Paraná

Velhas doenças afligem o Paraná

27 fev 2001 às 16:39

O Paraná enfrenta atualmente o retorno de doenças características de regiões precárias, com baixo índice de qualidade de vida. Enfermidades que estavam sob controle -como malária e dengue- voltam a ser motivo de preocupação. Estratégias de prevenção e controle ineficientes, recursos escassos destinados à saúde, aumento da população e principalmente o desequilíbrio no ambiente causado pelo homem são, segundo médicos e especialistas entrevistados pela Folha, as principais causas do retorno ou incidência pertinente dessas doenças, chamadas reemergentes.

Para o médico, professor e ex-secretário estadual da Saúde Nizan Pereira, a situação é preocupante e políticas de medicina preventiva devem ser reforçadas. Ele acredita que a mudança no perfil social e ecológico em todo o mundo tem trazido à tona doenças infecciosas que estavam controladas ou até mesmo erradicadas. No Estado, a realidade não é diferente.


Pereira enfatiza que as enfermidades estão "mudando de perfil" e doenças consideradas rurais chegam às cidades. Ele explica que a combinação do fluxo migratório das regiões com baixas condições de vida, entre outros fatores, contribuem para essa transformação.


As doenças que dependiam de vacinas para ser controladas, conforme recorda o médico, foram erradicadas, mas novos desafios surgiram para as autoridades em saúde no País. "São as doenças comportamentais", classifica. Cólera (que já estava controlada), malária e dengue, segundo Pereira, são exemplos clássicos das doenças reemergentes.


Doenças reemergentes são aquelas cuja incidência têm aumentado na última década. "Essas doenças aparecem novamente porque a vida das pessoas está cada vez mais difícil e mais precária", adverte o médico.


O perfil da sociedade, no que diz respeito ao controle dessas doenças, está mudando, na visão do ex-secretário de saúde. "Quando depende de vacinas, a situação é controlada. Quando depende de comportamento e cultura, o controle fica mais difícil." Além disso, vírus relativamente novos, como o HIV, contribuem para a disseminação de doenças oportunistas. O aumento da incidência da tuberculose, por exemplo, está diretamente ligado ao aumento dos portadores do vírus HIV (transmissor da Aids), já que a doença afeta a imunidade do paciente.


Outro fator que contribui para a disseminação das doenças, segundo o diretor do Centro de Saúde Ambiental da Secretaria Estadual de Saúde, Paulo Guerra, é o deslocamento facilitado das pessoas. Ele justifica o reaparecimento de algumas doenças no Paraná com o fato das pessoas contraírem a infecção em lugares de risco e voltarem ao Estado. "A maioria dos casos da malária ocorreram assim", diz.


Para buscar soluções para o aumento da incidência dessas doenças, a secretaria vem publicando boletins anuais com casos notificados (suspeitos) e confirmados de algumas enfermidades. O objetivo é traçar um panorama da situação no Paraná.


Segundo Guerra, num universo de 32 enfermidades pesquisadas pela secretaria e publicada no Boletim Epidemiológico do ano passado, apenas duas (dengue e tuberculose) são consideradas reemergentes. No entanto, o próprio secretário da pasta, Armando Raggio, alerta que outras doenças, apesar de não serem reemergentes, preocupam.


A aids, por exemplo, é uma doença emergente (infecção nova), mas contribui para o surgimento de tuberculose, que é reemergente. Somente no ano passado, de acordo com o Boletim Epidemiológico da secretaria, foram confirmados 456 novos casos de aids. A publicação também aponta que 797 pessoas estavam sob suspeita de terem contraído a cólera no ano passado, mas nenhum caso foi confirmado. No mesmo período, a dengue acometeu 1.825 pessoas. Ainda em 2000, foram confirmados 712 casos de hanseníase, 36 de rubéola e 1.128 de tuberculose em todo o Estado.


Para o infectologista Álvaro Jabur, ex-professor da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e ex-diretor do Hospital Universitário da cidade, o reaparecimento das doenças antes sob controle é resultado da falta de investimento na saúde. "O pano de fundo dessa situação é o desmantelamento da rede pública. Neste campo não existe milagre. O correto seria a manutenção de campanhas preventivas e o investimento paralelo na infra-estrutura de atendimento à população", critica o médico.


Na opinião do médico, a melhor arma no combate às doenças reemergentes é a informação. O desconhecimento é o principal responsável pela discriminação dos pacientes e a dificuldade para a redução do número de casos. "Uma sociedade mais informada se previne melhor e cobra seus direitos das autoridades."


Jabur também concorda que o aumento no número de infectados pela tuberculose nos últimos anos está ligado diretamente à aids. A fragilidade do sistema imunológico no soropositivo facilita o ataque da doença. No caso da malária, de acordo com Jabur, o responsável pelo crescimento de notificações em todo mundo foi a proibição do uso do DDT, um agrotóxico altamente nocivo à saúde do homem.

"Ele era muito eficiente no combate ao Anopheles, mosquito transmissor da malária. Enquanto não houver um substituto à altura, a solução é prevenir", aconselha. A leischmaniose migrou para a zona urbana com o gradativo desmatamento das florestas e matas ciliares, habitat natural do mosquito flebótomo. Em relação à dengue, o infectologista acredita que o problema é a falta de um agente poderoso na erradicação do Aedes aegypti.


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