jornalista a desistir de uma reportagem sobre "kit covid" envolvendo a Prevent Sênior.
A empresa pediu que o conselho instaurasse uma sindicância "para fins de investigação dos responsáveis pelo compartilhamento indevido de prontuários". Segundo a defesa do médico, o processo é uma das ameaças concretizadas contra o profissional.
A reportagem também teve acesso ao processo, no qual a operadora anexa o prontuário completo de dois pacientes. De acordo com a Prevent Senior, o sigilo foi quebrado, embora os nomes jamais tenham sido divulgados.
A análise do documento mostra que a operadora de saúde realizou uma investigação interna, verificando todos os dados de acesso aos prontuários mencionados.
A empresa também argumentou que os médicos que fizeram a denúncia cometeram infração ética "ao compartilharem com a imprensa os referidos prontuários" e que "ainda o fizeram em circunstâncias que não condizem com a realidade, prática esta também vedada por este conselho de classe".
"Dada a gravidade dos fatos trazidos ao conhecimento deste Conselho Regional de Medicina, requer sejam veementemente apurados para que as penalidades cabíveis sejam aplicadas aos responsáveis pelas condutas contrárias às normas éticas da profissão", diz o documento, também obtido pela reportagem.
A Prevent Senior também afirmou ao conselho que, "diferentemente do que foi alegado na reportagem, a instituição adota um protocolo para afastamento e monitoramento dos colaboradores infectados pela Covid-19, incluindo profissionais da saúde".
Já a defesa do ex-funcionário argumentou no processo do Cremesp que não houve quebra de sigilo médico no depoimento para a imprensa.
O documento encaminhado ao Cremesp também acrescenta a informação de que o médico e Batista Júnior são sócios em uma empresa, a PW Medical, mas que não mantêm laços de amizade.
O negócio, como aconteceria com outros colaboradores, teria sido aberto, segundo o médico, exclusivamente por exigência da Prevent Senior para recebimento de salários. Os dois estão atualmente em litígio, mas o médico disse que as denúncias de ameaça não tem relação com esse fato.