Política

A ‘nuvem’ de Beto Richa

23 fev 2015 às 08:00

O ex-banqueiro mineiro José de Magalhães Pinto costumava dizer que política é como nuvem: "Você olha e ela está de um jeito; olha de novo e ela já mudou". Repetida quase que à exaustão por analistas de todos os cantos do País, sobretudo durante campanhas eleitorais, a expressão até pouco tempo atrás parecia só não fazer sentido no Paraná de Beto Richa (PSDB), governador reeleito ainda no primeiro turno, com 55,67% dos votos válidos.

Em que pese a crise financeira desenhada desde o fim de 2013, quando a então secretária de Estado da Fazenda, Jozélia Nogueira, chegou a admitir uma dívida com fornecedores na ordem de R$ 1,1 bilhão, o tucano desfrutava de relativa tranquilidade. Além dos 17 partidos que, formalmente, integravam sua coligação, Beto contava com o apoio de pelo menos 200 dos 399 prefeitos e de 45 dos 54 deputados estaduais, fundamentais para transmitir aos eleitores a mensagem de que se o governo estadual não fez mais nos últimos quatro anos foi porque tinha "inimigos" poderosos em Brasília. Foram eles, mais precisamente os três (agora ex) ministros paranaenses de Dilma Rousseff (PT), dizia, os responsáveis por dificultar a liberação de empréstimos internacionais e, assim, atrasar obras consideradas estruturantes para o desenvolvimento do Estado.


Impossível imaginar cenário mais favorável para, de 2015 a 2018, seguir aprovando todo e qualquer projeto de lei de interesse do Executivo enviado à Assembleia Legislativa (AL). A redução da bancada do PT, de sete para três representantes, e a relutância de muitos peemedebistas em apoiar a candidatura de Roberto Requião (PMDB), aliás, sinalizavam para uma segunda gestão sem sobressaltos. Tanto que se tornou célebre a frase repetida pelo governador aos jornalistas logo depois de o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) anunciar o resultado do pleito de outubro: "O melhor está por vir".


Apenas quatro meses se passaram para não só "a nuvem", mas o céu todinho, mudar de lugar. Se em dezembro o primeiro "pacotaço", aumentando impostos como IPVA e ICMS, passou sem dificuldade pelo plenário da AL, o mesmo não ocorreria com a segunda leva de ajustes, que pegaria em cheio o funcionalismo. De dentro da Assembleia, os sete oposicionistas auto declarados - Tadeu Veneri (PT), Péricles de Mello (PT), Professor Lemos (PT), Requião Filho (PMDB), Anibelli Neto (PMDB), Nereu Moura (PMDB) e Nelson Luersen (PDT) - aos poucos ganhavam novas adesões, não se sabe se por convicção ou se por "senso de oportunidade". Fora, 30 mil professores grevistas protestavam, cada vez mais organizados, contra a retirada de direitos trabalhistas.


Não demorou muito para a revolta popular ocupar as dependências da Casa do povo, em um dos mais emblemáticos episódios da história da AL. Com o reforço de sindicalistas, integrantes de movimentos sociais e outros servidores públicos, igualmente insatisfeitos, os docentes tomaram primeiro o plenário e, dois dias depois, o pátio inteiro. Só arredaram o pé quando o Executivo aceitou retirar, para "reexame", as mensagens de pauta, anúncio que se completou com a promessa do líder do governo, Luiz Cláudio Romanelli (PMDB), de não utilizar mais o "tratoraço" para aprovar matérias no afogadilho.


Esfriados os ânimos e aparadas algumas arestas com o funcionalismo, as mensagens do "pacote de austeridade" voltarão a ser analisadas a partir da próxima semana, muito provavelmente com a complacência de boa parte dos governistas da AL - os mesmos que lá chegaram de camburão, escoltados pelo próprio secretário de Segurança, Fernando Francischini (SD). No entanto, desta vez virão de forma "fatiada", passando, obrigatoriamente, pela análise das comissões permanentes do Legislativo. Incumbido da árdua tarefa de responder pela gestão tucana nos últimos dias, em que as aparições de Beto se tornaram raridade, o chefe da Casa Civil, Eduardo Sciarra (PSD), garantiu que nenhuma proposta irá mais retirar conquistas dos trabalhadores.


A repercussão negativa dos primeiros textos, somada a uma preocupação natural com as eleições de 2016, contudo, já começa a mudar a forma como os membros da AL, em especial os pertencentes à bancada aliada, se relacionam com o Palácio Iguaçu. Figuras como Ney Leprevost (PSD) e Chico Brasileiro (PSD), de olho nas prefeituras de Curitiba e Foz do Iguaçu, respectivamente, tendem a se distanciar do governo, mantendo "posição de independência". O mesmo deve acontecer com outros nomes da base, como Adelino Ribeiro (PSL), Paranhos (PSC), Rasca Rodrigues (PV) e Tercílio Turini (PPS), que já haviam anunciado voto contra o pacote.



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