Numa reciclagem de temas que marcaram o início do mandato de Jair Bolsonaro (PL), aliados do ex-presidente tentam usar a crise provocada por Lula (PT) com Israel para inflar a manifestação marcada para o próximo domingo (25) na avenida Paulista, em São Paulo.
O ato pretende criar uma imagem de apoio ao ex-mandatário, objeto de operação da Polícia Federal para determinar seu papel na trama golpista durante a transição de governo, de 2022 a 2023.
Faz-tudo de Bolsonaro, o advogado Fábio Wajngarten escreveu no X (ex-Twitter) que iria sugerir ao ex-presidente e ao pastor Silas Malafaia, organizador do evento, que convidassem o embaixador israelense no Brasil, Daniel Zonshine, que seria "muito bem recebido e acolhido".
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Lula provocou a ira do governo israelense e da comunidade judaica ao comparar a guerra em Gaza ao Holocausto nazista durante viagem à Etiópia, no fim domingo (18). Nesta segunda (19), a chancelaria em Tel Aviv declarou que o brasileiro é "persona non grata" em Israel, escalando ainda mais a crise.
O tema do extermínio de 6 milhões de judeus europeus pela ditadura de Adolf Hitler é o mais sensível da política israelense. A argumentação básica é óbvia: Israel lançou sua guerra devido ao mega-atentado terrorista do grupo palestino Hamas em 7 de outubro, um ato de defesa.
Está sendo questionado acerca da proporcionalidade de suas ações, o que é diferente de ter imputada a si a acusação de genocídio –há uma investigação aberta a pedido da África do Sul na Corte Internacional de Justiça, mas ela não aceitou a tipificação em sua análise preliminar.
Desde o começo da guerra, Lula tem irritado os israelenses, influenciado pela posição histórica da esquerda brasileira em favor dos palestinos. Chamou a guerra de genocídio e subscreveu a petição sul-africana em Haia.
O embaixador Zonshine, por sua vez, se viu exposto por criticar diretamente o governo em reunião com deputados bolsonaristas na Câmara. Aqui, a trama em curso remete ao primeiro ano de Bolsonaro no poder.
Em sua esvaziada posse, o premiê israelense, Binyamin Netanyahu, foi o principal destaque. Bolsonaro logo visitou o Estado judeu, em março de 2019, e prometeu que mudaria a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, repetindo um compromisso de campanha –repetido agora pelo argentino Javier Milei, ídolo de bolsonaristas.
O gesto brasileiro, que acabou nunca se concretizando devido a protestos dos países árabes, grandes compradores de proteína animal do país, significaria tomar um lado: como tanto palestinos quanto judeus reclamam Jerusalém como capital, a grande maioria das nações mantém sua representação diplomática em Tel Aviv.
Tudo isso diz respeito aos evangélicos aliados a Bolsonaro. Israel é um ícone para boa parte desse segmento religioso, e as franjas mais milenaristas acreditam que sem o Estado judeu, não há a possibilidade da volta de Jesus Cristo à Terra.
Há diversas interligações simbólicas. A Igreja Universal do Reino de Deus construiu uma versão do Templo de Salomão em São Paulo, inaugurada por um Edir Macedo paramentado de rabino. Grupos de fiéis sendo levados para batismo no rio Jordão são grande negócio –até Bolsonaro o fez, em 2016, pelas mãos do ex-presidenciável Pastor Everaldo, hoje dirigente do Podemos e guia turístico ocasional em Israel.
Os evangélicos são um dos mais resilientes grupos de apoio ao ex-presidente, estando entre os estratos que mais se consideram bolsonaristas, conforme apontou pesquisa do Datafolha.
Entre os judeus, a situação é mais complexa. A proximidade por meio dos evangélicos foi muito explorada na disputa eleitoral de 2018. Wajngarten e o empresário Meyer Nigri, ambos judeus, estavam no nascedouro de sua precária campanha. Acabaram se antagonizando com outros membros da comunidade, mais à esquerda, que apontavam um sequestro da imagem dos judeus pelo bolsonarismo.
O embate perdurou durante o governo, em especial devido ao manejo irresponsável de Bolsonaro da crise sanitária da pandemia de Covid-19. Agora, a situação se adensa: mesmo judeus não bolsonaristas estão chocados com as falas de Lula acerca da guerra Israel-Hamas.
O bolsonarismo não perdeu tempo e buscou a associação, além de prometer tentar provocar o impeachment do petista devido à crise, o que evidentemente é só retórica. Para seus críticos, isso também sinaliza o temor de fracasso do ato.
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