A cúpula da Polícia Civil decidiu afastar o delegado Vinícius Borges Martins do comando das investigações de denúncias de irregularidades supostamente praticadas pelas 21 funerárias e a Prefeitura de Curitiba. No início deste mês, Martins foi transferido da Delegacia de Crimes contra a Administração Pública, onde atuava no caso desde fevereiro do ano passado, para o 2º Distrito Policial.
A justificativa oficial dada pela assessoria do delegado-geral da Polícia Civil, Leonyl Ribeiro, é de que o afastamento de Martins do caso ocorreu porque seu superior, Antonio Luís Silveira, assumiu o Comando de Operações Policiais Especiais (Cope), ao ser promovido a delegado de primeira classe. Com isso, o novo titular da Delegacia de Crimes contra o Patrimônio Público, Mário Campos Serra, preferiu levar consigo sua "equipe de confiança", como seria praxe no meio policial.
Segundo a Folha apurou, no entanto, o afastamento teria ocorrido por motivos políticos. A atuação de Martins à frente do inquérito estaria desagradando a prefeitura. O afastamento teria sido decidido durante reunião entre o secretário de Segurança, José Tavares, e o delegado-geral. O prefeito Cassio Taniguchi e o governador Jaime Lerner, ambos do PFL, são aliados políticos. A reportagem tentou ouvir o delegado Martins, mas ele está de férias. Deverá retornar ao trabalho, já na nova delegacia, amanhã.
No período em que atuou nas investigações, Martins indiciou os donos das 21 funerárias pelos crimes de formação de cartel, formação de quadrilha e desrespeito ao Código de Defesa do Consumidor. Indiciou também o ex-diretor do Serviço Funerário Municipal (SFM) Paulo Wolkoski Filho, conhecido como Paulo Polatti, pelo crime de improbidade administrativa (lei 8.429/92). O SFM é o órgão da prefeitura encarregado de gerenciar e fiscalizar o setor.
Wolkoski Filho é acusado de ter autorizado, por conta própria, as funerárias a cobrar um "pedágio" de empresas de outras cidades que viessem a Curitiba para sepultar pessoas mortas em outros municípios, ou para fazer o trabalho inverso. Depois de denunciado, o ex-diretor pediu demissão do cargo.
Quando foi afastado, o delegado Martins reunia indícios para denunciar a Prefeitura de Curitiba ao Ministério Público por desrespeito à Constituição Federal (artigo 175) e à Lei de Licitações (8.666/93). Desde que encampou o sistema funerário, em 1987, na gestão do hoje senador Roberto Requião (PMDB), a prefeitura concede os serviços às empresas por meio de permissão. A Constituição, de 1988, e a lei 8.666 obrigam a realização de licitação para que empresas privadas executem serviços públicos.
No caso das empresas, a formação de cartel é fundamentada em três fatos: a concentração de várias funerárias nas mãos dos mesmos donos, a atuação delas em pool, no mesmo endereço, e a adoção de uma tabela de preços pelos funerais. Cinco famílias são donas das 21 empresas e grupos de até seis delas funcionam no mesmo local.
As cobranças irregulares configurariam a formação de quadrilha e a impossibilidade de o usuário escolher a prestadora do serviço, o desrespeito ao Código do Consumidor. Hoje, as empresas seguem um sorteio, coordenado pela prefeitura (leia quadro ao lado).
O nome do delegado que vai comandar o inquérito ainda não foi definido. A Delegacia de Crimes contra a Administração Pública pediu ao Ministério Público prorrogação de prazo para concluir a investigação. Depois, o material vai ao MP, que decidirá se abre ação penal contra os acusados.