O Gepatria (Grupo Especializado na Proteção ao Patrimônio Público e no Combate à Improbidade Administrativa), órgão do MP (Ministério Público), investiga suposto esquema de "rachadinha" organizado pelo deputado estadual Matheus Viniccius Petriv, o Boca Aberta Junior (Pros). No mesmo inquérito estão sendo apuradas as informações em relação a eventual desvio dos kits esportivos retirados da Paraná Esporte em setembro de 2020 em nome do deputado para destinação, por indicação parlamentar, para cinco colégios estaduais de Londrina. Os kits somam R$ 370 mil de itens comprados com recursos públicos.
A investigação apura a denúncia de que o deputado exigia de servidores ocupantes de cargos em comissão, indicados por ele, parte significativa dos seus vencimentos mensais como condição para que se mantivessem nos cargos. Mas o esquema não envolveria repassar os proventos públicos ao parlamentar. Ao menos dois ex-comissionados afirmaram ao MP que eram orientados a pagar contas pessoais do deputado, entre elas o IPTU da família com os vencimentos próprios. Além de testemunho, documentos que comprovariam as transações foram entregues ao Gepatria.
Os servidores também informaram em depoimento que eram obrigados a comprar cestas básicas e até pagar fornecedores para aquisição de produtos que eram entregues à população em nome "da família Boca Aberta", que inclui o pai, deputado federal Boca Aberta (Pros), e a mãe, vereadora de Londrina e então candidata Mara Boca Aberta (Pros). Os comissionados também informaram ao Gepatria que pagaram com parte de seus salários um fabricante de camisetas confeccionadas em nome da família (a 'famosa' cópia, sem autenticidade, da camiseta do Tubarão com o "brasão" da família Boca Aberta).
As oitivas foram iniciadas na última segunda-feira (26). A FOLHA apurou que ao menos dez pessoas, entre denunciantes e testemunhas, foram ouvidas pelos promotores Renato de Lima Castro e Ricardo Benvenhu, do Gepatria. Eles não quiseram dar entrevista, mas confirmam as investigações.
Já foram ouvidos os dois ex-assessores do deputado, três diretores de colégios públicos de Londrina, entre outros fornecedores testemunhas das supostas irregularidades. Ao final do inquérito, Boca Aberta Junior pode responder a uma ação de improbidade administrativa que poderá resultar em perdas dos direitos políticos e devolução dos recursos. Outra possibilidade, se forem comprovados os fatos, é de encaminhamento da investigação para o Tribunal de Justiça oferecer denúncia criminal por peculato.
KITS ESPORTIVOS
Os diretores dos colégios Dr. Olavo Garcia Ferreira (zona oeste), Edneia Maturana; do Colégio Olympia Tormenta (zona norte), Anderson Gomes Vieira; do Colégio Ana Garcia Molina (zona leste), Aracelle Palma Favaro Motta confirmaram ao Gaeco a mesma versão publicada em reportagem da FOLHA. Isto é, que foram procurados pelos assessores de Boca Aberta Junior em meados do ano passado para serem os escolhidos para receberem os kits. Também confirmaram que assinaram documentos genéricos apontando que estariam recebendo kits (basquete, vôlei, futsal, handebol e futebol), mas á época não tinham conhecimento do que o entregue em nome do deputado teria uma discrepância quanto ao que realmente tinham direito pelo programa. Cada kit modalidade tem valor de R$ 15 mil, ou seja, cada colégio teria direito a receber R$ 75 mil em itens esportivos (bolas, redes, uniformes, entre outros). Mas, na prática, guardaram em seus depósitos materiais com itens faltantes, à espera do retorno dos estudantes às aulas presenciais.
Outra testemunha, que preferiu não se identificar para a reportagem, entregou ao Gepatria nesta semana 22 camisetas, 22 shorts e 22 pares de meia de futebol. Ele admitiu que "ganhou" esses kits esportivos como representante de uma associação de bairro no período pré-eleitoral em 2020. O material devolvido para os promotores é idêntico aos itens faltantes e que não chegaram aos colégios, segundo disserem os diretores. A Paraná Esporte, autarquia ligada à Seed (Secretaria Estadual de Educação) respondeu à FOLHA em reportagem publicada na semana passada que abriu em "caráter de exceção" a possibilidade de assessores de deputados retirassem o material na capital em nome das escolas elencadas como beneficiárias pela emenda parlamentar. O órgão também repassou apuração interna à CGE (Corregedoria-geral do Estado).
Marcio Susuki, ex-diretor financeiro da FEL (Fundação de Esportes de Londrina) e chefe de gabinete do vereador Madureira (PTB), também prestou depoimento como testemunha ao Gepatria. Ele estava presente durante a entrega dos kits esportivos no estacionamento público em frente ao Ginásio de Esportes Moringão em setembro do ano passado aos diretores dos colégios Polivalente e Olympia Tormenta. Susuki confirmou à FOLHA que achou estranha a entrega feita por assessores de Boca Aberta Jr. A despeito do documento genérico, o então diretor da FEL sugeriu que os diretores conferissem o quantitativo entregue e assinassem um documento do que foi entregue realmente entregue em nome do deputado. O quantitativo assinado por ambos os diretores não batem com os itens contidos no kit modalidade do programa estadual (R$ 75 mil em produtos esportivos).
OUTRO LADO
O deputado Boca Aberta Junior (Pros) alega que a denúncia de suposta "rachadinha" em seu gabinete partiu de ex-colaboradores por retaliação após terem sido demitidos. Ele negou as acusações de exigência de pagamentos e compras de cestas básicas. "Quanto a gente mandou embora, eles se rebelaram porque não quisemos destinar a eles o fundo eleitoral. Ao contrário, devolvemos dinheiro ao partido e não usamos nenhum centavo de dinheiro público. Por birra política, eles estão fazendo essas falsas acusações. O ônus da prova é de quem acusa," disse.
Já sobre a entrega de kits esportivos da Paraná Esportes por meio de emenda parlamentar e que estariam incompletos, o deputado estadual volta a negar desvio. "O que existe dos kits esportivos são cinco termos de entregas assinados pelos diretores conforme encaminhei. Só três diretores que questionaram e os outros dois estão super felizes." O diretor do colégio Polivalente (zona oeste), Antonio Carlos de Camargo, não quis gravar entrevista e não foi chamado ainda para depor. A direção do Colégio Machado de Assis, outra beneficiária, ainda não foi ouvida. Boca Aberta Jr, diz ainda que denunciou as supostas "fake news" contra a família à Polícia Federal.