A polêmica Medida Provisória que autoriza o plantio de soja transgênica na safra agrícola deste ano foi assinada no fim da noite de quinta-feira pelo presidente interino José Alencar.
Alencar relutou em assinar a MP por vários dias, e não escondeu o desconforto em ter de decidir sobre um tema que divide o governo, o Congresso Nacional e vários setores da sociedade. Diante de tamanha pressão, Alencar foi cauteloso. Antes de dar a palavra final sobre o tema, ouviu a posição das várias entidades envolvidas na questão dos transgênicos.
A MP valerá para todo o país, mas limita a plantação de soja transgênica à safra 2003/2004. As sementes geneticamente modificadas que não forem plantadas ou comercializadas até o dia 31 de dezembro de 2004, segundo a MP, terão que ser incineradas.
Os agricultores também terão que assinar um termo de compromisso, responsabilidade e ajustamento de conduta para garantir que a plantação siga as normas estabelecidas pelo governo.
Entre as normas previstas, está a que proíbe que os agricultores comercializem sementes transgênicas em estados distintos aos que elas tenham sido produzidas. Esse item, na prática, limita o plantio ao estado do Rio Grande do Sul, mas foi a solução encontrada pelo governo para evitar que a MP fosse considerada inconstitucional ao permitir a plantação a um único estado.
Os agricultores que não seguirem as determinações da MP vão pagar multa da ordem de R$ 16 mil, prevista na Lei 10.688 de 2003 - que regulamentou o plantio de soja transgênica na safra 2002/2003. Os produtores rurais terão o prazo de 30 dias para assinar o termo de compromisso, que poderá ser adquirido nas agências do Correios, da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil.
Os agricultores que não assinarem o documento e não seguirem as determinações da MP ficarão impedidos de obter empréstimos e financiamentos de instituições oficias de crédito, assim como não terão acesso a benefícios fiscais do governo.
Além disso, os produtores que causarem danos ao meio ambiente ou a terceiros - por contaminação decorrente de cruzamento de sementes transgênicas - responderão pela indenização ou pela reparação integral do dano, independente de existência de culpa do produtor.
A Medida Provisória também proíbe o plantio de soja transgênica nas áreas de unidades de conservação e proteção ambiental, e em terras indígenas.
A edição da MP frustrou a expectativa de setores ambientalistas que defendiam um estudo de impacto ambiental antes da liberação do plantio da soja transgênica. O texto não obriga a realização do estudo, apenas institui uma comissão de acompanhamento integrada por vários ministérios e órgãos de defesa do meio ambiente, como o Ibama e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para supervisionar as determinações da MP.
Tema polêmico
A quinta-feira foi de intensas negociações no Palácio do Planalto. José Alencar ficou reunido do final da manhã até o início da noite com ministros e uma comissão de parlamentares que discute o tema junto ao governo.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, reiterou sua posição contrária à liberação dos transgênicos. Já o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, defendeu o plantio para evitar prejuízos aos agricultores do Sul do país, que já possuem estoques de sementes geneticamente modificadas.
Os deputados Fernando Gabeira (PV-RJ) e Frei Sérgio (deputado estadual do PT-RS), integrantes da comissão de parlamentares que se reuniu com Alencar ao longo do dia, chegaram a abandonar o encontro depois de José Alencar ter revelado que realmente teria que assinar a MP.
"Saímos de forma fraternal. Apenas os nossos caminhos se separaram. Cada um com a sua história. Abandonamos o barco, agora vamos recuperá-lo adiante para evitar um estrago maior", disse Gabeira ao deixar a reunião.
À noite, houve mais uma tentativa de sensibilizar o presidente interino para não assinar a medida. Uma comissão de integrantes do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) foi ao Palácio do Planalto entregar a José Alencar uma moção, aprovada durante reunião do órgão, que faz um último apelo pela não liberação do plantio de transgênicos nesta safra. O Conama também entregou outra moção à ministra Marina Silva elogiando a sua postura contrária aos transgênicos.
Mesmo diante de tantos apelos contra a liberação dos transgênicos, Alencar acabou seguindo a determinação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que na quinta-feira, por telefone, já havia dado a orientação para que tomasse a decisão de liberar o plantio. A íntegra da Medida Provisória está publicada no Diário Oficial desta sexta-feira.