A nova regulamentação que permite o uso do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) como garantia adicional para o empréstimo consignado - aquele descontado diretamente da folha salarial - é mais uma ferramenta para que o trabalhador troque uma dívida cara por outra mais barata. Porém, especialistas questionam as consequências da iniciativa no longo prazo e divergem sobre a sua atratividade para os bancos, que ainda estudam as novas regras divulgadas pela Caixa Econômica Federal.
Pela medida, que libera os bancos para firmar convênios com empresas, o trabalhador poderá utilizar como garantia do empréstimo 10% do saldo de seu FGTS. Em caso de demissão, a instituição financeira poderá reter 100% da multa rescisória. A taxa máxima de juros é de 3,5% ao mês, e o prazo para pagamento, de 48 meses.
Maurício Godoi, professor da Saint Paul, explica que a novidade pode ser um bom negócio porque um cliente que está atrasando o pagamento de uma dívida ou não consegue honrar as prestações pode optar por pegar um consignado para liquidar o débito e pagar um juro menor do que o de outras modalidades, como o cheque especial. "É vantajoso para o banco porque ele não estava recebendo e vai passar a receber."
No entanto, um dos principais obstáculos que as instituições financeiras podem enfrentar é o alto custo operacional. A análise do perfil do trabalhador, do salário recebido, da empresa e do FGTS faz com que a operação seja mais trabalhosa e cara. Aliada ao juro baixo, essa burocracia tornaria essa linha pouco atrativa para os bancos.
"O trabalho que o banco vai ter não faz frente a essa taxa. Antes de conceder o crédito, vai ter de saber quanto você tem para calcular a garantia. O processo só ficaria mais simples se tivesse uma automatização", explica Marcelo Prata, consultor e fundador do Canal do Crédito.
Por outro lado, a baixa taxa de juros incentivaria mais pessoas a optar por esse tipo de crédito, o que faria com que o banco lucrasse em cima do número de empréstimos. "Em um momento de recuperação da economia, quanto mais crédito a instituição ceder, mais ela ganha no volume, e não na taxa", observa Juliana Inhazs, professora da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap).
Os bancos ainda estudam como viabilizar as novas regras. Procurados pelo jornal "O Estado de S. Paulo", Itaú, Banco do Brasil, Bradesco, Santander e Caixa, que juntos detêm cerca de 80% do total em crédito consignado, ainda não começaram a operar a nova modalidade. Em nota, o Bradesco afirmou que "oferecerá a linha tão logo o sistema operacional entre as partes envolvidas esteja apto". O Santander afirmou que oferecerá a linha, mas que ainda não há detalhes sobre as condições, que dependem das regras estabelecidas pela empresa no convênio com o banco. Itaú, Caixa e Banco do Brasil afirmaram que estão avaliando as novas regras e os ajustes operacionais.
Poupança forçada
Apesar de facilitar o pagamento de dívidas mais caras, uma das principais preocupações dos especialistas em relação à nova modalidade é que ela compromete o que pode ser a única poupança de muitos trabalhadores brasileiros. Juliana, da Fecap, explica que, se o mecanismo for usado em massa agora, no futuro, muitas pessoas estarão com a renda comprometida. "É como se estivéssemos pegando o recurso do futuro para que elas tenham mais hoje", pondera.