A suspensão por até 90 dias dos pagamentos para os fornercedores, a chamada moratória, adotada pelo novo governo do Estado, pode gerar um custo financeiro aos cofres públicos. O alerta é do especialista em Direito Administrativo Silvio Guidi, que explica que as empresas que receberem com atraso têm direito a cobrar uma correção monetária com juros de mora ou, dependendo do caso, têm direito até a cobrar uma indenização por danos.
Consultado pela reportagem sobre o assunto, Guidi afirmou que a moratória não tem amparo legal, embora seja uma prática comum, principalmente quando um grupo de oposição assume a administração. ''Quando há possibilidade de fraude num contrato, a suspensão do pagamento é recomendada. No caso, eu acredito que a atual gestão tem algumas desconfianças, mas resolveram colocar todos os contratos no mesmo patamar.''
Guidi não acredita que a medida trará transtornos diretos à população. Ele lembra que a Lei das Licitações, por exemplo, proíbe a paralisação dos serviços ao Estado mesmo quando há falta de pagamento, e desde que observado o prazo de 90 dias de inadimplência. O prejuízo pelo não pagamento pontual dos contratos estaria na outra ponta: ''Indiretamente pode ocorrer prejuízo ao erário e à sociedade. Imagina um fornecedor que, para pagar seus funcionários, resolve pedir empréstimo bancário, tendo que assumir juros altos. Ele pode cobrar na Justiça uma indenização do Estado''.
O especialista acredita, contudo, que nem todos os fornecedores devem cobrar correção monetária ou mesmo indenização. ''A cobrança na Justiça poderia durar uns oito anos. Às vezes o valor é tão baixo que não compensa. Tem fornecedor que também não quer ficar mal com o Estado'', acrescenta.
Empresas estão preparadas para moratória, diz Fiep
O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Rodrigo Rocha Loures, disse ontem que a moratória decretada pelo governador Beto Richa esta semana não surpreendeu o setor produtivo. ''Quem fornece para o Estado já tem que estar preparado'', avaliou. Apesar disso, Loures acredita que a suspensão dos pagamentos poderá trazer transtornos para algumas empresas. ''Mas é uma medida necessária já que o novo governo precisa de um tempo para se organizar'', justificou.
Ele aposta que o governo ''não poupará cuidados'' para que a situação ''não cause danos irreparáveis'' às empresas. A Fiep, adiantou Loures, poderá atuar junto ao governo caso algum dano possa vir a prejudicar o setor.
A medida, no entanto, está preocupando prefeitos de todo o estado que temem a retenção das transferências do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias (ICMS). ''As prefeituras já fecharam 2010 em deficit. Vamos tentar tomar medidas para equacionar isso'', alertou o presidente da Associação dos Municípios do Paraná (AMP), Moacyr Fadel.
Fadel, no entanto, afirmou que ''não acredita'' que o governador Beto Richa inclua as transferências para os municípios na moratória. ''Já temos decisão judicial farovável ao pagamentos de R$ 65 milhões em repasses do ICMS de 2006 a 2010 que foram retidos pelo ex-governador Roberto Requião. Não acho que Beto vá fazer o mesmo'', opinou.
A possibilidade de suspensão nos pagamentos de contratos do governo está prevista na Lei de Licitações até um prazo de 90 dias. ''Nesse período as empresas contratadas devem manter a prestação de serviços mesmo sem o pagamento'', explicou o advogado especialista em Direito do Estado e professor do Centro Universitário Curitiba (UniCuritiba), Marcos Bittencourt.
A regra vale mesmo para empresas que fornecem mão de obra terceirizada para o governo. ''O pagamento dos salários deve ser mantido já que a prestação do serviço continua'', apontou. Após os 90 dias os pagamentos retidos pelo governo deverão ser atualizados e o fornecedor também tem direito a cobrar o juro de mora previsto no contrato.
A moratória de 90 dias é possível porque nos contratos entre a administração pública e empresas está resguardado o interesse público. ''É só acima de 90 dias que a contratada pode pedir a rescisão do contrato ou suspender a execução do serviço'', disse. (Rosiane Correia de Freitas/Folha de Londrina)
Como ficam os pagamentos
Pagamentos mantidos
✓ gastos com pessoal
✓ pagamento e juros da dívida
✓ despesas continuadas
✓ contratos com valor global de até R$ 50 mil
✓ despesas autorizadas pelo Comitê Especial
Pagamentos suspensos
✓ despesas com convênios, contratos e ordens de serviços
✓ pagamentos de prestação de serviço que ainda não tenha sido iniciada
Fonte: Dieese e Decreto 31 de 03/01/2011