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História

Dom João 6º deixava o Brasil há 200 anos

Anna Virginia Balloussier - Folhapress
25 abr 2021 às 15:33

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- Tânia Rego - Agência Brasil
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João Maria José Francisco Xavier de Paula Luís António Domingos Rafael de Bragança, o dom João 6º, tinha as tropas napoleônicas em seus calcanhares quando decidiu se mudar para o Brasil. Chegou em 1808 e ficou 13 anos na ex-colônia que, durante essa temporada, promoveria a Reino Unido de Portugal.


Esta segunda-feira (26) marca o bicentenário de sua partida do território que um ano depois, sob rédea de seu filho dom Pedro 1º e com sua complacência, declararia independência da coroa portuguesa.

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Se o imaginário popular guardou a imagem de um glutão que escondia pedaços de frango no bolso e tinha pavor a banho, a passagem de dom João pelo Rio alavancou um projeto ainda imberbe de nação e, de quebra, deu um banho de loja na nova sede da corte.

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Vêm do que historiadores chamam de período joanino instituições centrais, como a Polícia Militar e o Banco do Brasil. O primeiro jornal impresso no Brasil, a Gazeta do Rio de Janeiro, também é obra de dom João, que instituiu a Imprensa Régia no ano em que se mudou para as Américas. Dom João leva crédito até por popularizar o carioquíssimo hábito de ir à praia.

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"Embora tenha sido retratado por historiadores antimonarquistas do início do século 20 como uma figura grotesca, dom João é hoje considerado o mentor do Estado brasileiro", diz a historiadora Mary Del Priore, com farta obra sobre o passado nacional. "Além de ter enganado Napoleão com sua partida abrupta, ele elevou o Brasil a Reino Unido e era considerado hábil político."


Não que o monarca não tivesse seu lado pitoresco. Conta-se que tamanho era seu pavor de trovões que João se enrolava nas cortinas para não ouvir o estrondo, lembra Del Priore. Também tinha "apetite pantagruélico": devorava até 12 pratos a cada refeição. Os acompanhamentos eram frutas, queijos, doce e pães.

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Filho zeloso, João levava dona Maria 1º para passear na sua fazenda Santa Cruz, onde saboreavam mangas. "Quando a rainha morreu, ele se desolou e passou três dias sem se alimentar, em total desespero e saudade", afirma a historiadora. Passou de príncipe regente a rei depois disso.


Na mesma granja, um carrapato picou a perna de João. A ferida infeccionou, e o paciente seguiu uma recomendação médica então comum: sanar feridas com o iodo marinho do mar. Passou a tomar banhos de mar, o que ainda não era costume dos cariocas.

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Para o tratamento, enfiava-se numa caixa de madeira perfurada, molhando só partes do corpo. Ele esperava assim evitar o ataque de crustáceos nas águas da praia do Caju, próxima à Quinta da Boa Vista, a residência real.


A praia sumiu com a construção da ponte Rio-Niterói. Já a Quinta, erguida em 1803 por um traficante de negros escravizados e doada para a família imperial em 1808, existe até hoje. Quem quase desapareceu foi o Museu Nacional, abrigado no terreno e parcialmente destruído num incêndio 200 anos após ser fundado pelo rei João.

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Com a corte vieram as idiossincrasias de dom João, mas também o aparelho de um Estado soberano: a alta hierarquia civil, religiosa e militar, aristocratas e profissionais liberais, artesãos qualificados, servidores públicos.


A capital ganhou a Biblioteca Real, a Academia Real de Belas Artes, a Imprensa Real e a Academia Militar. A abertura dos portos para nações amigas de Portugal, em 1808, encerrou a relação comercial exclusiva com a metrópole e dinamizou a economia local.

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A cidade teve upgrade de estradas, iluminação e uma administração pública mais estruturada que, segundo Del Priore, "incorporou muitos brasileiros, inclusive afro-brasileiros e afro-mestiços".


"A transferência da corte mudou a maneira como as pessoas dos dois lados do Atlântico entendiam a situação do Brasil, que deixou de ser colônia", afirma a historiadora Kirsten Schultz, que no livro "Versalhes Tropical" se debruça sobre a vinda do clã real para os trópicos. "Afinal, um rei não poderia viver em uma colônia porque era um território de status inferior."

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Antes de 1808, a capital tinha casas simples e ruas apertadas, a maioria sem calçamento. Nada digno de uma monarquia. Ao aportar no Rio, o regente foi recebido com ruas cobertas de areia, ervas e flores, conforme narrou o cônego imperial Luiz Gonçalves dos Santos, o Perereca, padre-cronista daqueles tempos.


A cidade estava em festa. Sinos badalaram nas igrejas, fogos de artifício coloriram o céu e um coreto entoou "melodiosas vozes instrumentais como vocais", segundo Perereca.


Com dom João, o Rio provou do "lifestyle" cosmopolita. Para abrigar os milhares de recém-chegados numa cidade de 60 mil habitantes, um tanto de gente acabou desalojada –incluindo parte da elite que vivia em suntuosas chácaras. O despejo por ordem real foi batizado de "aposentadoria".


O desembarque daquele homem baixo, com papadas e ventre esférico, com coxas roliças que desgastavam o calção de seda, empurrou o Brasil para uma modernidade inédita. O Rio pré-dom João foi para o brejo: a nova administração aterrou pântanos e abriu ruas mais largas e planejadas.


Apreciador de óperas, o regente ordenou a construção do Teatro Real de São João (atual João Caetano). Inaugurada em 1813, a casa abrigou "Don Giovanni", ópera de Mozart encenada pouco após sua estreia, em Viena.


Embrião da PM, a Polícia da Corte foi fundada em 1809. Os 218 oficiais da primeira leva substituíram quadrilheiros, que faziam a patrulha local munidos de lanças e bastões.


Schultz aponta que o policiamento foi concebido para, em parte, punir escravizados. "As preocupações do primeiro intendente de polícia com o que ele chamou de 'civilização' e 'segurança pública' também levaram a ações repressivas contra os negros livres, incluindo trabalho forçado. A presença da corte desafiou a ideia de que o Brasil era uma colônia de Portugal, mas reafirmou o colonialismo gerado pelo domínio português."


Dom João dava todos os sinais de que veio para ficar de vez. "Isso contribuiu para criar na Europa a impressão de que pessoas da maior estatura, como uma das dinastias reinantes, podiam viver com certo conforto nos trópicos", diz a historiadora Isabel Lustosa, do Centro de Humanidades da Universidade Nova de Lisboa e autora de livros sobre o período joanino.

"Tudo isto elevou a moral dos brasileiros e lhes deu força para resistir às tentativas de retrocesso que se seguiram à partida do rei." O regente pródigo a Portugal voltou, ainda que a contragosto, pressionado pelos conterrâneos, que atravessavam a liberal Revolução do Porto.
Em 1822, vingou o clamor nacional: independência ou morte.


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