Uma solução para conter a alta dos combustíveis assumiu o topo da lista de prioridades do Palácio do Planalto. Hoje, o tema na cúpula do governo é mais urgente do que o Auxílio Brasil, programa substituto do Bolsa Família.
Aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) passaram a considerar o preço da gasolina e do diesel nas bombas um dos principais obstáculos para a campanha de reeleição de 2022.
A avaliação no Planalto é que mesmo o lançamento de um programa social turbinado tende a ter impacto eleitoral reduzido caso o governo não encontre uma saída para o problema dos preços.
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Com isso, a questão está à frente do Auxílio Brasil e de uma saída para a PEC (proposta de emenda à Constituição) dos precatórios.
Em reuniões coordenadas pela Casa Civil, assessores palacianos têm discutido medidas que podem ser adotadas. No momento, eles apostam na aprovação de um projeto que muda regras de cobrança do ICMS sobre combustíveis.
A articulação na Câmara está sendo capitaneada pelo próprio presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-AL), que tenta resolver um impasse envolvendo o texto.
O governo quer que a redação a ser aprovada no Congresso tenha o mesmo conteúdo do projeto que foi enviado pelo Planalto e que prevê um valor uniforme do ICMS.
A proposta foi apensada a outra, do deputado Emanuel Pinheiro Neto (PTB-MT), que trata da apuração do ICMS relativo ao diesel, ao etanol hidratado e à gasolina a partir de valores fixos por unidade de medida, definidos em lei estadual.
Hoje, como o imposto é calculado sobre um percentual do preço de bomba, o valor em reais cobrado pelos estados aumenta na mesma proporção dos preços. Se o valor do combustível sobe, o valor cobrado de ICMS também sobe, pressionando o preço final.
Como mostrou reportagem da Folha de S.Paulo, entre janeiro e setembro, os estados arrecadaram R$ 68,4 bilhões em ICMS sobre produtos de petróleo, uma alta de 24% em relação a 2020, quando o mercado e os preços despencaram com a pandemia. Na comparação com 2019, antes da crise, a alta é de 4,5%.
O aumento ocorre mesmo num cenário de vendas menores. Entre janeiro e agosto de 2021, segundo a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), o mercado brasileiro consumiu 36,6 bilhões de litros de combustíveis líquidos, conceito que inclui gasolina, diesel e etanol.
No mesmo período de 2019, foram 39,4 bilhões de litros. A elevação da receita, portanto, reflete mais a escalada dos preços, que atingiram níveis recordes no país em 2021, pressionados pela recuperação do petróleo e pela desvalorização cambial.
Em seu parecer, o relator do projeto de lei complementar, deputado Dr. Jaziel (PL-CE), aproveitou boa parte do conteúdo do texto enviado pelo governo e fez alterações pontuais, incluindo dispositivo que diz que as deliberações feitas por estados deverão ser aprovadas e ratificadas por pelo menos dois terços das unidades federadas e por um terço dos estados em cada região.
O deputado afirma que a ideia inicial era que seu parecer tratasse da divulgação, em notas fiscais, dos valores de tributos federais, estaduais e municipais cujas incidências influíram na formação dos preços.
O assunto é abordado em projeto de lei complementar do deputado Isnaldo Bulhões Jr. (AL), líder do MDB na Câmara.
Mas, em linha com desejo de Bolsonaro, Dr. Jaziel decidiu trabalhar com a ideia de estabelecer um valor fixo ao ICMS que seguisse os moldes do imposto federal.
"É uma resposta ao povo. Precisamos de uma possibilidade de criar uma condição que pare com essa escalada de preços", afirmou.
De acordo com ele, os cálculos levariam em conta as alíquotas praticadas em cada estado. Assim se Chegaria a uma média e o Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) faria contas para que os estados não tivessem perda de arrecadação, disse Dr. Jaziel.
Integrantes do governo e congressistas sabem que são difíceis as chances de o projeto avançar por causa de resistências de governadores, que têm no ICMS uma importante fonte de receita, mas deputados já começaram a trabalhar na tentativa de sensibilizar os gestores.
Líderes partidários entrariam nessa mediação para convencer governadores de que a proposta é boa.
O próprio presidente Bolsonaro disse, em sua live nesta quinta-feira (30), que os chefes de governo nos estados devem trabalhar contra a medida. "Lá dentro do Parlamento, contrário, vai ter o lobby de muitos governadores", disse.
Na Câmara, o impasse envolve a discussão sobre fixação de valor para o ICMS.
Segundo Isnaldo Bulhões, houve um acordo para que seu projeto de lei complementar fosse priorizado, em negociação que contou com o respaldo do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e de líderes da base.
Ele disse que, até agora, não foi procurado para conversar sobre a negociação anterior. Na opinião do líder do MDB na Câmara, puxar as discussões pelo viés tributário é um equívoco.
"Se a política econômica e da empresa [Petrobras] continuarem as mesmas, o problema vai persistir."
Já a cúpula da Petrobras aposta as fichas na mudança nas regras de aplicação do ICMS. E também avalia ser necessário criar um fundo de estabilização que pode ter recursos de ao menos três origens: fundo do pré-sal, royalties ou dividendos.
Bolsonaro afirmou nesta quinta ter discutido o estabelecimento de um fundo com o uso de dividendos pagos pela estatal à União.
"Vim conversando com [Gustavo] Montezano [presidente do BNDES] hoje no avião pegando dicas com ele [sobre] o que a gente pode fazer. É criar um fundo regulador, ver o lucro da Petrobras que veio para o governo federal, para nós", disse. "Ninguém vai meter a mão em nada", afirmou o presidente na live.
"Será que esse dinheiro da Petrobras que veio para nós... será -não estou afirmando-, que é um lucro bilionário, não podemos converter e ir para esse fundo regulador?", questionou.
"Toda vez que dá um aumento você não repassar todo o aumento; ou não repassar aumento nenhum. Você faz caixa quando está mais no baixo e, quando sobe, com esse caixa, compensa esse reajuste lá na frente", afirmou.
A sinalização do fundo de estabilização já havia sido dada por Lira na quarta-feira (29).
Segundo o presidente da Câmara, o fundo não mexeria na política de preços da Petrobras e poderia ser alimentado com dividendos repassados majoritariamente para a União ou com recursos do gás do pré-sal.
"Você vai garantir que quando aumente o petróleo e o dólar ele segure, e quando baixe o dólar e o petróleo ele se reabasteça. Ele seria um moderador e a forma ainda vai ser discutida", ressaltou.