Enquanto posicionamentos da oposição prevaleceram no debate digital em mais temas, como no veto às saidinhas, na alta do dólar e no leilão de arroz, argumentações favoráveis ao governo Lula (PT) predominaram em assuntos de grande repercussão como o PL Antiaborto por Estupro e a chamada "PEC das Praias".
Outro tema em que o governo saiu à frente foi no embate entre o presidente da República e o chefe do Banco Central, Roberto Campos Neto.
É o que mostra levantamento da Quaest, que coletou menções relacionadas a alguns dos principais assuntos que reverberaram no debate político digital nos últimos meses.
O recorte temporal varia para cada tema, tendo sido considerados os episódios mais recentes e com maior nível de menção sobre cada tópico. Foram coletados dados de algumas das principais redes sociais –X (ex-Twitter), Instagram, Facebook, YouTube, Reddit e Tumblr–e sites de notícias até 2 de julho.
Das menções totais por tema, desconsiderando as postagens neutras, o restante foi classificado entre posições pró-governo e pró-oposição -conteúdos de veículos de imprensa são considerados neutros, não entrando em nenhuma das duas classificações.
Na pauta econômica, enquanto as menções mais específicas à alta do dólar (após falas de Lula a respeito) são mais negativas ao governo, o embate do presidente contra Campos Neto têm surtido efeito positivo no ambiente digital.
No período mais recente analisado pela Quaest, 78% das publicações ecoam o tom crítico de Lula à atuação do Banco Central, enquanto apenas 22% foram favoráveis à Campos Neto. Considerando as menções desde julho de 2023 referentes ao tópico, que tem se repetido ao longo do tempo, o debate segue mais favorável ao governo, porém em percentual menor: 62%.
Os últimos picos se deram em 19 de junho e 2 de julho, após declarações de Lula, como na entrevista em que o petista criticou a taxa de juro e disse que Campos Neto "tem lado político" e "não demonstra nenhuma capacidade de autonomia". Lula citou ainda jantar que o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) fez em homenagem ao presidente da autoridade monetária no início de junho.
Já as menções referentes à subida do dólar abrangeram de 26 de junho até 2 de julho, período em que, segundo analistas, declarações de Lula teriam contribuído para o salto da cotação da moeda estrangeira. No debate digital, o governo saiu perdendo: com 68% de menções críticas.
Dois dos episódios que foram negativos para a oposição e favoráveis ao governo tiveram forte apelo e mobilização popular. Tanto na chamada "PEC das Praias" quanto no PL Antiaborto por Estupro –citado nas redes como "PL do aborto" e também como "PL do estupro"– a repercussão forçou o Congresso Nacional a recuar.
Segundo dados da Quaest, em ambos os temas, as menções contrárias aos textos, encampados pela oposição, chegaram à casa dos 90%.
Em suas redes, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) tentou, sem sucesso, afastar a pecha de privatização das praias da proposta da qual é relator. A direita buscou também disseminar o argumento de ser favorável a penas mais duras para estupradores, mas não conseguiu reverter a visão negativa que acabou prevalecendo sobre o texto que equipara o aborto após 22 semanas de gestação a homicídio simples, mesmo nos casos em que o procedimento está previsto na Constituição.
Guilherme Russo, diretor de Inteligência da Quaest, destaca que apesar de em geral a oposição ganhar no campo dos costumes, o enquadramento dado ao PL relacionado ao aborto resultou numa vitória do campo progressista.
Já na economia, ele avalia que apesar de temas como a autonomia do Banco Central, parte do discurso de Lula (no sentido de que seu objetivo seria o de melhorar a economia e ajudar os mais pobres) contribui para explicar o apoio nas redes.
Os demais temas analisados, com variações nos percentuais, foram todos mais favoráveis à oposição do que ao governo –vários deles mobilizados por nomes do bolsonarismo nas redes, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Com 62% de menções críticas, o veto parcial de Lula na lei que acabou com as saídas temporárias de presos foi um deles, tendo passado das 440 mil citações. A análise vai desde a data em que o presidente vetou trecho da nova lei, quando as críticas da oposição tiveram quase o dobro de volume em relação ao discurso pró-governo, até alguns dias depois de o Congresso derrubar o veto –momento em que o debate virtual foi equilibrado entre os dois lados.
A iniciativa do governo de promover um leilão para compra de arroz importado após as enchentes no Rio Grande do Sul gerou 301 mil menções desde a data em que foi publicada medida provisória autorizando a operação.
Os argumentos pró-governo, como o de evitar inflação e desabastecimento, não venceram as críticas, que corresponderam a 60% das menções, diante dos indícios de irregularidades do leilão, que acabou cancelado, e do atrito com o agronegócio.
Outro assunto que fustigou o governo, mas com menor volume, foram as queimadas no Pantanal, tema que começou a crescer nas redes no início de junho. No período analisado, foram 74% de menções negativas. "Onde estão os 'defensores da natureza' na lacrosfera?", escreveu a deputada federal bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP) em um post ao mencionar os incêndios.
Já o debate analisado sobre a PEC das Drogas, com 55% de menções favoráveis à PEC e 45%, críticas, abrange dois episódios recentes que voltaram a impulsionar o tema: o aval da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados para a proposta e o julgamento sobre a descriminalização da maconha pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Enquanto no Senado, aliados do presidente evitaram se posicionar sobre a PEC, na Câmara, o governo deve mudar de postura e atuar para frear o avanço da proposta, como mostrou a Folha.